Com os pés bem assentes no chão

Enquanto consumidores, podemos também apostar em comprar produtos criados em sistemas que se preocupam com a criação de solo fértil

Estava eu a preparar-me para escrever sobre a problemática da erosão, como um pilar fundamental no combate as alterações climáticas, quando o meu filho me pediu para preparar o lanche.

Lembrei-me de ter visto, há tempos, um pacote de cereais para pequeno almoço que tinha escrito na parte de trás uma sugestão: fazer crescer os cereais na própria casa dos consumidores.

Parece difícil? Sim, parece. Mas o processo estava detalhadamente explicado na embalagem: pôr um pouco de terra num tabuleiro de barro, escrever o nome com o dedo e semear trigo nos sulcos.

Este tabuleiro de barro pode ser uma metáfora para a maior parte dos nossos terrenos agrícolas. Os solos lavrados ano após ano por maquinaria “pesada” ficam muito compactados, o que, a prazo, impedirá o crescimento de qualquer planta.

Mas pensemos num tabuleiro mesmo com terra fértil, mas sem vegetação; se inclinarmos o tabuleiro, o que acontecerá à terra? A maior parte irá sair do tabuleiro, ou se um vento forte soprar sobre o tabuleiro, a terra irá desaparecer também, e será impossível fazer com êxito a nossa sementeira.

Isto é um processo de erosão.

Mas se semearmos as sementes, as regarmos convenientemente e as plantas crescerem, já podemos inclinar o tabuleiro, ou deixar o vento soprar, que as plantas protegerão o solo e conseguirão parar o processo de erosão.

A solução para pararmos a desertificação até parece uma brincadeira de criança.

Mas infelizmente o assunto é muito sério. E, conforme avança a erosão, também aumenta o processo de desertificação humana.

Não é só o declive, o vento e os incêndios que aceleram a erosão.

Em Portugal, há quem receba 500 euros por hectare só para lavrar os terrenos ou usufrua de outros subsídios que se destinam à produção de uma única cultura (monocultura). Qualquer uma destas práticas aumenta a perda de fertilidade do solo e aumenta a erosão.

 

Há uns bons anos que existem modelos diferentes de produção que, ao contrário dos muitos modelos baseados na lógica da agricultura industrial, podem ter um custo maior no início, mas compensam a longo termo, permitindo manter e aumentar a fertilidade dos solos e garantir a prática de uma agricultura sustentável.

O solo é um recurso vital hoje em dia. É difícil encontrar terrenos férteis, de custo barato, perto de onde se consomem os produtos cultivados. E as condições mundiais atuais demonstram o quanto os custos dos nossos alimentos dependem da distância do local onde são produzidos, ou onde se localizam os recursos utilizados.

A natureza, para obter 2.5 cm de solo fértil, demora uns 500 anos e, pelas estimativas já existentes (basta procurar no google “How much soil is eroded each year in the world?”), verificamos que perdemos 3,4 toneladas de terra fértil por pessoa por ano.

A este ritmo, será expectável que, se não invertermos o processo de produção agrícola, tenhamos cada vez mais desertos no mundo e menos capacidade de produção de comida. Com esta situação, a previsão é de que se perca, ou gaste a mais 8 biliões de dólares por ano a nível global na produção de alimentação saudável para a população mundial, que ainda está em crescimento!

Soluções?

– Reutilizar e reciclar a grande quantidade de matéria orgânica que atualmente enviamos para os aterros sanitários, de modo a que se transforme em composto orgânico biológico;

– Multiplicar os sistemas agroflorestais biológicos que usam fertilizantes naturais, desgastam menos os recursos naturais e que se situem próximos dos consumidores;

– Semearmos/plantarmos flora em todos os locais em que pudermos!

Além disso, enquanto consumidores, podemos também apostar em comprar produtos criados em sistemas que se preocupam com a criação de solo fértil, ou que provoquem menos erosão, comprar alimentos produzidos com métodos menos intrusivos para a terra, como os sistemas agro florestais e biológicos.

Hoje em dia, com a Internet, é muito fácil saber de que forma pode criar mais condições de fertilidade dos solos perto de si e também encontrar produtores que usem técnicas regenerativas para consumir produtos cultivados de forma sustentável.

 

Autor: Bruno Silva é membro da Glocal Faro

 

 



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