Há falta de trabalhadores no turismo e pouco consenso sobre as soluções

Época alta já começou, com hotéis e restaurantes a precisar ainda de trabalhadores

O problema é assumido por todos: há falta de trabalhadores para o turismo, quando já está a começar a época alta. Só que, nas soluções, não há consenso. A Região de Turismo está em Marrocos a tentar captar mão de obra, o Sindicato diz que o “remédio” passa por aumentar os salários, mas a Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA) garante que hoje se paga muito mais, embora haja pessoas que se «recusam» a trabalhar.

Quanto à «visita de intercâmbio» da RTA a Marrocos, começou esta segunda-feira, 5 de Julho, e durará até sexta-feira próxima.

Depois, segundo a Região de Turismo do Algarve, segue-se uma visita com os mesmos objetivos a Cabo Verde (de 12 a 15 de Julho).

As duas visitas, em parceria com a Missão em Portugal da Organização Internacional para as Migrações (OIM Portugal), têm um claro objetivo: dar «rápida resposta à contratação de recursos humanos para o setor do turismo no Algarve» – e também para a agricultura.

João Fernandes, presidente da RTA, assume que a falta «de mão de obra é, atualmente, a principal dificuldade do turismo algarvio», um diagnóstico partilhado por hoteleiros, dirigentes associativos e sindicalistas.

Numa conferência de imprensa realizada em meados de Junho, Tiago Jacinto, coordenador do Sindicato da Hotelaria do Algarve, considerou que a carência de trabalhadores se deve a uma «conjugação de fatores», com os «baixos salários» à cabeça.

«O problema é a falta de condições que as empresas estão a oferecer aos trabalhadores, em termos remuneratórios, que é perto do salário mínimo, ou a desregulação dos horários que não permitem a conciliação entre a vida profissional e pessoal. Há trabalhadores que nunca tiveram férias com os filhos», ilustrou.

A degradação do trabalho em hotelaria, assumiu o sindicalista, «não é difícil de perceber quando temos, na cozinha, um trabalhador que não tem formação nenhuma na área».

«A qualidade do serviço está a descer todos os dias e isso depois nota-se pelas reclamações que os clientes apresentam», adiantou.

 

Tiago Jacinto – Foto: Hugo Rodrigues | Sul Informação

 

Apesar de não «descurar» a hipótese de recrutar trabalhadores no estrangeiro, Tiago Jacinto fala do reverso da medalha.

«Há toda uma estratégia montada para baixar salários e depois, alegando que não há trabalhadores, ir buscá-los ao estrangeiro para os explorar ainda mais, porque vêm numa situação mais fragilizada», disse.

Em relação a isto, a Região de Turismo, pela voz do presidente João Fernandes, garante que o objetivo destas visitas passa por conseguir a «regulação de acordos de mobilidade que assegurem boas oportunidades para trabalhadores migrantes e que certifiquem o respeito pelos direitos humanos, combatendo o risco de exploração laboral e a exposição a riscos de tráfico humano».

A questão dos salários é uma das que maior debate gera entre trabalhadores e entidades patronais.

O Sindicato da Hotelaria vê no aumento dos ordenados a chave para resolver o problema da falta de mão de obra, mas Hélder Martins, presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), contra-argumenta.

 

Hélder Martins – Foto: Hugo Rodrigues | Sul Informação

 

«Também temos de pensar quanto custa um empregado: se pagarmos 1000 euros, quanto é que ele vai custar à empresa? Isto tem a ver com a política fiscal que também não ajuda. Agora, que hoje se está a pagar mais 15, 20 ou 30% não há a mínima dúvida», disse, ao Sul Informação.

De resto, segundo este responsável, que também é diretor do Hotel Rural Quinta do Marco, em Santa Catarina da Fonte do Bispo (Tavira), hoje «não se contrata ninguém a querer ganhar o salário mínimo».

«Tem de haver um repensar da atividade: tem de haver uma política de habitação que fixe as pessoas, uma política fiscal que não pense só em receber, receber, porque, no fundo, a empresa é uma entidade que é feita para gerar emprego, ter um serviço e também ter uma parte lucrativa», considerou.

Com a pandemia, houve a saída de centenas de trabalhadores dos setores do turismo e da restauração. Muitos foram para as «grandes superfícies», diagnostica Hélder Martins, e outros para «as Câmaras Municipais». Apesar deste diagnóstico, também nos hipermercados e nas autarquias falta mão-de-obra.

Mas, no meio de tanta carências, também há exceções.

Em Quarteira, há um hotel – o D. José – que tem o quadro de pessoal «cheio» (também com a ajuda dos alunos da Escola de Hotelaria e Turismo do Algarve).

 

João Soares – Foto: Nuno Costa | Sul Informação

 

Ao Sul Informação, o diretor João Soares explicou que, além de ter «aumentado os salários», também deu «apoios à habitação, arredando alguns apartamentos para os trabalhadores» e alargou os seguros de saúde.

«A inflação está a subir e a carestia de vida atinge todos», considerou.

O também delegado regional da Associação de Hotelaria de Portugal (AHP) assume, contudo, que a falta de mão de obra é «um problema grave da região».

«Vai ser uma dificuldade este Verão, claro, mas acredito que o Algarve irá conseguir ultrapassá-la», concluiu.

Não se sabe é se a iniciativa da RTA, de ir diretamente a Marrocos e Cabo Verde para tentar captar mão-de-obra, terá efeitos práticos, pelo menos nesta época turística.

 

 



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