Manuel Mestre (MPT): É preciso construir «uma nova estrada a norte da A22»

«Durante a próxima legislatura, tudo faremos para que a criação da Região Administrativa do Algarve se possa tornar uma realidade»

Manuel Mestre, farense de 51 anos, empresário do setor do turismo e presidente do Clube de Surf de Faro há 26 anos, é o cabeça de lista do Partido da Terra-MPT pelo Algarve, às Eleições Legislativas de 30 de Janeiro.

Com Manuel Mestre, prossegue a série de entrevistas que o Sul Informação está a publicar, com todos os cabeças-de-lista de todas as forças políticas que se candidatam pelo círculo eleitoral do distrito de Faro.

A todos, e numa lógica de igualdade de oportunidades, foi enviado, atempadamente, um mesmo questionário com 12 perguntas.

As respostas são, naturalmente, diversas, como ficará claro ao longo dos próximos dias, com a publicação de todas as entrevistas.

Sul Informação – Quais são as prioridades da sua força política para a próxima legislatura para o Algarve?

Manuel Mestre – No Algarve, temos um problema grave de falta de mão de obra, principalmente na hotelaria e restauração, por isso é fundamental a captação de mão de obra qualificada.
Também é necessário arranjar soluções para a falta de água na região.
Quanto à rede de transportes públicos, deve haver uma aproximação do interior do Algarve com o litoral.
É ainda necessário criar uma alternativa à estrada nacional 125, promover a conservação da nossa orla costeira, apostar na valorização dos recursos endógenos, promover a economia circular e defender a Saúde.

SI – O que levou a que aceitasse ser cabeça de lista pelo partido ou força política que representa?

MM – A resposta é simples: deixei de me sentir representado na Assembleia da República. O único deputado que levantava a voz em prol do Algarve era o Dr. Cristóvão Norte. Aliás, sem me querer meter na estratégia política do PSD, acho que deram um tiro no pé.
Se me permitem, se o MPT contasse com todos os votos dos eleitores descontentes com a situação que referi, a minha eleição era garantida.

SI – Quais são as expetativas e objetivos da sua força política em relação a estas Eleições Legislativas?

MM – As expectativas são, pelo menos, conseguir eleger um deputado em todos os círculos eleitorais.

SI – O que falta fazer no Algarve?

MM – Medida 1 – O Algarve, por si só, tem as condições climatéricas ideais para atrair e fixar uma nova população, mas não é suficiente.
A mitigação desta situação passa por acelerar o processo de cidadania para quem imigra para Portugal, por tornar o arrendamento mais acessível, construindo ainda habitação a custos controlados.
Para as famílias mais jovens, potencia-se a fixação dando-lhes isenções – por exemplo no IMI -, cedendo terrenos municipais ou facilitando-lhes o crédito, numa altura em que o custo do m2 atinge valores incomportáveis para a realidade económica do país.
Não obstante, é preciso relembrar a falta de subsídios que promovam e defendam a natalidade, bem como posteriormente tornar o acesso às creches gratuito.

Medida 2 – Falta de água: exigem-se novas formas de captação da água potável, otimizando os recursos existentes, em muitos casos suficientes, mas mal aplicados.
A falta de água na região é uma realidade, e, num futuro – não muito longínquo – pode correr com menor pressão ou com cortes sucessivos na rede do abastecimento.
Tendo, com condições geográficas tão favoráveis, um recurso como a água salgada, a dessalinização, apesar de dispendiosa, deve continuar a ser uma solução em cima da mesa e equacionada tão rápido quanto possível.
Não obstante e apesar da escassez da chuva, é fundamental potenciar a captação de águas pluviais e das águas das ETAR para a rega dos campos de golfe e das árvores de fruto.
Na rede das cidades, é fundamental que a perda de água potável seja combatida, de forma a que o lençol freático seja aproveitado a 100%.
Para a agricultura, devemos procurar maximizar os sistemas de rega para melhor aproveitamento dos recursos, sujeitos ao clima e a todas contingências. Ainda sobre esta matéria, devemos também fomentar o cultivo de alfarrobeiras, figueiras e medronheiros, espécies autóctones, que resistem a seca e fazem parte na nossa cultura.

Medida 3 – No barrocal do Algarve, a rede rodoviária está longe de ser a ideal, sendo consequentemente uma barreira, por si só, à fixação de famílias nessas áreas.
No entanto e a esse respeito, o problema da nossa rede rodoviária e ferroviária toma proporções alarmantes quando falamos da serra algarvia, principalmente nos limites dos concelhos. É fundamental, por isso, a criação de vias de ligação diretas entre o barrocal e a serra, para que essas pessoas se sintam mais próximas do litoral.
A sua criação iria ajudar a suprimir a falta de mão de obra, contribuindo para a fixação de famílias e para o crescimento e desenvolvimento local e da região: todos sabemos que, sem boas acessibilidades, não há desenvolvimento, nem fixação das populações.
Outra coisa que não é aceitável é a falta de uma ligação ferroviária com Espanha, particularmente numa região como o Algarve. Sei bem que se trata de um investimento altíssimo, mas, se for sempre esse o argumento, deveria ser válido para todas as regiões.
No futuro, se essa ligação fosse de alta velocidade e ligasse Faro, Beja, Évora e Lisboa, era seguramente uma alternativa à utilização do automóvel ou do avião.
No que diz respeito ao último, seria também uma mais-valia, porque tornava a ligação entre aeroportos mais rápida e célere – e levando a um melhor aproveitamento do aeroporto de Beja e Faro, retirando tráfego do aeroporto de Lisboa, o peso e a dependência que lhe são reconhecidos.

Medida 4 – A nossa orla costeira é o nosso maior tesouro, mas não apenas para os algarvios, também para a maioria de quem nos procura e que traz sustendo e riqueza à região.
Por isso, são necessárias medidas urgentes de conservação das arribas e do cordão dunar, assim como a limpeza e conservação das praias.
No entanto, que fique claro que somos contra a retirada das populações das ilhas, através do derrube de construções já existentes, mas seremos sempre a favor de que não sejam concedidas mais licenças de construção no futuro. Existem alternativas no barrocal, pertíssimo do litoral, a necessitar de desenvolvimento, de forma sustentável e sem fragilizar a componente identitária regional.

Medida 5 – Há uns anos, foram dados, aos nossos agricultores e pescadores, subsídios para o abate de árvores e embarcações, sendo que, em muitos casos, não foram depois investidos no sector, levando-o a perder competitividade.
Com o desenvolvimento dos mercados, é imperativo que se volte à terra e ao mar para aproveitarmos os nossos recursos, que ,no fundo, deveriam ser não apenas um desígnio natural, mas uma estratégia de senso comum.
Vejamos. Em 2010, houve uma simplificação do Promar e do Proder, que visava atribuir um conjunto de apoios ao desenvolvimento do sector primário. Que efeitos teve? O que foi criado? Quantos empresários foram abrangidos? Que impacto teve na economia?
O voltar à terra, com o cultivo de árvores como as alfarrobeiras, as figueiras, os medronheiros, as laranjeiras e oliveiras, iria potenciar a economia pela mão da tradição e da cultura natural da nossa região.
Em relação às pescas, afortunadamente, a que é praticada na nossa região é sustentável, praticada em pequenas embarcações artesanais, não provocando um impacto significativo.
Essa, sim, é que deveria ser defendida, pela influência direta nas economias familiares e não ser abrangida de forma generalista pelas medidas que procuram limitar a pesca em grandes embarcações de arrasto quee dizimam as espécies e arrasam os fundos.

SI – A Saúde é um setor deficitário no Algarve e no país. Que medidas preconiza para resolver os problemas da Saúde no Algarve?

MM – A criação do Hospital Central do Algarve é uma prioridade defendida por sucessivos governos, mas nunca concretizada por um único.
É um chavão eleitoral, ponto final.
Contudo, não se trata apenas de o construir, mas de criar mecanismos para a captação de médicos e enfermeiros para a região.
Dar-lhe qualidade, eficácia e sustentabilidade de recursos é, tanto quanto a sua execução, uma prioridade.
O Algarve tem uma população flutuante muito grande, principalmente na época alta. Se nos queremos consagrar como uma referência, temos de preparar a região também para esses picos populacionais, garantindo a qualidade de vida a quem escolheu o Algarve para viver e/ou visitar.

SI – O Governo anterior avançou com a Descentralização de Competências para os Municípios. Que balanço faz desse processo?

MM – Penso que é um pequeno passo para a regionalização, sendo extremamente importante dar mais poder aos Municípios. Apesar de, em alguns casos, as verbas transferidas não serem suficientes, é o preço de ter autonomia na decisão. Os municípios estão a provar que conseguem fazer mais e melhor.

SI – Um futuro Governo deverá avançar com a Regionalização? Porquê ou porque não?

MM – O MPT defende a regionalização. A falta de investimento na região algarvia é gritante, já que representa menos de 1% do PIB gerado pela região.
A criação da Região Administrativa do Algarve dotaria a região de uma maior autonomia e eficácia em matérias de gestão de fundos, facilitando o investimento, mas sobretudo, promovendo o investimento correto.

SI – Na Assembleia da República têm-se sucedido as resoluções para acabar com as portagens na Via do Infante ou, pelo menos, para introduzir descontos significativos. O que pensa deste tema e que soluções preconiza?

MM – As Estradas de Portugal transformaram a Nacional 125 numa via urbana, em que a última remodelação não foi mais que um autêntico crime à circulação no nosso Algarve. Os sucessivos traços contínuos e os limites de 50 km/h provocam atrasos nos transportes públicos, nas entregas de bens e serviços e, em muitos casos, levam à perda de voos e, por consequência, a uma experiência menos feliz para quem nos visita. O ROI (Return of investment) algarvio é seguramente afetado por isso.
A situação na nacional 125 é, por isso, insustentável e, tendo em conta que retirar as portagens na A22 não será uma realidade, é fundamental intervir.
A questão das portagens, ainda que não resolvesse todos os problemas que existem, é bem verdade que resolveria alguns…
Uma alternativa seria o alargamento que, no caso da N125, é impossível pelas condições inerentes, tornando como única alternativa a construção de uma nova estrada a norte da A22, com ligações ao litoral, barrocal e serra.
O MPT, sendo um partido ambientalista, sei que poderá ser alvo de crítica ao apresentar esta medida, no entanto e colocando as pessoas e famílias em primeiro lugar, temos de propor condições e alternativas que promovam e defendam a sua sobrevivência, fixação e desenvolvimento.

SI – No início da atual crise da pandemia, o Governo anunciou um plano específico para o Algarve, que nunca chegou a ser concretizado. O que precisa o Turismo do Algarve para recuperar da pandemia?

MM – Os últimos dois anos têm sido um autêntico carrocel de emoções no sector do turismo, com o abre e fecha da economia, da entrada e saída de Portugal nas listas vermelhas, com a incerteza e com a impossibilidade de planear as diferentes épocas.
O que precisamos, na verdade, é de voltar a um normal, depois os excelentes profissionais que trabalham no sector, em ligação com uma região de excelência, fazem o resto.
Os empresários estão de tal maneira habituados a serem abandonados pelo governo que já nem fazem contas aos apoios. Se vierem, vão ser uma ajuda, mas não vão ser decisivo. Decisiva vai continuar a ser a nossa resiliência e profissionalismo.

SI – No caso de questões mais fraturantes, como a regionalização, as portagens na Via do Infante e a saúde, entre outras, se for eleito, votará na AR de acordo com a sua convicção, mesmo que vá contra as orientações do seu partido?

MM – O MPT foi criado em 1993 e tem um caráter humanista, ecologista, tendo a família, em todas as suas vertentes, como o pilar da sociedade.
É um partido que não tem ligação direta a qualquer outro, pelo que se rege pela defesa dos seus pilares ideológicos.
A nossa maior vantagem é essa mesma independência, garantindo a imparcialidade do nosso voto no Parlamento: podemos votar ao lado de qualquer partido, desde que a sua proposta vá ao encontro dos nossos ideais, como partido e como pessoas.
O que pretendemos, com a nossa eleição, é dar voz e reforço ao Algarve na maior casa da democracia nacional, colocando, impreterivelmente, o Algarve e os Algarvios em primeiro lugar e nunca esquecendo quem nos elegeu.
O meu voto irá sempre ao encontro dos interesses dos Algarvios, as minhas convicções são inabaláveis, e, quando aceitei esta missão, deixei bem claro com o MPT que iria sempre votar em consciência.

SI – Quer acrescentar mais algum tema ou questão?

MM – Durante a próxima legislatura, tudo faremos para que a criação da Região Administrativa do Algarve se possa tornar uma realidade.
Defenderemos obstinadamente a construção do hospital central e ainda o investimento nas nossas vias rodo e ferroviárias.
Que se aproveite o melhor das nossas terras e que os nossos barcos não fiquem, como tantas vezes se vê, em terra.
Não esqueceremos, por compromisso de honra, da criação de uma solução para a falta de água e a estratégias de fixação e desenvolvimento das populações.
É preciso dar voz e corpo à competência dos portugueses. Saber valorizar, internamente, aquilo que se nos é reconhecido lá fora. Competência, capacidade de trabalho, profissionalismo, dedicação, compromisso. Tudo.
É tempo de capitalizar cá dentro, aquilo que somos por natureza.

 

 



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