Cláudia Vasconcelos (IL): «Precisamos de libertar a carga fiscal das empresas»

«Em termos de habitantes por cama nos hospitais, somos a segunda pior região do país, mesmo sem contabilizar os efeitos do turismo e da sazonalidade.»

Cláudia Vasconcelos, 38 anos, é natural de Albufeira, profissional no mundo da hotelaria e coordenadora geral da Iniciativa Liberal no Núcleo Territorial de Faro.

É também a cabeça de lista da Iniciativa Liberal (IL), pelo círculo eleitoral de Faro, nas Eleições Legislativas de 30 de Janeiro.

Com Cláudia Vasconcelos, prossegue a série de entrevistas que o Sul Informação está a publicar, com todos os cabeças-de-lista de todas as forças políticas que se candidatam pelo círculo eleitoral do distrito de Faro.

A todos, e numa lógica de igualdade de oportunidades, foi enviado, atempadamente, um mesmo questionário com 12 perguntas.

As respostas são, naturalmente, diversas, como ficará claro ao longo dos próximos dias, com a publicação de todas as entrevistas.

 

Sul Informação – Quais são as prioridades da sua força política para a próxima legislatura para o Algarve?

Cláudia Vasconcelos – A saúde. Os tempos de espera que quase atingem 1000 dias, para uma mera consulta, não podem continuar a ser normalidade.
São necessários mais recursos, tanto humanos como de capacidade hospitalar instalada, mas necessitamos igualmente de um novo modelo organizacional do sistema universal de saúde, que permita uma resposta urgente a estes problemas da região.
Todos os partidos falam da questão da saúde no Algarve, mas a IL é o único partido que apresenta propostas reais e concretas que permitem uma resposta imediata a este problema.
A economia. Existe uma incapacidade de promover a diversificação económica no Algarve.
Acredito que uma forte aposta na desburocratização e na criação de condições atrativas para captação de novos negócios e de novas empresas será essencial para que o Algarve comece a ser cada vez menos dependente do Turismo.
Habitação e a mobilidade. A população do Algarve, segundo os dados dos Censos21, cresceu 3,7% nos últimos 10 anos, mas sem casas, as pessoas não se conseguem estabelecer condignamente.
E sem transportes não se conseguem deslocar, a falta de uma rede integrada e funcional de transportes torna muito difícil para qualquer algarvio viver e trabalhar, se não tiver viatura própria.
A nossa prioridade será também colocar o Algarve a crescer e permitir que os nossos jovens não sejam obrigados a emigrar.

SI – O que levou a que aceitasse ser cabeça de lista pelo partido ou força política que representa?

CV – A noção da necessidade urgente de uma alternativa política na nossa região. Há mais de 47 anos que assistimos à alternância de poder entre duas forças políticas e, nestes 47 anos, a região do Algarve tem sido esquecida.
Tenho um filho de 5 anos e decidi sair do sofá e lutar pelo futuro do meu filho e da sua geração. Quero que tenham a possibilidade de escolher o Algarve para construir o seu futuro, assim como espero que a geração dos meus pais e avós possa ter a qualidade de vida que merece.
Acesso a cuidados de saúde, habitação e mais salários é o que todos os algarvios merecem. E eu acredito que a resposta para estes problemas está no programa da Iniciativa Liberal. O Algarve precisa de crescer, e para crescer precisa de mudar e, para mudar, precisa da Iniciativa Liberal. Era impossível não aceitar este desafio.

SI – Quais são as expetativas e objetivos da sua força política em relação a estas Eleições Legislativas?

CV – A Iniciativa Liberal pretende constituir um grupo parlamentar, que terá tantos deputados quantos aqueles que os portugueses entenderem dar-lhe.
Após 30 de Janeiro, caso seja possível constituir uma maioria que seja a verdadeira alternativa ao socialismo que continua a estagnar Portugal, estaremos disponíveis para fazer parte de uma solução, desde que essa solução tenha o ímpeto reformista necessário para pôr Portugal a crescer.

SI – O que falta fazer no Algarve?

CV – No Algarve, falta a criação de medidas para as pessoas e a pensar nas pessoas.
Falta saúde de qualidade, que hoje não existe, em consequência da degradação dos serviços públicos, faltam escolas que respondam às necessidades reais da população, faltam transportes para que as pessoas se possam deslocar e facilmente poderem aceitar um emprego no concelho vizinho, o que hoje é impossível fazer, e falta, obviamente, habitação para que os algarvios possam viver com dignidade e para que os profissionais que faltam às nossas empresas se possam fixar no Algarve.

SI – A Saúde é um setor deficitário no Algarve e no país. Que medidas preconiza para resolver os problemas da Saúde no Algarve?

CV – Em termos de capacidade instalada, ou seja, habitantes por cama nos hospitais, somos a segunda pior região do país, mesmo sem contabilizar os efeitos do turismo e da sazonalidade.
Ao nível das listas de espera, atingimos níveis completamente irresponsáveis em que doentes não prioritários passam a prioritários porque não são tratados atempadamente.
Neste momento, o Hospital de Faro, por exemplo, regista um tempo de espera de 432 dias para uma cirurgia geral a um doente oncológico não prioritário, enquanto o tempo máximo de resposta garantido que está definido é de apenas 60 dias.
Necessitamos de expandir a capacidade instalada do sector da Saúde no Algarve e atrair mais profissionais de saúde.
No entanto, consideramos que o aumento de recursos, por si só, tanto materiais como humanos, não é suficiente.
É necessário repensarmos a estrutura organizativa do sector Saúde em Portugal e o Algarve será bastante beneficiado por esta reorganização.
O acesso à saúde de qualidade não deve depender do rendimento da pessoa e deve ser universal.
Por isso, a Iniciativa Liberal propõe uma reforma integral do SNS, em que o utente poderá aceder tanto ao sector público, privado ou social.

SI – E quanto ao Hospital Central do Algarve? Quando deve avançar e porquê?

O Hospital Central do Algarve é essencial para permitir a expansão da capacidade instalada de camas nos hospitais da região.
Considerando os níveis deficitários da região nesta estatística, é urgente que se avance com a construção do Hospital Central. Contudo, a urgência não invalida que seja necessário um planeamento adequado.
Queremos um Hospital Central do Algarve que seja qualitativamente superior aos atuais recursos existentes, mas também economicamente eficiente.
É fundamental que o Hospital Central do Algarve seja adaptado às necessidades da região e dos algarvios, em que a capacidade instalada seja superior à atual existente, idealmente com capacidade de expansão em função das alterações demográficas, e que corresponda às exigências modernas para um projeto desta magnitude.

SI – O Governo anterior avançou com a Descentralização de Competências para os Municípios. Que balanço faz desse processo?

CV – A transferência de competências é essencial para aproximar os cidadãos algarvios aos centros de decisão e esperamos que esta descentralização seja apenas o primeiro passo para uma descentralização político-administrativa mais abrangente.
Todavia, a descentralização de competências para os Municípios ainda está, em diversas áreas e municípios, no início do processo, pelo que necessitaremos de verificar, na prática, os efeitos deste processo.
Neste momento, lamentamos que existam diversos atrasos nos processos de transferência de competências.
No caso da área da Saúde, por exemplo, ainda existem procedimentos administrativos para clarificar a menos de três meses do dia 1 de Abril de 2022, o suposto dia da transferência total de competências.
Assim sendo, dificilmente os municípios terão possibilidade de lançar os concursos de contratação para os serviços necessários e, consequentemente, os prazos de transferência provavelmente não poderão ser cumpridos.
Em todo o caso, acreditamos que, no curto prazo, os efeitos da descentralização de competências sejam maioritariamente positivos.
Mantemos, contudo, algumas reticências quanto aos efeitos de longo prazo, especialmente referente aos efeitos no equilíbrio orçamental que áreas, como a saúde e educação, poderão ter para alguns municípios algarvios.

SI – Um futuro Governo deverá avançar com a Regionalização? Porquê ou porque não?

CV – Um futuro governo deverá avançar com uma descentralização. É muito mais importante distribuir o poder que está concentrado nos Ministérios em Lisboa, aproximar o poder de decisão dos cidadãos, permitir que quem vive longe da capital possa escolher o que é melhor para as suas geografias.
Para nós, não faz sentido que seja o Ministério da Educação a escolher um professor para uma escola em Aljezur, ou que simples processos de licenciamento aguardem meses por aprovações de organismos que desconhecem as nossas realidades.
Mas a palavra regionalização tem que ser clarificada. Se, por regionalização, se entende a criação de uma nova camada administrativa, de novos cargos políticos que teriam um elevado custo para os contribuintes, de novas burocracias que serviriam para dificultar ainda mais a vida das pessoas, somos contra.
Se, pelo contrário, significa diminuir a estrutura centralista do país e transferir poder para as regiões, sem aumentar e até diminuindo o custo total do Estado, estaremos sempre a favor.

SI – Na Assembleia da República, têm-se sucedido as resoluções para acabar com as portagens na Via do Infante ou, pelo menos, para introduzir descontos significativos. O que pensa deste tema e que soluções preconiza?

CV – A solução a encontrar para a Via do Infante terá que ser coerente em relação às soluções para outras regiões.
Por princípio, a Iniciativa Liberal está a favor do princípio do utilizador-pagador, todavia, é verdade que a alternativa que os algarvios e quem nos visita têm ao seu dispor, a EN125, não tem o mínimo de condições.
Será essencial continuar o trabalho de requalificação da EN125, de modo a que esta deixe de ser uma rua com 150 quilómetros.
No caso particular da Via do Infante, é fundamental que a renegociação da concessão, aquando do fim da atual, seja efetuada por via de um concurso competitivo, para assegurar o menor custo para o utilizador e contribuinte, bem como garantir uma manutenção de qualidade mais elevada.

SI – No início da atual crise da pandemia, o Governo anunciou um plano específico para o Algarve, que nunca chegou a ser concretizado. O que precisa o Turismo do Algarve para recuperar da pandemia?

CV – Para recuperar da pandemia, as empresas turísticas precisam de poder trabalhar. As empresas necessitam de estabilidade de planeamento, pelo que é importante encontrar um quadro que permita adaptarem-se à realidade pandémica e reduzir as restrições à atividade, como tem acontecido nos últimos dois anos.
Precisamos de libertar a carga fiscal das empresas em geral, mas será fundamental esta medida na área do turismo.
Precisamos de igualar as empresas turísticas perante o fisco. Não faz sentido que empresas que fazem parte do mesmo setor sejam alvo de IVA diferente. O Golfe, as Marinas continuam a ter o IVA máximo e são empresas que em muito contribuem para o crescimento do turismo no Algarve.
Precisamos urgentemente de reduzir a burocracia. Um pequeno empresário da área do turismo vê-se facilmente enredado em papéis e entidades, sem saber quem decide o quê e, acima de tudo, quando.
E as pequenas e medias empresas ficam anos à espera de licenças para poder ver o seu investimento começar a dar frutos.

SI – No caso de questões mais fraturantes, como a regionalização, as portagens na Via do Infante e a saúde, entre outras, se for eleito, votará na AR de acordo com a sua convicção, mesmo que vá contra as orientações do seu partido?

CV – Liberais são, por definição, pessoas livres que pensam pelas suas próprias cabeças. Dificilmente um liberal votaria contra as suas convicções.

SI – Quer acrescentar mais algum tema ou questão?

A educação. Horários por preencher, turmas sem professores, são alguns dos exemplos de situações que levam o Algarve para o fundo da tabela no que diz respeito aos rankings nacionais de escolas.
A melhoria do ensino deve ser uma prioridade constante. Providenciar as escolas com maior autonomia para se adaptarem às realidades locais e melhorarem a qualidade do ensino, bem como valorizar a importância dos professores na transmissão do conhecimento são medidas essenciais.
Permitir que os pais dos alunos escolham a escola livremente, tanto a nível público, como privado, para garantir uma melhoria contínua do ensino, é uma das propostas da Iniciativa Liberal.
Mas não só, pois, muitas vezes, o desconhecimento das regiões, leva um aluno que podia ter aulas numa escola a 12 quilómetros de casa a ter que percorrer 20 quilómetros para poder estudar, por causa do seu código postal.
A melhoria do ensino e a alteração da forma organizativa não podem ser um dogma.
Necessitamos de aproveitar a capacidade dos nossos professores e alunos e, acima de tudo, precisamos de ser capazes de lhes dar condições para alcançar o sucesso desejado.
O Algarve precisa de crescer, para crescer precisa de mudar e, para mudar, precisa da Iniciativa Liberal.

 



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