Água, pragas, mão de obra e apoios no roteiro do secretário de Estado da Agricultura no Algarve

Rui Martinho falou, em entrevista ao Sul Informação, sobre as principais questões discutidas nesta sua deslocação

O secretário de Estado da Agricultura na sua visita ao pomar das Frutas Tereso – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

O secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural esteve de visita ao Algarve no dia 18, para conhecer de perto alguns investimentos e reunir-se com diversas entidades. O Sul Informação, que acompanhou a parte inicial da visita, entrevistou Rui Martinho a meio da manhã, sobre as razões desta visita.

Durante a manhã, o secretário de Estado visitou a Adega do Cantor Sociedade de Vitivinicultura, Lda,no concelho de Albufeira, e o pomar e a central da Frutas Tereso, na zona de Algoz (Silves). Também durante a manhã, já em Silves, reuniu-se com a Associação de Regantes e Beneficiários de Silves, Lagoa e Portimão, bem como com dirigentes da AlgarOrange, Associação de Operadores de Citrinos do Algarve.

À tarde e após reunião com a Direção Regional de Agricultura e Pescas do Algarve, na sede deste organismo, o secretário de Estado visitou a Organização de Produtores Madrefruta, em Pechão (Olhão).

 

Sul Informação – Quais os objetivos desta visita ao Algarve?

Rui Martinho – Tem dois objetivos. Por um lado, saber o que se anda a fazer em cada uma das regiões e, também, tomar conhecimento dos problemas com que a atividade agrícola e os operadores económicos se confrontam no seu dia a dia, e, nomeadamente agora, no âmbito da preparação do Plano Específico para o Desenvolvimento da Agricultura Portuguesa, encontrar formas de ter respostas que permitam resolver ou ajudar a resolver esses problemas.
Mas a visita destinou-se também a valorizar aquilo que de extraordinário se tem feito em todas as regiões do país.
Estamos hoje aqui no Algarve, mas iremos a todas as regiões do país para contactar com a realidade agricultura, com os empresários, com os agricultores e com os problemas com que eles se confrontam.

Sul Informação: Quais são os principais problemas já identificados?

Rui Martinho – Há problemas que são comuns a todos os setores, nomeadamente a toda a região do Algarve, como a questão da água, da gestão da água, da disponibilidade de água, da utilização eficiente da água. Há outros problemas, como a descida da disponibilidade de mão obra para a realização dos trabalhos agrícolas.
Estamos agora a sair das Frutas Tereso e estamos muito debruçados sobre os problemas que afetam o setor da laranja, nomeadamente um conjunto de pragas que têm um relevo muito grande na produção, nomeadamente a mosca da fruta, mas também outras pragas mais recentes, como é o caso da trioza.
Estamos a fazer este contacto com as empresas para percebermos, junto com elas, o que se pode fazer. Já sabíamos que os problemas existiam, mas este diálogo é importante para avaliarmos, em conjunto, de que forma nos conseguimos organizar e como poderemos dar resposta a este problema.
O objetivo é conseguirmos juntar esforços entre a administração central e os produtores, contando com o apoio financeiro dos instrumentos que estamos a preparar.

SI –A seguir vai ter uma reunião com a associação de regantes. Qual é a agenda dessa reunião?

RM – Um dos grandes problemas do Algarve, como já referi, é a questão da disponibilidade da água. A reunião servirá para ver com eles o que é que se pode fazer, quais são os projetos que estão em curso, como é que estão as obras que estão a decorrer e ver também como é que podemos perspetivar a continuação desse plano de investimentos.
Trata-se de um plano de investimentos que é ambicioso, não só no Algarve, mas no país inteiro, mas que é absolutamente crucial para o desenvolvimento da atividade agrícola e para a sua competitividade.

SI – Foi anunciado, esta semana, um novo pacote de apoios que também tem a ver com obras de melhoramento nas redes de regadio já existentes, nas barragens, etc. Aqui no Algarve, também vai falar sobre isso?

RM – Vamos falar sobre todos os assuntos. Esse pacote que foi anunciado não é só sobre rega, essa é apenas uma componente, nem é a mais significativa.
Estamos a falar de um conjunto de medidas de apoio ao investimento nas produções agrícolas, ao investimento na transformação e comercialização, ao investimento de jovens agricultores e da instalação de jovens agricultores, enfim…dos pequenos investimentos.
É muito mais vasto do que a questão do regadio. O regadio é um dos avisos que está previsto no âmbito desse pacote muito grande e que, obviamente, também se aplicará aqui à região do Algarve. Serão potencialmente candidatos a esses apoios ao investimento, que vão ser abertos a muito curto prazo.

SI – Um dos problemas das barragens no Algarve, e não só, é que a condução da água nos canais é feita a céu aberto, gerando perdas muito grandes. Alterar este sistema é um dos investimentos que há muito tempo as associações de regantes dizem que é necessário fazer. Este novo pacote vai permitir fazer essa conversão?

RM – É um dos investimentos que vem sendo apoiado e que será a prioridade da nossa atuação no apoio ao regadio: pegar no regadio que existe e torná-lo muito mais eficiente. Ao torná-lo mais eficiente, vamos permitir que, com menos água, possamos regar maior superfície e com isso criar mais valor associado à atividade económica.
Mas essa componente da reabilitação, da modernização e da melhoria da eficiência na utilização da água é o principal objetivo, mais até que a expansão do regadio. O que interessa, de facto, é fazer esses investimentos que permitam fazer mais com menos.

 

O secretário de Estado na visita à Adega do Cantor – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

 

SI – Com este pacote que foi disponibilizado, será possível avançar com esses investimentos?

RM – Um dos avisos visa justamente o apoio à modernização e à melhoria da eficiência da rega. Para além de que aqui temos que ter em conta a questão da melhoria da eficiência da rega, que se coloca a dois nívei: ao nível das obras coletivas de regadio, mas também se coloca ao nível daquilo que cada exploração faz com a água que tem.
E aí são investimentos de natureza privada e novos sistemas de rega, investimentos em monitorização da água consumida, nomeadamente da disponibilidade de água no solo, e tudo isso é elegível, nomeadamente, nos avisos que vamos abrir, para investimento na exploração agrícola. Portanto, temos que conjugar os dois instrumentos para fazer face a um objetivo que é comum: usar bem a água que é escassa, conseguindo com isso produzir mais do que temos feito até agora, evitando o desperdício.

SI – O Algarve sempre foi uma região onde a água não é abundante. No entanto, temos assistido a uma grande expansão da agricultura irrigada. Isso não é um contrassenso? Como é que se consegue equilibrar essas duas coisas?

RM – A evolução que temos sentido a nível de alterações climáticas vem tornar ainda mais necessário termos um regadio, porque deixou de corresponder àquilo que há uns anos era possível fazer em sequeiro. Como hoje em dia há menos disponibilidade de água natural, se não houver regadio, nem essas culturas tradicionais provavelmente conseguiremos fazer em termos de competitividade.
Portanto, temos que encontrar formas de desenvolver o regadio de ter água disponível, para que possamos continuar a ter a atividade, nomeadamente, a tradicional. Por exemplo, a alfarrobeira é uma cultura tradicional do Algarve muito bem adaptada a esta região. Quem diz a alfarrobeira diz a amendoeira, mas isso era num período em que a água não era tão escassa como é hoje. Como hoje é muito mais escassa do que no passado, provavelmente até para essas culturas vamos ter que encontrar formas de, em determinados períodos em que as suas necessidades hídricas são mais acentuadas, lhes dar uma ajuda, para que elas consigam prosperar com mais facilidade do que infelizmente acontece.
Se isso não acontecer, essas áreas tradicionais vão continuar a ser abandonadas e isso é mau para a atividade agrícola, mas também para a preservação dos recursos e para outros tipos de coisas, nomeadamente, a prevenção dos incêndios. Nós sabemos que, quando há zonas abandonadas, o flagelo dos incêndios bate-nos à porta de uma forma muito intensa.

SI – E em relação à agricultura de menor dimensão, familiar, há apoios previstos?

RM – Nós temos estado a modernizar e a melhorar as condições do estatuto da agricultura familiar. Criámos um conjunto de incentivos muito relevantes para este tipo de agricultura. Seja ao nível de uma bonificação no consumo do gasóleo verde, seja ao nível do prémio de seguros, que é bonificado, mas também dando prioridade no acesso a todos os regimes de apoio, nomeadamente do apoio ao investimento na exploração agrícola.
Mas também criámos uma linha de crédito específica para quem tenha o estatuto da agricultura familiar, até 5 mil euros, com uma bonificação de 50% da taxa de juro praticada, para lhes permitir ter acesso ao crédito e fazer face à necessidade de fundo de maneio que têm. Portanto, há um conjunto de medidas que servem de instrumentos dirigidos especificamente para essa atividade, têm majorações nos apoios e têm prioridade nos acessos aos outros regimes.
Há um conjunto completo de medidas de apoio que visam apoiar a pequena agricultura e em particular a agricultura familiar.

SI – Esta tarde vai terminar a sua visita com uma reunião com a MadreFruta, que foi uma das pioneiras nesta nova vaga de expansão da agricultura intensiva, das estufas, no Algarve. O que é que vai ser discutido nessa reunião?

RM – Não levamos nenhum assunto para discutir com a MadreFruta. Vamos ouvir-nos, perceber a experiência deles, perceber o que está a ser feito, perceber quais são as dificuldades deles, e ver, como fizemos aqui nas Frutas Tereso e de manhã na Adega do Cantor, ver quais são as questões, quais são os problemas que se colocam e encontrar formas de ajudar a ultrapassar as dificuldades que se colocam a essas empresas e à agricultura da região em geral.

SI – Uma das questões que certamente estará em cima da mesa na reunião com a MadreFruta é a da mão de obra…

RM – Sem dúvida. Um dos problemas que tem vindo a ser referido, para além da água, é esta questão que é comum a todas as atividades, a mão de obra. Nós temos um problema de escassez de mão de obra. Temos que encontrar formas de o ultrapassar, nomeadamente, conseguindo acolher algumas populações que têm contribuído de forma decisiva para a manutenção da competitividade destes sistemas de produção.
E temos que encontrar formas de tornar as regiões mais atrativas, dando também melhores condições de vida a essas pessoas, para que se possam fixar por cá e deixem de ser precários, começando a ser um contributo permanente para a atividade da região, seja na agricultura, seja noutras atividades económicas.
Porque a escassez de mão de obra não se verifica só, infelizmente, na agricultura, no turismo também é muito sentida.
Vamos ter que encontrar formas de manter os melhores profissionais que conseguirmos encontrar, dando-lhes melhores condições de vida e de trabalho.
E é a isto que, todos em conjunto, quer a administração central, quer as autarquias, quer os próprios empresários, terão de encontrar formas de dar resposta e permitir com isso ativar os recursos humanos de que precisam.

 

 



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