Sabia que hoje é o último dia para se pronunciar sobre as dragagens no Rio Arade?

Areias dragadas serão depositadas em cinco praias – Nova e Cova Redonda, no concelho de Lagoa, e dos Três Castelos, do Amado e dos Careanos, no troço Vau-Rocha, no concelho de Portimão

Estuário do Arade – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

O período de participação pública no processo de Avaliação do Impacte Ambiental (AIA) da alteração do projeto de Aprofundamento e Alargamento do Canal Navegação do Porto de Portimão decorre apenas até amanhã, dia 28 de Outubro. Os curtos quinze dias para que as entidades externas – cidadãos, autarquias, associações – se pronunciem sobre um projeto complexo, para mais num período de mudança em alguns dos órgãos autárquicos, é uma das queixas mais frequentes em relação a este processo.

O projeto das dragagens do Arade para alargar o canal de navegação e a bacia de rotação, de modo a permitir a entrada de navios de cruzeiro de maiores dimensões no porto de Portimão, já tinha sido sujeito a AIA, em 2020. Mas as críticas foram tantas, que a Comissão de Avaliação de Impacte Ambiental (CAIA) do projeto de propôs, em Setembro do ano passado, a «emissão de parecer desfavorável».

Só que a Administração dos Portos de Sines e do Algarve (APS), que promove a obra de 17 milhões de euros, ainda antes de haver uma decisão definitiva, pediu a suspensão do procedimento de AIA, o que foi aceite pela Agência Portuguesa do Ambiente, permitindo assim à APS apresentar uma nova versão do projeto, já mais adaptada às exigências das várias entidades.

Depois de analisar as 287 páginas da «Nota Ambiental sobre a Reformulação do Projeto», o novo documento que pode ser consultado no Portal Participa.pt, é possível concluir que a APS responde à quase totalidade das questões que tinham sido levantadas na fase anterior, quer pelas entidades que se pronunciaram durante a discussão pública, quer pelas que integram a Comissão de Avaliação de Impacte Ambiental (CAIA).

As principais críticas tinham sido feitas pela Câmara de Lagoa e pela Junta de Freguesia de Ferragudo, bem como pelo proprietário do Castelo de São João do Arade, devido aos impactos que o projeto inicial iria ter quer nas praias estuarinas lagoenses – Angrinha e Grande -, quer no acesso dos pescadores ferragudenses ao seu portinho e do ISN ao seu salva-vidas, quer no projeto da Marina de Ferragudo.

Da parte das entidades ligadas ao património arqueológico, foram então referidos os impactos profundos que as dragagens vão ter nos vestígios, alguns deles milenares, afundados no leito do Arade.

Mas houve ainda preocupações com os locais de deposição dos materiais dragados, com os impactos ambientais no estuário, que é uma zona húmida de grande importância por exemplo para espécies de peixe de grande valor comercial.

Da leitura do novo projeto, chega-se à conclusão de as principais alterações foram feitas no Canal de Navegação, que passa por uma mudança de posição pontual da bacia de rotação de montante, eliminação da bacia de rotação na zona do anteporto, ajuste da largura do canal de navegação num troço central em linha reta junto ao Castelo de São João do Arade, introdução de proteção do talude de dragagem do Porto de Pesca e alteração do enrocamento da retenção marginal junto ao ISN e Praia da Angrinha.

Por outro lado, foram definidos novos locais para a deposição dos dragados com qualidade para serem colocados nas praias. Trata-se de cinco praias – Nova e Cova Redonda, no concelho de Lagoa, e dos Três Castelos, do Amado e dos Careanos, no troço Vau-Rocha, no concelho de Portimão.

Serão ainda depositadas areias, mas em zona imersa de dragados, na frente das praias do Alvor e da Meia Praia, uma solução que já antes estava prevista.

Quanto à vertente arqueológica, sobretudo ao riquíssimo e já identificado património subaquático acumulado no leito do estuário do Arade ao longo de milénios de navegações e naufrágios, o projeto passa a prever não só uma equipa de arqueólogos permanente, a acompanhar as dragagens 24 horas sobre 24 horas, como escavações de emergência em determinadas zonas mais sensíveis e ainda uma série de cuidados e de medidas que, ao que o Sul Informação apurou, respondem em grande parte às questões levantadas anteriormente.

Além disso, fica preto no branco que será a Administração dos Portos de Sines e do Algarve a pagar todos estes trabalhos arqueológicos, algo que deverá custar perto de 3 milhões de euros.

 

Assim, o projeto passa a prever não só a utilização de «draga de baldes com porão» e equipada com «sondas AOV», de modo a facilitar «a leitura de dados em tempo real ao arqueólogo a bordo». Este sistema permite o acompanhamento permanente dos trabalhos de dragagem (que se prolongam por 24 horas ao longo de sete meses) nas áreas de «elevada sensibilidade arqueológica».

Por outro lado, segundo o documento de aditamento ao anterior Estudo de Impacte Ambiental, «durante a dragagem, os sedimentos removidos por meio de balde devem ser colocados em crivo sobre o porão. Os sedimentos serão então lavados recorrendo a jatos de água. No final da lavagem de cada carga, será feita a observação dos materiais no crivo».

Além disso, «a monitorização permanente dos depósitos de dragados em praia assegurada por um arqueólogo em cada descarga», prevendo-se igualmente a «realização de prospeções com detetor de metais periodicamente». O acompanhamento destas ações será «garantido por equipas com valência em arqueologia náutica e subaquática».

Nos casos de maior valor patrimonial – nomeadamente nos sítios arqueológicos já identificados Arade13/Geo5 e Arade15/Geo1, «correspondentes a vestígios de embarcações antigas e de interesse patrimonial, deverá proceder-se a uma escavação arqueológica integral com depósito dos materiais em jazida secundária em zona com idênticas características, de forma a garantir a preservação de todos os elementos».

Durante a fase de execução, «as dragagens deverão ser realizadas com recurso a draga de balde na área de 50 metros em torno do local dos vestígios para possibilitar a observação direta dos sedimentos mobilizado».

 

Castelo de São João do Arade, em Ferragudo – se for aprovado o projeto, esta paisagem mudará para sempre – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

Apesar de o que aqui publicamos ser apenas um resumo, fica claro que o novo projeto promovido pela APS se esforça por responder às principais questões levantadas, pelo menos no que diz respeito aos impactos das dragagens no imediato.

No entanto, fontes contactadas pelo Sul Informação que nada fica definido quanto ao imenso espólio arqueológico, nomeadamente referente a navios antigos, que será retirado do fundo do estuário, durante as dragagens e a campanha arqueológica.

«Esse espólio tem que ir para algum lado, caso contrário perde-se. Será que as Câmaras de Portimão ou de Lagoa têm alguma estratégia já definida para isso? O Museu de Portimão, por exemplo, tem espaço nas suas reservas para acolher o que vai sair dali? Lagoa nem sequer tem museu, nem conservador, nem espaço para reservas. O volume de bens que serão retirados é brutal e ninguém está preparado para isso», garantiu uma fonte.

«Há aqui um ónus futuro enorme, que resulta desta intervenção no estuário do Arade, que não está contabilizado. Se se quiser fazer um museu para acolher todo este espólio ou aumentar o museu de Portimão, todo esse investimento terá de ser pago pelas Câmaras de Portimão e de Lagoa. E isso não está sequer pensado», acrescentou a mesma fonte.

O processo de Avaliação do Impacte Ambiental da alteração do projeto de Aprofundamento e Alargamento do Canal Navegação do Porto de Portimão pode ser consultado aqui.

 

 



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