João Mariano lança novo livro “Entre as Águas” no Imago Lisboa Photo Festival

Giacomo Scalisi apresenta o livro na Galeria Imago, em Lisboa, a 16 de Outubro

«Estive dias e dias sem ouvir ou ver ninguém, andei mesmo ali entre as águas». É assim que o fotógrafo João Mariano resume a sua imersão, da nascente à foz, na ribeira dita de Aljezur, que nasce algures na serra de Monchique e desagua na praia da Amoreira e cuja exploração resultou no livro de fotografia “Entre as Águas”, que será apresentado no sábado, 16 de Outubro, às 17h30, na galeria Imago, em Lisboa, no âmbito do Imago Lisboa Photo Festival 2021.

Este é o mais recente projeto artístico de João Mariano e provavelmente aquele em que levou mais longe a sua relação umbilical com o território que o rodeia. Durante meses a fio, calcorreou aquela que é conhecida como ribeira de Aljezur — pouco antes de encontrar o mar —, mas que assume muitos outros nomes ao longo do percurso sinuoso que percorre desde o ponto mais alto da serra de Monchique.

O homem e a natureza sem nada a mediá-los — numa relação extremada em vários locais em que duvidou seriamente se outro ser humano teria antes por ali passado. E com o isolamento, permitiu-se o tempo certo de contemplação que um trabalho tão subjetivo exige.

O resultado é um registo autoral de total dedicação à paisagem, como num poema. Ao mesmo tempo, dá a conhecer uma outra dimensão da região do Algarve, muito menos óbvia e reconhecida.

É o próprio João Mariano que, no seu livro, de certa forma, sintetiza o trabalho: «(…) a ribeira que nasce na vertente noroeste do alto da serra de Monchique, junto à Fóia, e desce sinuosa e ondulante até à Ponta Viva, na praia da Amoreira, em Aljezur, sempre foi uma referência afetiva. Acompanhou toda a minha infância, adolescência e continua a acompanhar a minha existência. Foi nela que dei os primeiros mergulhos, foi nela que pesquei os primeiros bordalos, com os amigos, e enguias com o meu pai, foi nela que apanhei à mão pequenos cágados, com os quais brincava em criança… Percorri as suas margens e o seu leito vezes sem conta. Nadei e naveguei de canoa nas suas águas, outras tantas… Inconscientemente, sem conseguir resistir ao seu water appeal! Agora, com este trabalho, perscrutei a sua alma, entrei profundamente no seu interior e conheci-a ainda mais a fundo. Este é o meu singular tributo a este ziguezagueante ser telúrico recheado de água, cascalho, areia e rochedos … (…)»

 

Quanto tempo demorou este trabalho?, quis saber o Sul Informação. «Trinta anos!», responde de imediato João Mariano. Ou mais, se calhar. Porque, como recordou o fotógrafo, a primeira vez que se lembrou de usar a sua ribeira da Amoreira (ou do Chilrão, do Passil, das Cercas, de Aljezur, conforme o local onde ela passa) como seu objeto fotográfico estava ainda a estudar no Ar.Co em Lisboa. Mas esse projeto nunca se concretizou…até agora.

«Na realidade, demorei mais de um ano». É que, explica, foi preciso «sentir as mudanças e os ciclos da natureza, a ribeira com muita água ou seca. Começar da nascente e ir por ali abaixo ou ao contrário. Caminhar pelo leito da ribeira e chegar a sítios virgens, que até se duvidaria que pudessem existir no Algarve. Aquele verde luxuriante, como se estivéssemos em Trás-os-Montes ou na Amazónia». Houve locais em que João Mariano teve de nadar na ribeira, outros que foram desbravados à força da catana que teve de comprar, qual explorador da selva.

Um dos locais extraordinários é uma queda de água num local quase inacessível: «quando a vi pela primeira vez, corria apenas um fiozinho de água. Mas depois foi chovendo e voltei lá», recorda.

O que João Mariano pretendeu, neste seu livro de fotografia a preto e branco (que é uma das marcas do seu trabalho), não foi fazer um registo documental da ribeira. «A minha linguagem fotográfica é um bocadinho subjetiva», salienta. Mas, para que o livro não fosse apenas a sua expressão mais subjetiva, há imagens que «mostram alguns ângulos mais abertos da paisagem».

Algo que o livro não é, de todo, é um guia turístico. Aliás, explica João Mariano, as suas imagens não dão pistas sobre os locais. No seu p&b expressionista, de ambiente “Tim Burton”, este trabalho que «não é documental», mas antes «subjetivo», convida a um mergulho num Algarve onírico que se pensava já não existir ou até nunca ter existido.

Como em todos os livros de fotografia de João Mariano, o trabalho de produção e de impressão é muito cuidado. Afinal, trata-se de verdadeiros objetos de arte. A capa, que o autor ainda não viu depois de pronta, é uma «impressão de preto sobre preto», cuja ideia é «refletir o que vi e senti nalgumas formações rochosas ao longo da ribeira. Todo o universo da ribeira é entre as águas e a capa também anda ali entre as águas».

Depois da apresentação em Lisboa, no dia 16, que será feita por Giacomo Scalisi, o fotógrafo prevê que o livro será, uns quinze dias depois, apresentado também em Aljezur e em Monchique, os dois concelhos que são ligados por este fio líquido e cujos municípios ajudaram a financiar a edição da obra. Ainda não há datas, mas, quando as houver, o Sul Informação dará disso notícia.

Esta é uma edição da 1000olhos.pt e conta com o apoio da Câmara Municipal de Aljezur e da Câmara Municipal de Monchique.

 

 

 



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