Algarve 2030, uma agenda para a década

Qual é a linha de rumo para a década, a agenda de desenvolvimento e a estrutura de missão que a irá executar?

Estamos no início da década, o Algarve executa ainda o PT 2020 até 2023 e prepara-se para entrar em ação no âmbito do PRR 2026 e, mais à frente, no PT 2030. Em princípio, não faltarão os recursos financeiros, mas, nesta altura, a questão fundamental parece-me ser outra, a saber, qual é a linha de rumo para a década, a agenda de desenvolvimento e a estrutura de missão que a irá executar.

 

Uma agenda para a década

Na minha opinião, os grandes temas para uma agenda de desenvolvimento serão os seguintes:

1) O planeamento dos recursos hídricos para a região
As secas severas irão suceder-se, a turistificação da região será uma atividade em contraciclo, um modelo mais austero em matéria de recursos hídricos será inevitável.
Que política de água doce para a região?

2) O plano de combate contra as alterações climáticas
Mitigação, remediação, adaptação serão operações cada vez mais frequentes em toda a região com um enfoque especial na gestão da zona costeira, onde serão despendidos recursos escassos preciosos.
Que política de combate salvaguarda melhor os impactos das alterações climáticas?

3) O plano para a economia verde e circular da região
Para lá da prevenção e mitigação dos efeitos das alterações climáticas, a região precisa de ações integradas nos subsistemas agroalimentar, agroflorestal e agropaisagístico.
Que plano verde para a região-cidade no quadro de ações integradas de gestão paisagística e que política circular para a gestão urbana?

4) A matriz energética renovável para a região
No quadro da política de descarbonização e diversificação das fontes de energia, a região precisa de moderar as suas pegadas ecológica, energética e hídrica.
Que matriz energética renovável acautela melhor os recursos escassos da região-cidade do Algarve?

5) O mar algarvio e o programa para a economia azul
O mar algarvio precisa de ser um sinal distintivo da região. Da reserva marinha aos recursos marinhos da pesca, da proteção das ilhas barreira à gestão sustentável do turismo.
Que política integrada para a economia azul salvaguarda melhor a sustentabilidade do mar algarvio?

6) A defesa da floresta algarvia e o plano de silvicultura preventiva
As alterações climáticas estarão na origem de muitos episódios relacionados com secas severas e fogos florestais que afetarão diretamente e gravemente o barrocal e a serra algarvios.
Que política de ordenamento e silvicultura preventiva acautelarão melhor estas ocorrências?

7) A regulação do cluster agroalimentar para a região
A proteção dos recursos naturais vai obrigar a moderar os sistemas de produção agrícola regionais, a região terá de rever o seu sistema agroalimentar à luz das melhores práticas agroambientais.
Que ajustamentos agroecológicos e práticas de regulação setorial serão necessários para valorizar o cluster agroalimentar regional?

8) O cluster das indústrias culturais e criativas da região
Numa região tão visitada as indústrias culturais e criativas serão, cada vez mais, um cartão de visita quase obrigatório.
A região irá reclamar três ou quatro eventos de categoria elevada para mudar, progressivamente, o seu perfil turístico.
Que política integrada nesta área para atrair o talento criativo mundial?

9) O programa de transição digital para a região
A agenda para a década estará muito dependente do aparelho tecnológico e digital que for posto no terreno, o mais cedo possível.
Uma plataforma analítica de dados, o programa de literacia digital, as lojas online do cidadão e o lançamento de vários serviços à distância serão essenciais numa primeira fase, mas, também, o acolhimento da estrutura de startingup regional e o respetivo espaço de coworking.
Que política de transição digital salvaguarda melhor uma distribuição equitativa da infraestrutura digital e respetivos serviços?

10 ) A coesão social e a promoção do emprego regional
A região deve dar uma atenção especial à sua coesão social devido à sazonalidade e precariedade de muitos dos seus empregos. Por isso, a importância de um setor de serviços proporcionados pela economia comunitária e colaborativa que as plataformas digitais made in irão proporcionar no âmbito de programas para os desempregados de longa duração, trabalhadores temporários, precários e intermitentes e, também, os programas de envelhecimento ativo para a sociedade sénior.
Que política de coesão social acautela melhor a condição de recursos e a qualidade de vida dos estratos mais sensíveis da população?

 

A CIM 2030, uma estrutura de missão para a região-cidade do Algarve

Está em curso a descentralização e a transferência de competências para os vários níveis de administração. Neste contexto, a Comunidade Intermunicipal (CIM), como rede de municípios ou região-cidade, será a sede privilegiada para acolher e organizar a provisão de bens e serviços comuns fundamentais, as chamadas utilities, por exemplo:

– A oferta de mobilidade suave e transportes públicos intermunicipais,

– A oferta de infraestrutura digital, rede e prestação de serviços digitais,

– A coordenação dos serviços de rede das principais utilities intermunicipais,

– A coordenação de medidas do plano verde, contra as alterações climáticas,

– A coordenação do abastecimento intermunicipal de alimentos,

– A coordenação de cuidados de saúde e apoio domiciliário em regime ambulatório,

– A coordenação da rede de serviços de cultura, desporto, recreio e terapêuticos,

– A oferta de rede de serviços de segurança e proteção civil contra acidentes graves,

– A oferta da rede de lojas do cidadão e outros serviços à distância,

– A coordenação da rede de serviços de ensino, emprego e formação profissional,

– A coordenação dos investimentos intermunicipais financiados por fundos europeus.

Todos estes serviços criam benefícios de contexto favoráveis à execução da agenda para a década, podem ser objeto de uma gestão agrupada, ter uma abordagem territorial ajustada à geografia própria da CIM e, do mesmo modo, uma engenharia financeira específica.

Além disso, compete, ainda, à CIM promover plataformas colaborativas e comunidades inteligentes, que são fundamentais no desenho, geografia e animação do território-desejado.

Face aos grandes desafios desta década, a CIM 2030 não poderia ficar contida ou limitada pelas atribuições e competências da comunidade intermunicipal e do seu secretariado executivo. Quer dizer, compete ao conselho intermunicipal designar uma estrutura de missão que ficará encarregada de elaborar e executar a agenda para a década em estreita cooperação e parceria com os atores privados e sociais da região e fora da região.

 

Notas Finais

Os territórios digitais são um novo emblema das políticas do território. Doravante, o governo dos comuns, a mutualização de recursos, o centro partilhado de recursos digitais, a região inteligente e criativa, a cultura do património, serão sinais distintivos da região-cidade.

No horizonte de uma década estou a pensar, sobretudo, na população mais jovem e para ela há quatro iniciativas que podem fazer toda a diferença.

Em primeiro lugar, a criação da escola de artes e tecnologias para acolher no seu seio os desafios da agenda digital, em segundo lugar, o projeto smart region, um projeto colaborativo sobre o qual assentará o ator-rede CIM e a sua inteligência coletiva, em terceiro lugar, um grande programa regional de literacia digital que seja um fator genuíno de democratização e qualidade de vida e não um fator suplementar de exclusão social, por último, o projeto de uma associação regional de jovens empresários e o correspondente programa de formação empresarial, no qual se espera que as IES (instituições de ensino superior), as AEP (associações empresariais e profissionais) e as AP (administrações públicas), ou seja, os incumbentes da política de desenvolvimento regional, se entendam sobre a sua própria modernização e o imperativo de renovação empresarial, fazendo da agenda para a década o estímulo e o instrumento necessários para criar a próxima geração de empresários algarvios.

Voltarei ao assunto, para mais desenvolvimentos.

 

Autor: António Covas é Professor Catedrático Aposentado da Universidade do Algarve
 

 



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