CCDR e ICNF defendem avaliação ambiental para as Alagoas Brancas, Lagoa espera pelo tribunal

Câmara de Lagoa estranha que ICNF tenha “mudado de ideias” em relação às Alagoas Brancas. Instituto diz que não foi isso que aconteceu

A Almargem e o Instituto da Conservação da Natureza e Florestas acham que sim, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) acha que não. A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento (CCDR) do Algarve ouviu os argumentos e emitiu um parecer que defende a realização de Avaliação de Impacte Ambiental antes de o loteamento das Alagoas Brancas poder avançar. No entanto, quem tem poder para decidir se essa avaliação é necessária é a Câmara de Lagoa e a autarquia vai esperar «tranquilamente» pelo Tribunal.

Em comunicado enviado na segunda-feira, a Associação Almargem revelou que a CCDR Algarve, depois de ter auscultado o ICNF e a APA/ARH do Algarve, considerou necessário que o loteamento das Alagoas Brancas, no concelho de Lagoa, onde se situa uma zona húmida que é abrigo de muitas aves, fosse sujeito a uma Avaliação de Impacte Ambiental.

Este parecer, que não é vinculativo – mas já lá vamos -, foi enviado para o Tribunal Administrativo de Loulé, onde foi interposta uma providência cautelar pela Almargem e pela Associação Cívica Cidade da Participação, contra o Município de Lagoa – e com a Edifícios Atlântico como contrainteressada -, «para evitar o início de quaisquer trabalhos de urbanização os quais, irreversivelmente, iriam destruir as Alagoas Brancas».

A associação ambientalista revelou – e um esclarecimento enviado ao Sul Informação pela CCDR confirmou – que o parecer considera que o projeto nas Alagoas Brancas «é suscetível de provocar impactes negativos significativos no Ambiente» e que, por isso, «se justificará em nosso entender a sujeição do projeto a procedimento de AIA».

Mas, neste caso, o que a CCDR tem a dizer tem pouco peso. É que a zona em causa não está abrangida por nenhum instrumento de ordenamento do território, sem ser uma UP3 (Unidade de Planeamento), que é de abrangência municipal, e que prevê que o projeto possa avançar sem a necessidade de AIA.

Também o ICNF, que admite consequências para a avifauna que existe no local, pouco pode fazer, além de emitir a sua opinião. No entanto, a opinião do instituto, considera Luís Encarnação, presidente da Câmara de Lagoa, mudou ao longo dos tempos.

 

Luís Encarnação

 

Em declarações ao Sul Informação, o autarca explica que, para a emissão do parecer, «a CCDR consultou a APA, que disse que não era necessária a AIA, em coerência com o que já tinha dito. Já o ICNF, apesar de dizer que não é uma área com dimensão para ter classificação a nível nacional, diz que devia ter essa avaliação. Acho isto estranho, porque o ICNF acaba por passar um atestado de incompetência a ele próprio, visto que, no passado, nas duas vezes em que estiveram no local, disseram que não tinha interesse ambiental».

Castelão Rodrigues, delegado regional do instituto, diz ao nosso jornal que não é bem assim.

«O ICNF sempre teve a mesma visão, que foi aquela que foi transmitida no tempo da minha antecessora à Câmara de Lagoa. Houve um estudo pago pelo POSEUR e pelo Fundo Ambiental em três lagoas do Algarve: o Trafal/Almargem, a Lagoa dos Salgados e as Alagoas Brancas. Esse estudo concluiu que há valores naturais a preservar, em virtude da fauna e da flora existente», garante.

No caso das Alagoas Brancas, o estudo identificou 114 espécies de aves, apesar da reduzida dimensão, destacando-se a presença naquele local de pelo menos 1% da população nacional reprodutora de camão (Porphyrio porphyrio) e 1% da população regional (Mediterrâneo, Mar Negro e África Ocidental) de Íbis Preta (Plegadis falcinellus).

 

Castelão Rodrigues, do ICNF

 

Castelão Rodrigues assegura que o ICNF tem sempre dito que há valores naturais neste local «e agora também o dissemos à CCDR. No entanto, das três lagoas, aquela que tem dimensão territorial para fazer parte da rede nacional é a Lagoa dos Salgados e só aí é que tem que ser o ICNF a promover a sua defesa».

No caso do Trafal/Almargem e das Alagoas Brancas, por não terem «dimensão territorial, não pode ser o ICNF a fazer esse procedimento. Tem que ser a nível municipal. Isso foi transmitido. Loulé fez um procedimento e, neste momento, está em apreciação para classificar o Trafal como área de reserva. O mesmo foi dito à Câmara de Lagoa». Mas Lagoa não avançou.

Agora, o ICNF foi questionado pela CCDR sobre a necessidade da AIA, tendo transmitido que, «se a autoridade da área [Câmara de Lagoa] entender que deve ser feita [a avaliação], tendo em conta os valores ambientais existentes, ela pode ser feita».

No entanto, segundo Luís Encarnação, é o tribunal que vai ditar se haverá, ou não, Avaliação de Impacte Ambiental nas Alagoas Brancas.

«Já apreciámos o parecer da CCDR. O tribunal pronunciou-se, disse que queria ouvir um parecer e nós remetemos toda a informação do tribunal para a CCDR que, como defendíamos, era quem tinha de se pronunciar e não a Câmara. Agora, a CCDR pronunciou-se, analisámos e já remetemos esse parecer para o Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) Central», disse o autarca ao Sul Informação.

O processo, explicou, saiu do TAF de Loulé «porque o promotor, enquanto entidade contrainteressada, recorreu e transitou para o Central».

Agora, segundo o comunicado da Almargem, após o parecer da CCDR, «a Câmara Municipal de Lagoa tem 25 dias para decidir sobre a necessidade de AIA, uma vez que já foi realizada a auscultação às entidades competentes e conhecida a sua posição».

Mas, segundo Luís Encarnação, «vamos aguardar com toda a tranquilidade a tomada de decisão do tribunal. Seja qual for, vamos respeitar. Sempre foi isso que dissemos e estamos muito tranquilos», garante o autarca.

O presidente explica que «não é o Município de Lagoa que quer fazer nas Alagoas Brancas o que quer que seja. Aliás, estamos a aguardar que o PDM seja publicado em Diário da República, e que entre em vigor, sendo que aquela área passará a ser uma área rústica. No entanto, agora há ali uma UP3, que é um instrumento de ordenamento do território que não pode ser contrariado».

Encarnação realça que «o promotor tem direitos e, da nossa parte, teremos sempre de respeitá-los. Qualquer decisão que o Município tome e que não respeite o instrumento de planeamento do território tem consequências. Além da obrigação de indemnizar o promotor, o executivo pode incorrer também em processos cíveis e criminais, que podem levar à perda de mandato».

Por tudo isto, «se o tribunal disser que se deve cumprir o parecer da CCDR e for exigida a Avaliação de Impacte Ambiental, comunicaremos ao promotor, que é parte contrainteressada no processo, que, por decisão do tribunal, é necessária. Aí, o promotor fará o que entender. A nossa postura é a de salvaguarda do Município de Lagoa», conclui Luís Encarnação.

Também a CCDR, no esclarecimento enviado ao nosso jornal, diz aguardar a decisão do tribunal, mas não esquece que a Câmara de Lagoa pode tomar uma decisão.

«Esta Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional aguarda a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé ou a iniciativa do Município no sentido da sujeição do projeto de loteamento em apreço a procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental», considera a entidade.

 

Atualizado às 11h50 com esclarecimentos da CCDR Algarve sobre o processo.
 

 



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