Associações acusam: Ministério da Agricultura ignora peritos, académicos e ONGA no Plano Estratégico da PAC

«O documento, tal como está, não irá contribuir adequadamente para o cumprimento dos objetivos do Pacto Ecológico Europeu»

Estufas a perder de vista no Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina -Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

Uma plataforma constituída pelas 15 principais Organizações Não Governamentais do Ambiente (ONGA) portuguesas acusou hoje, em comunicado, o Ministério da Agricultura de «ignorar peritos nomeados, académicos e ONGAs na elaboração do Plano Estratégico da PAC», assim pondo «em causa Pessoas e Ambiente».

Segundo o comunicado, o Plano Estratégico para a PAC 2023-27, em Portugal, «põe em causa o futuro da biodiversidade nacional e da qualidade de vida das populações». Este instrumento de política fundamental para o futuro das pessoas e da natureza «tem de ser mais sustentável, justo e benéfico do ponto de vista ambiental, social e económico», considera a plataforma.

No seguimento da tomada de posição de 14 ONGA portuguesas no início deste mês de Julho, que consideraram a proposta de estrutura do PEPAC para Portugal do GPP/Ministério da Agricultura «um potencial atentado à natureza e à biodiversidade nacional, que é a base de toda a vida, foram agora 9 dos peritos convidados pelo GPP para acompanhar o processo que tornaram pública a sua posição de preocupação sobre a nova PAC».

Aliás, parte destes peritos «já se demitiu do acompanhamento do processo. Em Abril deste ano, mais de 100 académicos publicaram um manifesto expondo os desafios que a agricultura nacional enfrenta e apelando a que este setor faça uma verdadeira transição ecológica».

As preocupações de todos são evidentes: a agricultura é uma das principais causas da perda de biodiversidade na União Europeia; em Portugal é o principal consumidor de água; e o setor precisa também de reduzir as suas emissões de gases com efeito de estufa e outros impactos sobre a biodiversidade. No entanto, salientam as 15 ONGA no seu comunicado, «as propostas até agora apresentadas durante a elaboração do PEPAC não respondem a nenhum destes desafios».

Pelo contrário, a informação disponível no site do GPP, sobre a estrutura do PEPAC, «torna evidente que as intenções do Estado Português para a aplicação do financiamento da PAC 2023-27 não sofreram alterações significativas face ao anterior quadro comunitário». Ou seja, «continua por realizar uma verdadeira reforma da aplicação desta política em Portugal, capaz de operar uma mudança transformadora no sector da agricultura e nos sistemas alimentares tendo em vista a sua sustentabilidade ambiental e social».

A plataforma considera que «o documento, tal como está, não irá contribuir adequadamente para o cumprimento dos objetivos do Pacto Ecológico Europeu».

«Até aqui a Ministra da Agricultura tem ignorado os peritos, as ONGAs, a ciência, a saúde pública, em suma, a sociedade civil que exige um planeta mais sustentável para as próximas gerações. As ONGAs procuraram contribuir para o PEPAC com propostas concretas enviadas o
ano passado em Julho, a maior parte das quais não foram refletidas nos documentos postos em consulta pública no final do ano», afirmam as organizações.

«Alguns destes conteúdos são muito preocupantes e colocam em causa a Estratégia de Biodiversidade 2030, a Estratégia do Prado ao Prato e as metas da UE em matéria de mitigação e adaptação às alterações climáticas», acrescentam.

As ONGA lembram ainda que a primeira versão do documento deveria ter sido tornada pública durante o presente mês de Julho, «mas a sua publicação foi agora empurrada para Setembro, quando Portugal tem de apresentar a sua proposta à Comissão Europeia até 1 de Janeiro, o que faz temer o pior – mais do mesmo, evitando-se o debate e a participação consequentes de toda a sociedade».

A plataforma sublinha igualmente que «a Ministra da Agricultura continua a ignorar todas estas vozes que representam a sociedade civil, e que já disseram ser preciso mudar os conteúdos do PEPAC e a forma como se está a conduzir este processo».

A ministra «não pode continuar a ignorar as propostas feitas pelas ONGA, pelos académicos e pelos peritos», reforçam.

No seu comunicado, as 15 organizações ambientalistas defendem que «o PEPAC é importantíssimo para Portugal ao canalizar a sua quota-parte do orçamento da PAC, que representa cerca de um terço de todo o orçamento da UE: a nova PAC determinará não só o tipo de produção de alimentos que teremos no futuro, que deve estar em equilíbrio com o planeta, mas também a natureza que queremos e que temos direito a ter de volta e que é o escudo protetor da humanidade».

Por isso, consideram, «a proposta de arquitetura do PEPAC Português requer uma profunda revisão», já que «a atual proposta não é positiva nem para o ambiente nem para o clima».

Assim, as ONGA apresentam cinco exigências:

1. uma PAC que premeia quem faz realmente melhor, compensando os agricultores de acordo com o nível de melhorias no desempenho ambiental e climático.

2. uma PAC que produz alimentos sustentáveis, assegurando que pelo menos 30% das ajudas diretas à produção contribuem também para benefícios para o ambiente e clima.

3. uma PAC que fomenta a biodiversidade criando mais espaço para a natureza, e favorecendo TODAS as explorações agrícolas que promovam MAIORES valores de biodiversidade e elementos paisagísticos, principalmente na Rede Natura 2000.

4. uma PAC que cumpre as metas do Acordo de Paris e é coerente com as políticas nacionais de adaptação e combate às alterações climáticas.

5. uma PAC que não apoia novos projetos de regadio que ameaçam a conservação dos agroecossistemas e o bom estado dos nossos aquíferos, rios e ribeiras, bem como as pessoas e biodiversidade que deles dependem.

Defendem ainda que «o PEPAC também tem de contribuir para a luta contra as alterações climáticas através da descarbonização do Sistema Alimentar, que entre várias coisas passa por: encurtar as cadeias de abastecimento, por fomentar sistemas alimentares locais, por produzir alimentos saudáveis de forma sustentável, por utilizar de forma sustentável recursos naturais (em especial solo e água) e fatores de produção».

A terminar o seu comunicado, as ONGA manifestam-se «disponíveis para concertar esforços com estas e mais vozes da sociedade civil, incluindo a participação numa plataforma que venha a ser criada para trabalhar com o Ministério da Agricultura na reformulação urgente do PEPAC».

Lista das organizações signatárias:
A ROCHA – Associação Cristã de Estudos e Defesa do Ambiente
ADPM – Associação de Defesa do Património de Mértola
ALDEIA – Acção, Liberdade, Desenvolvimento, Educação, Investigação, Ambiente
Almargem – Associação de Defesa do Património Natural e Cultural do Algarve
ANP|WWF – Associação Natureza Portugal, em associação com a WWF
ATN – Associação de Transumância e Natureza
FAPAS – Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade
GEOTA – Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente
LPN – Liga para a Protecção da Natureza
PALOMBAR – Conservação da Natureza e do Património Rural
QUERCUS – Associação Nacional de Conservação da Natureza
SPEA – Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves
SPB – Sociedade Portuguesa de Botânica
SPECO – Sociedade Portuguesa de Ecologia
ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável

 

 
 
 



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