LPN denuncia à Comissão Europeia destruição de charcos protegidos na Costa Sudoeste

«A agricultura intensiva irresponsável avança incessantemente em plena Área Protegida, desta vez arrasando habitats raros e prioritários à luz da legislação europeia»

A Liga para a Protecção da Natureza (LPN) deu hoje conhecimento à Comissão Europeia da destruição total, na Costa Sudoeste, de cinco charcos temporários mediterrânicos, «habitats prioritários cuja conservação foi inclusivamente alvo de financiamento europeu durante mais de cinco anos».

Em comunicado, a LPN salienta que estes «eram os últimos sobreviventes de uma das mais importantes concentrações de charcos no país», uma vez que «os restantes foram destruídos há uns anos».

O avanço da agricultura intensiva nesta área protegida «está, uma vez mais, na origem deste desastre que vem ilustrar a progressiva degradação da Costa Sudoeste, detentora de tesouros naturais extraordinários que não existem em nenhum outro lugar no mundo».

A LPN recorda que, dentro desta área protegida, classificada simultaneamente como Parque Natural e como Rede Natura 2000, coexiste o Aproveitamento Hidroagrícola do Mira, «tendo como pressuposto a compatibilização da atividade agrícola com os valores naturais existentes na área».

No entanto, «o resultado de inspeções e grupos de trabalho criados para avaliar a gestão do Parque e da atividade agrícola apontou já falhas graves e o incumprimento da legislação, como a falta de monitorização da qualidade das águas subterrâneas, do solo, das espécies e habitats, pondo claramente em causa qualquer modelo de coexistência sustentável».

No âmbito do Projeto LIFE Charcos – coordenado pela LPN entre 2013 e 2018, e financiado por fundos europeus – foram identificados 133 charcos temporários mediterrânicos, considerados habitats prioritários na Zona Especial de Conservação da Costa Sudoeste.

Três anos depois, constata-se que o investimento aplicado e o conhecimento adquirido sobre estes valiosos redutos de biodiversidade não
foram suficientes para impedir a sua destruição. «As fotografias tiradas em Vale Figueira, no concelho de Odemira, em Junho de 2018 e, na mesma zona, em Fevereiro de 2021, não deixam margem para dúvidas: 5 charcos sucumbiram sob novas estufas e culturas agrícolas», denuncia aquela organização ambientalista.

Só que, salienta a LPN, «este é apenas um exemplo».

 

Neste terreno, havia um charco temporário. Foi aterrado – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

 

Perante este delito, a LPN fez uma denúncia à Comissão Europeia, «demonstrando que o seu esforço na preservação do património natural português pode estar em causa pela ineptidão do próprio Estado» português.

«Em áreas protegidas, não é aceitável que habitats prioritários sejam destruídos, sobretudo quando existem obrigações claras na sua preservação e gestão, e são assumidos compromissos perante a sociedade e a União Europeia. A Costa Sudoeste encontra-se atualmente sem monitorização e gestão adequadas, rumando à progressiva eliminação dos seus valores naturais», acrescenta.

O que se passa nesta região é também «reflexo da desarticulação entre o Ministério da Agricultura e o Ministério do Ambiente». A LPN considera que «as sinergias entre estas áreas de gestão territorial seriam benéficas, quer para as práticas agrícolas, quer para a conservação da natureza».

Nesse sentido, a LPN, que contribuiu para a criação desta área protegida e que tem cooperado com a cedência de informação técnica e científica relativa a este habitat, reunida ao abrigo do financiamento da Comissão Europeia, fez um pedido de reunião conjunta com os dois Ministérios, propondo-se contribuir para uma melhor articulação.

A LPN defende que «o património natural da Costa Sudoeste, que pertence a todos, não pode ser eliminado por explorações agrícolas irresponsáveis e insustentáveis do ponto de vista ambiental, social e económico».

«Quando o lucro de atividades privadas se baseia na sua sobreposição aos valores naturais e humanitários é um sinal claro de que Portugal se afasta de um modelo socioeconómico sustentável e aceitável em termos civilizacionais. Este é um recuo evolutivo dramático que só com cooperação e sentido de responsabilidade se consegue impedir», conclui a mais antiga ONG de Ambiente portuguesa, no seu comunicado.

Investigação a decorrer num dos charcos temporários da Costa SW – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação (arquivo)

 

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