As curvas da fuga ao fisco

Gostemos de os pagar ou não, os impostos são necessários para que a sociedade funcione

É certo e sabido que na vida há duas constantes: pagar impostos e morrer.

No entanto, os tributos pagos ao erário público são sempre envoltos em alguma controvérsia, seja pela sua eficácia, justiça ou aplicabilidade prática.

Contudo, gostemos de os pagar ou não, é consenso da maioria que é algo necessário para que a sociedade funcione: seja para manter o bom funcionamento do Serviço Nacional de Saúde, da Segurança Social e demais serviços públicos, institutos e entidades conexas.

Agora, face à conjuntura atual, e perante um cenário de consecutivos aumentos da carga fiscal, seja pelo lado dos impostos sobre rendimento (p.e. IRS), seja pelo lado dos impostos sobre o consumo (p.e. IVA, impostos sobre o combustível – ISP), chegamos a um nível de carga fiscal de cerca de 35,4% (segundo dados da UTAO para 2020).

Esta percentagem deve, porém, ser analisada com uma “pitada de sal”, visto que a conta é feita comparando o nível de impostos face ao Produto Interno Bruto (o rendimento do país, numa ótica simples), ou seja, não espelha na prática a carga fiscal real sobre o rendimento da esmagadora maioria das famílias portuguesas, visto que considera todo o “bolo” da riqueza produzida no país, “engolindo” as assimetrias que existem na distribuição de rendimentos.

Alguns entendidos apontam que o IRS é um instrumento de harmonização e que serve para dirimir as assimetrias na distribuição dos rendimentos.

Na minha modesta opinião, nos últimos 20 anos (pelos menos) os escalões de rendimentos têm sido moldados pela classe política para, por um lado, manipular a opinião pública (com subidas, descidas e demais malabarismos de taxas e escalões) e, por outro, ajudar no financiamento do Estado, numa ótica de financiamento de curto-prazo para manter as contas “à tona da água”.

Mas será que aumentar consecutivamente os impostos é a melhor via para desenvolver a economia de um país?

Certo é que trará um aumento da receita pontual para os cofres do Estado, mas, a médio/longo-prazo, provoca destruição de riqueza, enfraquecimento do tecido empresarial e um aumento da economia paralela (vulgo: fuga ao fisco), já que muitos negócios trabalham com um EBITDA (resultados antes de juros, impostos, depreciações e amortizações) muito ténue e frágil a aumentos da carga fiscal.

Este é o cenário mais comum no tecido empresarial português.

Mais, as multinacionais com grande potencial do ponto de vista da receita fiscal estão, normalmente, isentas destes aumentos, visto tirarem partido da sua dimensão, e estabelecerem as suas sedes fiscais em países com regimes fiscais que lhes sejam mais favoráveis, evitando assim contribuir para a receita de impostos de Portugal.

Agora, haverá uma conotação entre o aumento da carga fiscal e o aumento da economia paralela?

Eu estou convicto que sim. Aliás, o economista Arthur Laffer partilha da mesma opinião. De facto, desenhou a famosa “Curva de Laffer” num guardanapo, numa tentativa de ilustrar ao então presidente dos EUA Gerald Ford (em 1974) que aumentar os impostos não seria a via mais indicada para aumentar a receita fiscal ou prosseguir o desiderato de desenvolver economicamente o país.

Nesta curva, Laffer espelhou a relação entre as taxas de imposto e o montante de receita fiscal arrecadada pelos governos, percebendo-se a existência de um ponto ótimo.

A partir desse ponto, incrementos das taxas de imposto levam à redução da receita fiscal em face da adaptação do comportamento dos agentes económicos, nomeadamente através da concentração do seu esforço produtivo em torno de atividades com carga fiscal menos intensa e da adoção de práticas associadas à ideia da economia “paralela”.

Assim, num contexto em que a economia portuguesa se encontra gravemente fragilizada pelos efeitos paralisadores da pandemia, espero honestamente que as medidas tomadas em torno da receita fiscal privilegiem o crescimento económico, de modo a que paulatinamente logremos alcançar, num futuro próximo, um nível de desenvolvimento económico análogo aos nossos pares do Norte da nossa estimada União Europeia.

Autor: Luis da Ponte é filho de mãe algarvia e pai nortenho, foi no Norte que nasceu, mas foi no Sul que encontrou casa.
É apaixonado por viajar, por mecânica automóvel, e curioso pelos assuntos da Natureza.
É licenciado em Gestão de Empresas e Pós-Graduado em Finanças Empresariais pela Universidade do Algarve.
É também licenciado em Administração Pública pela Universidade do Minho.
Foi Vice-Presidente do Departamento Financeiro da AIESEC da FEUALG e também Vice-Presidente do Centro de Estudos em Administração Pública da Universidade do Minho.
É membro efetivo da Ordem dos Economistas e, profissionalmente, é sócio-gerente da TSE Industrial Lda e proprietário da agência VDP Seguros.

Nota: artigo publicado ao abrigo do protocolo entre o Sul Informação e a Delegação do Algarve da Ordem dos Economistas

 

 

 
 



Comentários

pub