Astrofísicos fazem as primeiras observações de filamentos da “teia cósmica”

Recorrendo ao espectrógrafo MUSE, equipa de investigadores, incluindo do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço, conseguiu observar filamentos cósmicos, numa altura em que o Universo tinha menos de 15% da idade atual

Uma equipa de astrofísicos, que inclui Jarle Brinchmann, do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), recorreu ao espectrógrafo MUSE, instalado no telescópio VLT, do Observatório Europeu do Sul (ESO), para fazer o mais profundo levantamento espectroscópico até hoje.

Além de estruturas filamentares de gás à escala cósmica, estas observações do universo jovem, um a dois mil milhões de anos após o Big Bang, revelaram ainda a existência de inúmeras galáxias anãs, que até aqui nem se suspeitava que existissem.

Estes resultados foram publicados esta sexta-feira na revista científica Astronomy & Astrophysics.

Jarle Brinchmann (IA, Universidade do Porto & Observatório de Leiden), comenta: “esta é a mais profunda observação alguma vez feita ao Universo, que nos revelou galáxias inteiras mais ténues do que a estrela Rigel, uma das 10 mais brilhantes no nosso céu. O conjunto destas galáxias ilumina o Universo primordial, como pequenos candeeiros públicos no meio de um nevoeiro de gás hidrogénio”.

A larga escala, o Universo é formado por uma estrutura filamentar de gás, uma autêntica “teia cósmica” ao longo da qual as galáxias se formam. Os modelos teóricos preveem que o gás que compõe os filamentos, quando exposto a radiação, adquire uma certa incandescência, mas tão ténue, que estes nunca tinham sido observados diretamente.

Só recentemente se tornou tecnicamente possível observar as zonas mais densas da teia, designadas “nós”, onde se encontram quasares, astros cuja intensa radiação consegue aumentar o brilho da teia nessa região. Mas os nós não são uma amostra representativa da parte normal dos filamentos, onde ocorre cerca de 60% de toda a formação de galáxias.

Para resolver este problema, a equipa, liderada por Roland Bacon (CNRS/CRAL), apontou o VLT, durante mais de 140 horas, para a região do céu conhecida como Campo Ultra Profundo do Hubble, até agora uma das imagens mais profunda do cosmos até agora obtida.

Ao tirar partido da ótica adaptativa e da mais avançada capacidade espectroscópica do MUSE, foi possível à equipa fazer um mapa de vários pedaços de filamentos no Universo, quando este tinha apenas 1 a 2 mil milhões de anos depois do Big Bang.

As imagens também revelaram que 40% das galáxias agora descobertas são tão ténues, que não eram visíveis na imagem obtida pelo telescópio espacial Hubble.

Mas a maior surpresa ocorreu quando as simulações efetuadas pela equipa revelaram que uma fração significativa da luz difusa observada – talvez até a maior parte dela – tem origem num enorme “mar” de galáxias anãs de luminosidade ultra-fraca.

Estas galáxias são tão pouco brilhantes que não seria possível detetá-las individualmente com os meios atuais, mas a sua existência tem consequências importantes para os modelos de formação de galáxias, consequências que só agora os cientistas vão começar a explorar.

Brinchmann confessa-se surpreso com esta descoberta: “Quando fazes algo que nunca ninguém fez, corres o risco de o Universo te revelar os seus segredos. É incrível pensar que estamos a ver o brilho, na alvorada do próprio Universo, de galáxias tão pequenas que seria difícil vê-las mesmo que estivessem nas proximidades da nossa galáxia, a Via Láctea”.

 

 



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