Centro Apoio a Idosos de Portimão vacinou membros dos órgãos sociais contra a Covid-19

Algumas das pessoas vacinadas não contactam diretamente com os utentes, condição para ter direito a vacina contra a Covid-19 nesta primeira fase

Centro Social de Apoio a Idosos de Portimão

A vacina contra a Covid-19 foi administrada a membros dos órgãos sociais do Centro Social de Apoio a Idosos de Portimão, alguns dos quais não têm qualquer contacto com os utentes e não se enquadram, ao que tudo indica, nos critérios desta 1ª fase da vacinação.

A possibilidade de receber já a vacina foi oferecida aos  diferentes elementos da direção, aos membros da Assembleia de Sócios, aos elementos do Conselho Fiscal e a pessoal administrativo.

Alguns recusaram, mas houve quem aceitasse, mesmo não lidando diretamente com os idosos, alegando que o fizeram para não «constituir foco de risco para a saúde dos utentes».

Uma das pessoas vacinadas foi, apurou o Sul Informação, Ana Fazenda, secretária da Assembleia Geral do Centro de Apoio a Idosos, que também já exerceu funções como vereadora do PS na Câmara de Portimão.

Ana Fazenda admitiu ao nosso jornal ter sido vacinada, alegando que o fez por considerar ser «um dever profilático para com uma instituição que tão bem tem gerido a vaga de Covid-19» e defendendo que este foi «um procedimento absolutamente correto, próprio de quem tem a preocupação de evitar a todo o custo que os idosos sejam objeto de contactos que sugiram a propagação de surtos».

Esta interpretação choca com o que a Administração Regional de Saúde do Algarve disse ao Sul Informação. Segundo esta entidade, «no âmbito do plano de vacinação contra a Covid-19, a vacina nesta fase é para quem presta cuidados de saúde e que esteja em contacto direto com os utentes das ERPI».

Já o preenchimento da lista dos profissionais e utentes com critérios para a vacinação «é da responsabilidade de cada instituição».

«À ARS e aos Agrupamentos de Centros de Saúde, compete a administração das vacinas às pessoas identificadas por cada instituição».

Mas como surgiu, então, a possibilidade de Ana Fazenda ser vacinada, tendo em conta esta regra que limita a vacinação anti Covid-19 a pessoas e profissionais de risco, que estão na primeira linha da luta contra a pandemia?

«Fui contactada por uma técnica de saúde da instituição, numa lógica de preocupação institucional face à minha proximidade com os utentes, questionando-me se, em consciência e não sendo uma dirigente de proximidade, em termos formais, fazia o entendimento de que devia ser incorporada na lista de vacinação», contou.

Segundo Ana Fazenda – cujo ex-marido, José Figueiredo Santos, é o presidente da direção do Centro Social, também ele vacinado – a sua relação com esta IPSS «vai muito para além das funções formais», pois teve «uma participação ativa na intermediação de recursos para a instituição, no âmbito desta pandemia, como seja, obtenção de máscaras e viseiras, entre outras», não dando o seu trabalho por acabado, «uma vez que a pandemia se mantém e se agravou».

Somando estes fatores, a secretária da Assembleia Geral do Centro de Apoio a Idosos de Portimão fez «o entendimento de que deveria ser vacinada», de modo a não «constituir foco de risco para a saúde dos utentes, quer no contacto direto, quer no contacto indireto com funcionários, diretores e utentes da mesma».

«Assim, estou de plena consciência nesta matéria, face a uma polémica que tem produzido ruído absolutamente injustificado», concluiu Ana Fazenda, que fala de «uma exploração tendenciosa» deste assunto.

 

Vacina contra a Covid-19 – Foto: Pedro Lemos | Sul Informação

 

Quem também foi contactado «no sentido de ser vacinado contra a Covid-19, já há algum tempo» foi Carlos Bicheiro, presidente do Conselho Fiscal da instituição e coordenador do Gabinete de Estudos do PSD de Portimão. Mas, neste caso, a resposta foi bem diferente.

«Eu não aceitei, mas penso que terão sido vacinados alguns elementos dos corpos sociais», disse. Quanto aos outros dois membros do Conselho Fiscal, diz não ter a certeza se terão sido ou não vacinados, embora tenha «a ideia que não».

Quanto a quem foi, efetivamente, vacinado, Carlos Bicheiro, não consegue dar certezas. «Não acompanhei o processo, nem sei como é que ele se processou».

Já a CM TV apresenta números e diz que foram vacinados quatro elementos da direção, três da Assembleia de Sócios e um membro do Conselho Fiscal, além de pessoal administrativo em número não especificado.

Isto, além das pessoas que foram legitimamente vacinadas, ou seja, os cerca de 260 idosos assistidos pelo Centro Social de Apoio a Idosos de Portimão, instituição que gere três lares, e os seus cerca de 150 funcionários.

Apesar de não especificar quem foi vacinado, o presidente da direção do Centro assegurou ao Correio da Manhã e ao Observador que todas as pessoas vacinadas contactam com idosos e estavam em condições de ser vacinados.

«No âmbito do enfrentamento responsável dos surtos nos lares, no universo dos 260 idosos assistidos, aproximadamente, sem casos de Covid-19, nós cumprimos o que está estabelecido no Plano de Vacinação e nas orientações da CNIS, ao abrigo dos quais foram vacinados todos os idosos, profissionais, parte dos corpos gerentes essenciais ao funcionamento presencial na instituição (também eles de risco), e que têm contacto direto e ativo com os idosos, com as instalações que os mesmos frequentam e utilizam», justificou José Figueiredo Santos, que também preside à bancada do PS na Assembleia Municipal de Portimão.

No entanto, este critério não foi aplicado aos funcionários da “Catraia”, o Centro de Acolhimento de crianças da instituição, apesar da sua proximidade física com o Lar da Raminha e, segundo garantiu ao Sul Informação uma fonte ligada ao processo, que não quer ser identificada, apesar de os profissionais desta valência para crianças usarem espaços em comum com os da vizinha estrutura residencial para idosos.

Isto aconteceu, segundo o presidente da direção, «por determinação das Autoridades de Saúde», que excluem os funcionários «que se encontravam de baixa e os funcionários ligados a valência de crianças (Catraia)», que deverão «ser objeto de vacinação oportuna».

 

Centro de Apoio a Idosos de Portimão

 

As justificações dadas por José Figueiredo Santos não permitem aferir se as regras foram cumpridas, por não se saber, concretamente, quais os indivíduos que foram vacinados.

Mas não deixa de ser estranho que não tenham sido vacinados funcionários que trabalham com as crianças, paredes meias com um dos lares de idosos, embora o tenham sido funcionários administrativos que não lidam diretamente com os utentes de risco – que estão fora dos critérios, como explicou a ARS do Algarve.

Foi, de resto, a ocorrência de situações semelhantes em diferentes pontos do país que levou a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde a decidir passar a controlar o processo de vacinação contra a Covid-19 através de auditorias. Além deste alegado caso em Portimão, foi notícia a vacinação de elementos não prioritários no INEM, do presidente da Câmara de Reguengos de Monsaraz e na delegação regional da Segurança Social de Setúbal.

«Este é um plano que é uma gigantesca operação e começou há um mês, não começou há um ano. Suponho que são casos esporádicos, mas são perturbadores, por isso, começa este processo de auditoria», resumiu Francisco Ramos, coordenador da taskforce para o plano de vacinação, referindo-se ao «desvio de critérios» que terá levado à administração de vacinas a pessoas não incluídas nos grupos prioritários para esta primeira fase.

É precisamente para as auditorias que a ARS remete, como forma de tornar o processo de vacinação mais transparente, também no Algarve. O próprio secretário de Estado Jorge Botelho, que é o coordenador das medidas de combate à pandemia, no Algarve, disse ao Público que «a lei é clara quanto aos critérios de prioridade» na aplicação da vacina. Por isso, qualquer desvio a essas orientações «tem de ser esclarecido — eventualmente, abrir um inquérito».

 

 

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