Trabalhar em troca de alojamento: será esta a nova alternativa para os alunos da UAlg?

Reportagem sobre os estudantes que, sem dinheiro para pagar um quarto em Faro, são voluntários a troco de alojamento

Foto: Lara Rivera | Sul Informação

É de manhã bem cedo e o aroma a café acabado de fazer começa a espalhar-se pelos corredores do hostel Ria Terrace, situado no centro da cidade de Faro. Keven Prado prepara-se para começar o dia. Procura um canto sossegado e sem distrações para participar na sua aula online.

«Às vezes, é difícil morar com 9 pessoas na mesma casa, só temos uma casa de banho, só uma sala», relata, enquanto bebe o seu café.

Do outro lado da casa, entre cumprimentos de bom dia, máscara e corridas para o terminal rodoviário, já não é estranho ter um pouco de adrenalina no dia-a-dia de R.S., que frequenta as suas aulas presenciais todas as manhãs no Campus de Gambelas da Universidade do Algarve (UAlg).

Estes são os casos de dois alunos da UAlg, que, neste momento, se apresentam como voluntários em troca de alojamento no Hostel Ria Terrace, na Rua Conselheiro Bivar, em Faro.

Esta forma de voluntariado consiste em dedicar uma determinada carga horária semanal (entre 16 a 25 horas), recebendo em troca a possibilidade de se alojar no hostel, com uma cama disponível em quarto partilhado, juntamente com o resto da equipa.

«Muita gente se surpreende quando digo que moro num hostel»,comenta Keven ao enrolar o cigarro. «O meu rendimento não dá para pagar um quarto, no momento essa é (talvez) a minha única e melhor opção».

 

Keven Prado – Foto: Lara Rivera | Sul Informação

Keven Prado, de 20 anos, está atualmente a frequentar o 2.º ano de Psicologia na Universidade do Algarve. Chegou a Portugal pela primeira vez em Agosto de 2019. A partir daí, e por recomendação de outros amigos e alunos, encontrou uma nova alternativa para “minorar” as suas despesas através do voluntariado.

«Quando saí do Brasil, cheguei à Europa com apenas 600 euros na carteira. Tive que procurar um trabalho urgente, porque, com aquele dinheiro, só dava para alugar um quarto por um mês e o resto tinha que distribuir entre alimentação, despesas gerais e transporte para a Universidade».

«No primeiro hostel onde fiquei, encontrei uma amiga que viaja e conseguiu poupar grande parte do seu dinheiro graças ao voluntariado, e eu nem sabia que isso era possível. Depois descobri que muitos outros alunos apostam nesta atividade».

Trata-se de uma opção particularmente popular para aqueles que desejam passar vários anos de suas vidas viajando. Existem várias plataformas online, como Worldpackers ou WorkAway, onde é possível criar uma conta e candidatar-se a voluntariado em quase qualquer parte do mundo. Nessas plataformas, pode encontrar-se anúncios onde muitos hostels, hotéis, campos agrícolas ou de permacultura, e até ONGs, procuram pessoas que querem dedicar horas de trabalho em troca de um lugar para dormir e ainda receber uma ou mais refeições por dia.

Pode ser uma solução eficaz e útil para quem planeia viajar por longos períodos, quando é essencial gastar o mínimo de dinheiro possível. É também funcional para aquelas pessoas que, por diferentes motivos e situações de vida, precisam mesmo de um local seguro para dormir e optam por tomar esta opção como “tábua de salvação”, como descreve Rui Silva.

«No começo não foi fácil, a minha mãe estava muito preocupada com o que poderia acontecer, as pessoas que eu poderia encontrar e essa pandemia dá ainda mais motivos para desconfiar», diz. Mas, «para ser sincero, nunca senti medo», acrescenta. «É a única opção viável para mim neste momento».

 

Foto: Lara Rivera | Sul Informação

R.S., natural de Coimbra, é estudante de Ciências Agrárias na Universidade do Algarve. Por motivos pessoais, deixou a sua cidade e casa para continuar os estudos, mas desta vez na cidade de Faro.

Diante da dificuldade de manter um emprego e estudar ao mesmo tempo, recebe uma bolsa do Estado para cobrir as suas necessidades básicas, como alimentação e hospedagem. Também recebe ajuda de sua mãe, que, com muito esforço e sacrifício, consegue mandar para o filho algum dinheiro para continuar a pagar os estudos da universidade.

Esta situação afeta R.S. de uma forma pessoal: «não quero que isso se prolongue a longo prazo, quero muito trabalhar». «Estou apenas a aguentar-me», acrescenta, dizendo que «entre as horas de voluntariado e as aulas, mal consigo acomodar o meu tempo para estudar».

O desemprego, a escassez de novos empregos, a incerteza e a impossibilidade de fazer planos para o futuro, são alguns dos vestígios pós-pandémicos que nos deixa este 2020.

Keven diz que uma das suas fontes de rendimento foi dar aulas particulares de Inglês como professor independente. «Voltar ao meu país para passar a quarentena foi a pior decisão da minha vida; Perdi grande parte dos meus alunos com a pandemia, agora só tenho um cliente e o dinheiro que ganho só dá para o que como durante a semana».

«Felizmente, tive a sorte de encontrar algumas pessoas maravilhosas que também são voluntárias na Ria. Se a minha realidade mudasse agora, eu ficaria apenas por causa deles e da convivência. Nós nos ajudamos, pois a maioria passa pela mesma situação».

Tanto R.S. como Keven concordam que, para ambos, a experiência do voluntariado é enriquecedora de várias formas. Para além do dinheiro que podem poupar e de ter um sítio seguro para dormir, «a oportunidade de criar novos laços e ligações com outras pessoas de diferentes realidades é inestimável», afirma Rui. «Formamos laços fortes, somos agora uma família».

 

Fotos: Lara Rivera | Sul Informação

 

Nota: Lara Rivera é aluna do 2º ano do curso de Fotografia Profissional da ETIC_Algarve, Escola de Tecnologias, Inovação e Criação do Algarve

 

 

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