Renúncia recíproca à condição de herdeiro legitimário do outro cônjuge

Não deixe que as questões sucessórias sejam uma limitação a um eventual casamento

O casamento válido (aquele que não é anulável) é, na legislação portuguesa, um contrato que vincula duas pessoas e que se extingue pelo divórcio ou pela morte de um dos cônjuges. Com o falecimento, uma questão central coloca-se sempre: qual a herança e, caso esta exista, quem são os herdeiros?

Até agosto de 2018, após ser celebrado o casamento, os cônjuges adquiriam sem possibilidade de afastamento, a condição de herdeiros legitimários um do outro. Assim sendo, quando um dos cônjuges falecesse, o outro, concorrendo com os descendentes, com os ascendentes ou sozinho, era sempre chamado à sucessão.

Ora, acontecia que muitos casamentos deixavam de se realizar porque um, ou os dois, dos membros do casal entendia que o património próprio de cada um não devia ser herdado pelo companheiro.

Esta situação acentuava-se quando os casais tinham uma família, anteriormente constituída, e não queriam a transmissão dos seus bens, ou parte deles, para quem em nada tinha contribuído para a aquisição desse património.

Por forma a facilitar a possibilidade de duas pessoas poderem casar sem constrangimentos sucessórios, a lei viria a ser alterada a partir de 1 de setembro de 2018, instituindo a possibilidade de os cônjuges renunciarem à condição de herdeiro legitimário do outro, através de convenção antenupcial.

Esta possibilidade só é admitida caso o regime de bens, convencional ou imperativo, seja o da separação de bens. Ainda assim, a renúncia apenas afeta a posição sucessória do cônjuge, não prejudicando, designadamente, o direito a alimentos do cônjuge sobrevivo, por parte dos herdeiros ou legatários a quem tenham sido transmitidos os bens, nem a prestações sociais.

Outras garantias do cônjuge sobrevivo que não foram afetadas são:

– A possibilidade de um cônjuge fazer testamento a favor do outro, isto é, a inoficiosidade das liberalidades a favor do cônjuge sobrevivo que tenha renunciado à herança;

– Condicionar a renúncia à sobrevivência de sucessíveis de qualquer classe, bem como de outras pessoas.

Um dos aspetos mais importantes é relativamente à casa de morada de família, onde os direitos estão garantidos nas seguintes condições:
se a casa de morada de família for propriedade do falecido, o cônjuge sobrevivo pode permanecer na casa por um prazo de cinco anos, como titular de um direito real de habitação e de um direito de uso do recheio, caducando caso o cônjuge sobrevivo não habite a casa por mais de um ano, por razões que lhe sejam imputáveis.

Além disso, o cônjuge sobrevivo não tem direito a habitação se tiver casa própria no concelho da casa de morada de família. Se se tratar de Lisboa ou Porto, perde esse direito caso tenha casa própria nos concelhos limítrofes.

No final do prazo, ou seja, no final dos cinco anos em que beneficiou do direito de habitação, o cônjuge sobrevivo tem o direito de permanecer no imóvel apenas na qualidade de arrendatário, nas condições gerais de mercado.

No entanto, caso o cônjuge sobrevivo tenha completado 65 anos de idade à data da abertura da sucessão, o direito de habitação é vitalício.

Por isso, já sabe: não deixe que as questões sucessórias sejam uma limitação a um eventual casamento. Aconselhe-se com um solicitador.

 

Autora: Natércia Reigada é solicitadora e agente de execução

 

Nota: Artigo publicado ao abrigo da parceria entre o Sul Informação e a Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução

 

 

 

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