Regime do Maior Acompanhado – O que é?

Entrada em vigor do novo regime resultou numa mudança radical de paradigma

Perante a lei, de um modo geral, qualquer cidadão ao atingir a maioridade, ou seja, ao completar 18 anos de idade, consegue exercer pessoal e livremente os seus direitos, cumprir as suas obrigações e cuidar do seu património, sem necessitar de ajuda de outro.

No entanto, existem exceções, isto é, pessoas que, independentemente da idade, não são capazes de exercer esses direitos, nem de cumprir as suas obrigações.

Em 1966, com a aprovação do Código Civil, a legislação portuguesa estabeleceu os regimes da interdição e da inabilitação, que, quando decretados, tinham caráter definitivo.

Estes tinham como fim assegurar a proteção dos cidadãos que se mostrassem incapazes de cuidar das suas vidas, isto é, de cuidar de si próprios e do seu património. As causas dessa incapacidade, expressamente previstas na lei, podiam ser anomalia psíquica, surdez-mudez, cegueira e todos aqueles que pela sua habitual prodigalidade, pelo uso de bebidas alcoólicas ou estupefacientes, se mostrassem incapazes de reger o seu património.

Aos cidadãos sujeitos a estes regimes, assim que decretada a interdição, era aplicado o regime legal dos menores.

Deste modo, era-lhes retirada a possibilidade de decidir qualquer aspeto da sua vida, até mesmo o exercício de direitos de natureza pessoal, como casar, ter filhos, votar, perfilhar ou testar.

Com a entrada em vigor da lei que regula o regime do maior acompanhado, as figuras da interdição e da inabilitação foram eliminadas do nosso sistema jurídico, o que resultou numa mudança radical de paradigma.

É, assim, aprovado o regime do maior acompanhado, que se destina a todas as pessoas que não consigam, de forma autónoma e consciente, exercer livremente os seus direitos, cumprir as suas obrigações e cuidar do seu património.

Este regime tem como finalidade preservar a autonomia da pessoa e até aumentá-la, assegurando o seu bem-estar e a sua recuperação, bem como o pleno exercício de todos os seus direitos e o cumprimento dos seus deveres.

O regime do maior acompanhado pode ser requerido pelo próprio, pelo cônjuge, pelo unido de facto ou por qualquer parente sucessível, desde que tenha sido concedida autorização para o efeito. Na ausência de autorização, só pode ser requerido pelo Ministério Público.

Neste novo regime, o acompanhamento pode não ser definitivo, ou seja, pode cessar ou ser modificado, mediante decisão judicial, que reconheça a necessidade de alterar/eliminar as causas que o justificaram.

Adicionalmente, o juiz discrimina, na sentença, os atos que o acompanhado pode, ou não, realizar livremente. Isto é, o acompanhado pode e deve continuar a praticar, de forma autónoma, todos os atos que o juiz considere que podem ser praticados por ele.

Esta mudança de paradigma pretende evitar o estigma associado aos processos de interdição e inabilitação e garantir que as pessoas em situação de capacidade reduzida vejam, efetivamente, os seus direitos assegurados.

 

Autora: Natércia Reigada é solicitadora e agente de execução

Nota: Artigo publicado ao abrigo da parceria entre o Sul Informação e a Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução

 



Comentários

pub