A água – ou a falta dela

Se não chover abundantemente em meados de Setembro e em Outubro, chegaremos ao fim do ano em situação aflitiva

Barragem da Bravura quase seca, no fim de semana passado – foto: © João Mariano | The Understands – Aljezur BTT Team

Vejo pouca gente preocupada com o problema da água no sul do País, nomeadamente no Algarve.

As albufeiras das barragens estão a atingir os seus limites mínimos e, sem ficarem mesmo secas, a última água abaixo dos 20% começa a ser considerada, além de escassa, imprópria para consumo.

E, a não ser que se esteja à espera de recorrer à medida preconizada por uma anterior Ministra do Ambiente, da Agricultura, etc, enfim de quase tudo, que é rezar a Nossa Senhora para que chova, nenhuma Autoridade ainda veio tratar do assunto com a autoridade que se exige nas circunstâncias.

Se não chover abundantemente em meados de Setembro e em Outubro, chegaremos ao fim do ano em situação aflitiva, embora o atual e eficiente Ministro do Ambiente costume dizer que está tudo controlado. Estará? Então e o pobre cidadão não pode saber alguma coisa sobre esse controle?

Não vemos nenhuma campanha pública para motivar as pessoas para uma economia de água, não vemos qualquer campanha de educação ambiental (disseram-me um dia que parecia mal a um país da União Europeia estar a promover campanhas de educação), podemos estar mesmo na tal UE, mas o comportamento de uma boa parte da população é terceiro-mundista, porque os Poderes Públicos nunca fizeram nem fazem nada para informar e formar as pessoas, nada!

Eu não sei, mas gostava de saber, quantos campos de golfe fazem reciclagem das águas de rega para manter relvados à escocesa numa região de clima mediterrânico.

Não replantamos as serras com a mata de conservação que qualquer país da UE sabe que deve fazer, pois é onde se formam as águas que correm nas linhas de drenagem para jusante; pelo contrário, o professor Nuno Loureiro publicou excelentes fotografias da continuidade da expansão do eucaliptal nas encostas de Monchique.

Temos culturas tradicionais exigentes em água, que deram fama ao Algarve, como são os citrinos; como se isso não bastasse, a própria Direção Regional de Agricultura, de velha e honrosa memória, que devia ter mantido a sua idónea experimentação agrícola para culturas adaptadas às condições de progressiva aridez, anda a fomentar os pomares de abacate… que faziam cá muita falta.

O arquiteto paisagista Gonçalo Gomes fez umas contas e chegou à conclusão de que o consumo de água para manter os abacateiros é uma exorbitância – é mesmo aquilo de que o Algarve precisa!

Ninguém quer acreditar nas alterações climáticas, essa é que é a verdade – quando as latitudes mediterrânicas serão das mais afligidas pelo aumento de fenómenos extremos, com secas prolongadas e precipitação eventual e torrencial.

Por isso é que há quem exija mais uma barragem – à espera que a chuva que não enche as albufeiras existentes vá cair especialmente numa albufeira nova acabadinha de construir. Se calhar ensaiando uma dança da chuva convocada para o efeito…

Os países do Mediterrâneo que eu conheço têm todos várias estações de dessalinização da água do mar, que, com os novos materiais e podendo ser auto-suficientes em energia (eólica e solar), fornecem água potável a um preço compatível com o uso urbano – por cá nada.

Não precisamos.

É esta falta de planeamento e de previsão que devia afligir os portugueses e traduzir-se nas eleições.

 

Nota: Fernando Santos Pessoa é arquiteto paisagista

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