Hoteleiros exigem campanha para atrair portugueses, mas só a terão no fim de Junho

«É claro que ninguém está satisfeito, porque o momento atual não o permite, mas não reconhecer este esforço enorme e a capacidade de sermos pioneiros nestas ligações não é justo para as entidades públicas ligadas ao turismo»

Foto: Fabiana Saboya | Sul Informação

Os hoteleiros algarvios querem ver lançada uma campanha de promoção turística do Algarve no mercado interno, para marcar posição na luta pela captação de turistas nacionais, que envolverá as diferentes regiões do país e se adivinha renhida.

Tanto diretores de hotéis do Algarve, como José Carlos Rolo, presidente da Câmara de Albufeira, salientaram ao Sul Informação a importância e a urgência no lançamento desta campanha, numa altura em que outras regiões, por exemplo a Madeira e o Alentejo, já estão a promover-se fortemente, a nível interno.

João Fernandes, presidente da Região de Turismo do Algarve, garantiu ao nosso jornal que a campanha já foi pensada e está a ser elaborada, apontando para que o seu lançamento aconteça «até final do mês».

No entanto, para os hoteleiros, nomeadamente os do Algarve Central e do Sotavento, a campanha é para ontem.

«A nossa ideia é que, da mesma forma que a Madeira colocou uma campanha no ar para ser visitada e que outras regiões do país também estão a fazer isso, o Algarve já devia ter feito o mesmo», defende João Soares, delegado no Algarve da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP), bem como diretor e proprietário do Hotel D. José, em Quarteira.

«O Algarve necessita de uma campanha muito forte para o mercado interno. Não basta acharmos que somos os melhores e que temos praias fantásticas. Temos de avançar para spots televisivos e campanhas para incentivar o mercado, porque ainda temos muitas disponibilidades para Julho e Agosto», acrescentou o hoteleiro.

Apesar de acreditar que «esteja a ser preparada alguma coisa», o empresário considera que a campanha «já devia estar no ar», tendo em conta que «mercado interno é muito importante».

«Temos de falar nos hotéis, dizer que eles estão preparados, que podem receber os clientes com todas as condições e têm os selos de segurança Clean & Safe», salienta João Soares.

 

João Soares – Foto: Nuno Costa | Sul Informação

 

César Raposo, diretor e co-proprietário do Hotel Alcazar, em Monte Gordo, partilha desta opinião.

«Uma campanha dirigida ao mercado de proximidade, nesta altura, seria muito importante e exige-se. Tendo em conta que o Algarve é a principal região turística do país, devia ser pioneira numa campanha desta natureza», disse ao Sul Informação o hoteleiro do Sotavento.

«Eu acredito que essa campanha esteja na forja, mas devíamos ter sido os primeiros a fazê-la. Quanto mais cedo surgir, mais rápido irá despertar o interesse no mercado nacional para as férias de Verão», reforça César Raposo.

 



 

João Fernandes garante que a RTA não está «de forma nenhuma, a descurar aqueles que são os nossos mercados de maior oportunidade», o mercado interno, mas também a vizinha Espanha.

«Nós, cientes da importância do mercado interno, temos uma campanha a ser ultimada e que estará disponível no final deste mês», afirma.

Quanto ao facto de a campanha não estar já cá fora, o presidente da RTA diz que «a  contratação pública tem as suas prerrogativas e, portanto, tivemos a desenvolver todo essa tramitação. A produção audiovisual, nos tempos que correm, também tem as suas limitações e nós temos de respeitar regras».

«Por outro lado, não temos acesso aos mesmos meios de financiamento que outras regiões têm, por estarmos em phasing out. No entanto, isso não impediu que nós tenhamos avançado com o processo, que este esteja em fase de produção e que esteja disponível no final do mês», acrescenta.

«Temos consciência – e temo-lo dito desde o início e atuado em conformidade – que os mercados de proximidade são aqueles que mais respondem em tempos de crise. Por isso mesmo, fizemos ações de capacitação, há cerca de dois meses, que envolveram perto de 600 agentes de viagem portugueses e espanhóis», assegura João Fernandes ao Sul Informação.

A vizinha Espanha, um mercado com muitos milhões de pessoas mesmo aqui ao lado, não foi esquecida. Com a perspetiva da reabertura das fronteiras a 1 de Julho,  a RTA tem «vindo a comunicar através de notas de imprensa, que têm tido muito acolhimento no país vizinho, e entrevistas, em meios de comunicação social da Extremadura, da Andaluzia, da Galiza, da Catalunha e nacionais, em Espanha».

 

João Fernandes – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

 

Mas qual é, afinal, a importância do mercado de proximidade? No Sotavento Algarvio, é, como sempre, muito elevada, já que vive em grande medida do turista nacional, mas também do da vizinha Espanha.

«O Algarve é muito popular junto do mercado nacional. Aqui no Sotavento, a esmagadora maioria da nossa ocupação no Verão é com turistas portugueses e espanhóis», explica César Raposo, do Alcazar.

«De uma maneira geral – admito que haja exceções -, Julho, Agosto e Setembro, e até parte de Junho, é maioritariamente ocupado por turistas nacionais. No final do Verão e em Outubro, há já muitos clientes estrangeiros, mas a época alta é com os portugueses e espanhóis», assegura.

O hoteleiro de Monte Gordo estima que «acima de 85% da ocupação é garantida por portugueses e espanhóis, o chamado mercado de proximidade».

Num cenário de pandemia, com fortes restrições às viagens aéreas e o medo da Covid-19 a desincentivar a deslocações para outros países,  o mercado interno e de proximidade também ganhou maior importância em zonas turísticas tradicionalmente mais procuradas por estrangeiros, nomeadamente o Barlavento Algarvio.

 



 

«É claro que, como não há aviões, o mercado interno é importante. Estamos todos a ir ao mesmo bolo: está o Algarve, está Lisboa, está o Porto, o interior, o Minho… Portanto, é útil e importante que haja uma campanha do Algarve para que as pessoas percam um pouco o medo de viajar», disse ao Sul Informação Pedro Lopes, administrador do Grupo Pestana para o Algarve.

«Nos feriados, por exemplo, tivemos muitos portugueses. As pessoas estiveram bem, sentiram-se bem, foram às praias», lembra.

Desta forma, defende que «haver uma campanha agradável, para as pessoas se lembrarem do Algarve, era importante – até porque os outros também a farão». Ou já estão a fazer.

Pedro Lopes lembra a história de um gestor regional da Coca-cola nos Estados Unidos da América que, face à enorme popularidade e penetração da bebida entre a população, considerou que não seria necessário fazer publicidade. «Deixou de fazer publicidade nos jornais, na televisão e nas rádios e a verdade é que as vendas caíram», disse.

Desta forma, acredita, o Algarve não pode confiar apenas na sua posição de principal região turística e de destino de praia reconhecido internacionalmente.

«O deixar de aparecer não é bom. Se os outros aparecem, nós também temos de nos mostrar», remata Pedro Lopes.

 

Pedro Lopes – Foto: Hugo Rodrigues | Sul Informação

 

O Grupo Pestana, apesar de ter unidades espalhadas por todo o Algarve, tem a oferta muito concentrada em Alvor, no concelho de Portimão, e no concelho vizinho de Lagoa. Em ambos os casos, são zonas turísticas com forte apetência para atrair turistas estrangeiros, embora, «na Praia de Rocha e em Alvor, haja também portugueses».

De Albufeira, considerada por muitos a capital do turismo, chega a mensagem de que «é fundamental» avançar com uma campanha para o mercado interno, desta feita de um autarca.

«Mesmo que os turistas internos não sejam muitos, sempre foi um mercado muito importante para o Algarve. Este ano ainda mais, os turistas internos têm que ter um peso ainda maior na nossa região. É bom que haja uma campanha forte para atrair turistas, até para não perder a corrida perante as outras regiões», disse José Carlos rolo, presidente da Câmara albufeirense, em declarações ao Sul Informação.

«Eu sou otimista e acho que os meses de Julho e Agosto vão ter bastantes pessoas no Algarve, nomeadamente depois de abrirem as fronteiras, quer terrestres, quer aéreas. Penso que o Verão se vai depois prolongar nos meses de Setembro e Outubro. Ontem estava a falar com um hoteleiro e ele já dizia que queria transformar o mês de Outubro no mês de Agosto. É um sintoma de que as pessoas estão otimistas».

No entanto, este otimismo não é partilhado por todos.

«O turismo interno é importante, com certeza. Mas não nos irá criar muita massa crítica. Nós dependemos do inglês, do alemão, do holandês, do irlandês. Quer queiramos, quer não, é desses mercados que nós vivemos», adiantou ao nosso jornal João Guerreiro, administrador dos hotéis Rocamar e Belmonte, em Albufeira.

Segundo o gestor hoteleiro, neste momento, «as coisas estão totalmente paradas. Não há reservas, só cancelamentos. Não há perspetivas, não há nada, zero», desabafa.

«Enquanto não houver voos e não abrirem os mercados para vir para cá, estamos todos aflitos. Isto está um descalabro. Tenho cinco pessoas no hotel, três quartos ocupados. Eu digo-lhe honestamente: abri as minhas duas unidades hoteleiras e estou para ver se não as vou fechar outra vez», admite João Guerreiro.

«Não está fácil. Isto é um ano completamente perdido», conclui.

Também César Raposo e  João Soares dão conta de dificuldades nas vendas.

«As reservas estão muito lentas. O Hotel Alcazar só abriu na segunda-feira, dia 15, e a nossa ocupação para Julho está nos 25%, para Agosto na ordem dos 20%. Para Setembro, trabalhamos com grupos que ainda não cancelaram ou que já reservaram, e temos uma ocupação um bocado melhor, na ordem dos 45%», diz o hoteleiro do Sotavento.

«Neste momento, estão a cair algumas reservas para Julho e Agosto, mas o preço médio é francamente mais baixo e as reservas estão lentas. As ocupações que trazíamos eram já baixas e este adiar permanente dos mercados internacionais também está a dificultar as coisas», diz, por seu lado, o delegado da AHP no Algarve.

 

Praia dos Pescadores, em Albufeira, esta semana – Foto: Bárbara Caetano | Sul Informação

 

No que toca aos turistas estrangeiros, João Fernandes puxa dos galões e  lembra que «o Algarve foi o primeiro destino do Sul da Europa a abrir para a maioria das companhias aéreas», depois da suspensão motivada pela Covid-19.

O presidente da RTA salienta o esforço que está a ser feito «para retomar a capacidade aérea, que é o fator essencial para a nossa ligação aos mercados externos, e que tem dado resultados muito claros».

«Nós tivemos, a 28 de Maio, o primeiro voo da Edelweiss para o Sul da Europa. Tivemos a Luxair, na mesma condição, a voar do Luxemburgo a 31 de Maio», elenca.

Também a Transavia (Amesterdão, dia 9 de Junho), escolheu Faro como destino do primeiro voo para a Europa do Sul, na fase de desconfinamento.

Entretanto, esta semana foram retomadas outras linhas – Brussels Airlines, TUI Belgium e Volotea (Lyon), no dia 15, Wizzair (Luton) e Easyjet (Belfast) ontem, dia 16. No caso da Easyjet, foi «o primeiro voo desta companhia para um destino de praia, um voo piloto».

«A partir hoje [dia 17], temos a TUI Germany a voar de Dusseldorf e Frankfurt. Amanhã [dia 18], a Transavia também retoma os voos para Roterdão e Eindhoven. A partir de dia 21, temos a Ryanair com dez frequências semanais desde Dublin, Stanstead, Manchester, Porto e Bruxelas», acrescenta o presidente da RTA.

A lista não se fica por aqui e inclui voos da Swiss (Genebra, dia 18), Eurowings (Dusseldorf, Estugarda, Colónia e Hamburgo, dia 20), Lufthansa (até final de Junho).

Em Julho, regressam as operações da Air France (Paris), Jet2.com (todas as bases do Reino Unido) e British Airways.

 

Aeroporto de Faro – Foto: Gonçalo Dourado | Sul Informação

 

Ainda assim, alguns hoteleiros, começando pelo representante da AHP, sentem que é necessário fazer algo mais.

«Era importante para os empresários, hoteleiros e de todas as empresas algarvias do setor do turismo, sentirem que há, da parte da entidade regional de turismo, uma proatividade», diz João Soares.

«Nesta pandemia, todos nós somos convocados a dar o nosso melhor. E os organismos públicos têm muitas responsabilidades e não se podem demitir delas», acrescenta César Raposo.

João Fernandes, por seu lado, garante que a RTA e a tutela nunca pararam de trabalhar em prol do turismo da região.

«É claro que ninguém está satisfeito, porque o momento atual não o permite, mas não reconhecer este esforço enorme e a capacidade de sermos pioneiros nestas ligações não é justo para as entidades públicas ligadas ao turismo», afirma.

«Eu entendo a ansiedade de quem tem de gerir um negócio e quer que a procura seja muita. Isso é compreensível. Não estamos alheios a essa realidade, temos resultados concretos, não são apenas ideias ou campanhas», acrescenta.

Se, por um lado, o país e a região foram eficazes na prevenção e no controlo do Covid-19, «numa primeira fase», o Turismo do Algarve foi, por outro,  «pioneiro na criação quer da certificação, quer de manuais de boas práticas».

«Nós temos, ainda hoje, o único manual de boas práticas – que está traduzido também em inglês, para ser fator promocional junto de operadores e companhias aéreas -, para muitas áreas, nomeadamente o campismo e autocaravanismo, as rent-a-car, os golfes, as praias. Também temos o selo Clean & Safe para empreendimentos turísticos, agências de viagens e empresas de animação turística», realça.

«Estamos a ser pioneiros em muitas destas formas proativas de demonstrar segurança e de a implementar. Temos vindo a preparar-nos para estarmos prontos», garante João Fernandes.

O presidente da RTA lembra, ainda, as sessões de esclarecimento sobre os apoios do Estado e do Turismo de Portugal às empresas, bem como as ações de capacitação em diferentes áreas, incluindo na de saúde pública, promovidas em conjunto com diferentes entidades.

«Acho que, se alguma falha houve, foi a dificuldade de fazer tudo isto e comunicar o que fazemos ao mesmo tempo», remata.

 

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