PCP pergunta sobre alegado assédio moral e laboral aos músicos da Orquestra

Direção da Orquestra defende-se e garante que férias obrigatórias e lay-off têm o acordo da maioria dos músicos

Foto: Hugo Rodrigues|Sul Informação

O PCP questionou a ministra da Cultura sobre alegados abusos cometidos pela direção da Orquestra Clássica do Sul sobre os músicos que a compõem, que vão desde o assédio moral à obrigatoriedade de tirar férias em Maio, culminando num lay-off em Junho.

Contactada pelo Sul Informação, Maria Cabral, presidente da direção da OCS, confirma que houve uma queixa formal de assédio moral feita «por um grupo de músicos», mas salienta que esta surgiu «no âmbito de um processo de negociações para revisão do regulamento interno da Orquestra», e assegura que a obrigatoriedade de tirar férias, bem como um eventual lay-off, foram aprovados pela maioria dos músicos e são a forma encontrada «de manter os postos de trabalho e salvar a Orquestra Clássica do Sul».

No pedido de esclarecimento enviado ao Governo, com o assunto “Situação dos músicos da Orquestra Clássica do Sul: assédio moral, obrigatoriedade de marcação de férias em Maio e lay-off em Junho”, os deputados comunistas Ana Mesquita, João Dias e Diana Ferreira exigem saber se o Governo tem conhecimento da situação vivida pelos músicos da OCS e o que é que pretende fazer.

Segundo os comunistas, os alegados casos de assédio moral não são recentes e já motivaram queixas dos músicos, primeiro à direção da Associação Musical do Algarve (AMA) e, mais tarde, à Autoridade para as Condições no Trabalho.

«Os músicos da orquestra, pelo que transmitiram ao PCP, questionam o rumo e a missão artística atualmente seguida pela OCS e denunciam que há anos se apresentam em alguns sítios que não reúnem as condições mínimas exigíveis para a atividade artística, por falta de espaço, falta de vestiários e lavabos, más condições térmicas, entre outras. Note-se que estas questões não são menores, tendo impactos, desde logo, na própria saúde dos músicos, mas também nos instrumentos», segundo os parlamentares comunistas.

«A isto acresce a falta de condições de trabalho, designadamente acústicas, na sala de ensaios e a falta de cadeiras ergonómicas. Esta situação tem levado a queixas dos músicos pelo surgimento de doenças, desde perda auditiva definitiva a hérnias. Isto num contexto em que faltam músicos na orquestra, que conta apenas com 26 e não com os 31 que deveria ter, ao abrigo da legislação referente às orquestras regionais», segundo o PCP.

«Na sequência do protesto em três ocasiões em que, segundo os músicos da OCS, não se encontravam reunidas as condições para o exercício do seu trabalho, os músicos referem que foram confrontados por um assédio moral sem precedentes por parte da Direção da OCS, designadamente, ameaças de não pagamento de salários e de encerramento da atividade da Orquestra», acrescenta o mesmo partido.

 

Concerto da OCS na Ilha do Farol em Julho – Foto: OCS

 

Maria Cabral confirma a existência desta queixa, mas faz questão de frisar que esta «ocorre no âmbito de um processo de negociações para revisão do regulamento interno da Orquestra, durante o qual não tem sido possível aceder às suas exigências, como exemplo, a reivindicação da redução do número de quilómetros viajados em dia de concerto fora do Algarve, um aumento salarial fixado em cerca de 21%, a resistência à participação em concertos de natureza pedagógica, etc».

Ao Sul Informação, a presidente da direção da OCS revela, inclusivamente, quais são os três episódios de que os músicos se queixam.

Um foi «a realização de um concerto inédito na Ilha do Farol, em parceria com a Câmara Municipal de Faro e a Marinha Portuguesa, e inserido num processo de negociação da realização de outras parcerias importantes para a Orquestra».

«Para esse concerto, foram convidadas diversas autoridades nacionais e regionais. Tanto os músicos como os convidados foram transportados em embarcações de elevada qualidade no trajeto Olhão-Farol. Na noite desse concerto, após jantar em que todos participaram, evocando a existência de humidade a 63% e vento (vento fraco a moderado, uma vez que o concerto ocorreu numa noite de final de Julho, na Ilha do Farol), já com todos os convidados presentes, os músicos informaram a direção que “não tocavam” pelas razões acima ditas. Consideradas infundadas as suas razões, foi-lhes comunicado que o seu dever era prosseguir com o concerto agendado».

Os músicos também alegaram falta de condições no concerto que protagonizaram no Aeroporto de Faro, no Dia Mundial do Turismo. «As más condições de que os músicos se queixam devem-se à permanência prolongada numa sala do aeroporto, em tudo idêntica à salas em que todos permanecemos nos aeroportos, e à espera longa, que também todos experienciamos, sobretudo quando temos de passar por áreas de segurança sensíveis, em qualquer aeroporto do mundo».

A terceira queixa estará relacionada com «as condições do palco montado para o último concerto de abertura do Ano Letivo da Universidade do Algarve. Após se ter verificado que o mesmo era menor do que o previsto (os palcos são fornecidos pelas entidades contratantes dos concertos), foi de imediato feita reunião com o Maestro, a fim de o repertório ser alterado e assim a orquestra incluir menos instrumentos (de maior dimensão). Mesmo assim, perante grandes filas de público à espera, perante as autoridades académicas e locais já presentes, os músicos decidiram, após assembleia realizada no local do concerto, que não iriam tocar. A direção teve, de novo, de lhes lembrar a sua função enquanto trabalhadores da Associação Musical do Algarve e o facto de poderem estar a comprometer a imagem da Orquestra, além de poderem estar a pôr em causa a relação da AMA com a Universidade do Algarve, sua fundadora».

 




 

Além de assédio moral, os deputados do PCP também acusam a OCS de não estar a respeitar os direitos laborais dos músicos.

«Esta semana, a pretexto do surto epidemiológico da Covid-19, soube-se que a Orquestra Clássica do Sul decidiu que vai colocar os músicos em lay-off, mantendo o pessoal administrativo todo a funcionar a 100%. De acordo com informações que chegaram ao Grupo Parlamentar do PCP, os músicos serão obrigados a tirar férias em Maio, terão o vencimento pago sem subsídio de alimentação, com recurso ao lay-off simplificado anunciado para Junho. Isto tudo quando a OCS tem mais de 85% de financiamento garantido para este ano», alegam os deputados do PCP, no pedido de esclarecimento enviado à ministra da Cultura.

Maria Cabral fala, por seu lado, numa «quebra de faturação acima dos 40%», devido ao «cancelamento de todos os concertos agendados para os meses de Abril, Maio e Junho».

Tendo em conta esta realidade, causada pela pandemia de Covid-19, «foram postos dois cenários aos músicos, tendo-lhes sido pedido que sobre eles se pronunciassem. Tanto o Comité da Orquestra, como os músicos, na sua maioria, manifestaram-se a favor do cenário 1».

O cenário em causa prevê «o pagamento integral dos salários (sem subsídio de alimentação) nos meses de Abril e Maio», a marcação «de três semanas de férias entre o dia 1 e o dia 22 de Maio, inclusive» e de outra semana de férias «de 8 a 15 de Setembro, com pagamento integral do subsídio de férias, durante o mês de Setembro», bem como o pagamento integral dos salários do mês de Junho pela AMA (sem subsídio de alimentação), ou pela Segurança Social, nas condições determinadas pelo lay-off simplificado, dependente de avaliação realizada no final de Maio».

A alternativa, o chamado cenário 2, seria o pagamento integral dos salários em Abril e recurso ao regime de lay-off, durante os meses de Maio e Junho, «recebendo os trabalhadores dois terços da retribuição mensal ilíquida, paga em 30% pelo empregador e em 70% pela segurança social».

Desta forma, a presidente da Orquestra Clássica do Sul diz que não pode dizer, para já, se se irá optar pelo regime de lay-off simplificado, tendo em conta que, «considerando o panorama de profunda incerteza que presentemente vivemos, nos planos social e económico, não temos, nem tem ninguém, neste momento, resposta a essa pergunta».

«O que podemos acrescentar é que a direção da AMA/Orquestra Clássica do Sul tudo tem feito, ao longo de quase duas décadas, para manter a existência desta Orquestra, instituição cultural fundamental para os territórios e públicos que serve, nas Regiões do Algarve e do Alentejo. Inclusive, num passado de crise recente, alguns dos membros da direção subscreveram até dívida bancária em nome pessoal, a fim de que o pagamento dos salários dos trabalhadores da AMA, à data seriamente colocado em causa, se verificasse atempadamente», concluiu Maria Cabral.

 

 

 

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