Espumantes, late harvests, biológicos e palhetes: eis as novas tendências dos vinhos no Algarve

Nova logomarca e nova estratégia foram apresentadas pela CVA no Museu de Portimão

Laura Lopes, da NUTS, e Sara Silva, presidente da CVA, junto à nova logomarca – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

Espumantes e late harvests algarvios certificados, vinhos biológicos e o regresso dos vinhos palhete. São estas as grandes tendências do setor vinícola na região, anunciadas esta segunda-feira, dia 2 de Março, durante o lançamento do novo logotipo dos Vinhos do Algarve, no Museu de Portimão.

Em entrevista ao Sul Informação, Sara Silva, presidente da Comissão Vitivinícola do Algarve (CVA), adiantou que «cada vez mais há produtores a apostar na produção biológica. Há também o tal ressuscitar dos palhetes, dos claretes, um tipo de vinhos que já existia há muitos anos no Algarve e que agora estão a ser retomados, na tendência de termos vinhos menos alcoólicos, que estão mais dentro do que os consumidores atuais procuram».

Quanto aos espumantes, que já são produzidos no Algarve há década e meia – o primeiro foi o Quê, da Quinta do Barranco Longo, lançado em 2005 -, está agora a ser desenvolvido o processo para que possam vir a ser certificados com a IGP de Vinhos do Algarve. O mesmo se passa com os vinhos de colheita tardia (late harvest), que também já se produzem na região, mas ainda sem certificação.

A juntar ao aumento da qualidade do vinho produzido no Algarve – com castas regionais (Negra Mole), nacionais e mesmo internacionais, dando origem a brancos, tintos e rosés premiados a nível nacional e internacional – Sara Silva salienta que a aposta é «para cada vez mais termos um ramalhete de produtos mais diversificado».

A direção da CVA, presidida por Sara Silva, decidiu criar uma nova marca que não só dê uma imagem uniforme a todos os vinhos algarvios, como os distinga de todos os outros. Para isso, a empresa de branding NUTS, de Laura Lopes, pegou nos elementos que definem a região – mar, vinha, uvas, sol, peixe, vinho, platibanda e chaminé – e nas vibrantes cores algarvias para criar uma nova marca, um logotipo a usar por todos os vinhos, mas também, no futuro, por quem vende e dá a consumir os néctares do Algarve.

«Temos agora uma marca que nos pode identificar e diferenciar como região», explicou Sara Silva ao nosso jornal. «Estamos no Algarve, o vinho é do Algarve e aquele logotipo na garrafa traduz tudo da região algarvia – a gastronomia, o sol, o mar, o património. Quisemos torná-lo um elemento que fosse reconhecível mesmo a nível de comunicação e para que pudéssemos ultrapassar essa barreira da pergunta frequente: “há vinho no Algarve?”. Há e com muita qualidade, é a resposta que esta nova marca dá.

Vítor Neto, presidente da NERA, a Associação Empresarial do Algarve e ex-secretário de Estado do Turismo, também presente na sessão, disse ao Sul Informação que a criação da nova marca «é importante, porque cria uma personalidade e dá uma identidade que pode ser mais um fator positivo para dinamizar a reforçar a venda dos vinhos do Algarve».

 

Neste momento, como revelou Sara Silva, já há 45 agentes económicos inscritos na CVA, entre produtores, viticultores e engarrafadores, dos quais 31 são efetivamente produtores a colocar vinho no mercado.

A média das propriedades é de cerca de cinco hectares, sendo, na generalidade, vinhos de quinta, com produções reduzidas. Além disso, o preço da terra na região é muito alto, devido à concorrência do turismo e do imobiliário, pelo que não é fácil investir no setor da vinha.

Apesar de a produção vinícola algarvia estar a crescer de ano para ano, tendo atingido 1,3 milhões de garrafas na campanha de 2019, a verdade é que também não será pela quantidade que a região poderá competir. Rui Falcão, jornalista de vinhos convidado pela CVA para duas palestras durante o lançamento da nova identidade dos Vinhos do Algarve, recordou que «só o vinho Muralhas de Monção [vinho verde] produz 6 milhões de garrafas todos os anos». No total, os 31 produtores algarvios são responsáveis por apenas 1,3 milhões de garrafas…

Por tudo isso, os preços dos vinhos do Algarve são mais altos que nas restantes regiões vitivinícolas do país. Então, que trunfos poderão explorar os produtores algarvios? Sara Silva defende que «o nosso caminho é vingarmos pela qualidade e genuinidade dos nossos produtos».

Facto curioso é que 40% dos vitivinicultores algarvios são estrangeiros, das mais diversas nacionalidades: suíços, britânicos, holandeses, belgas, alemães, franceses, sul-africanos.

A presidente da CVA sublinha que esse «é, de facto, um dos elementos que contribui para a diversidade dos vinhos que temos. Não temos um tipo de vinho do Algarve, temos vários tipos. Há aqui uma panóplia de nacionalidades que refletem tendências diferentes. Entre os produtores de origem estrangeira, há quem aposte nas castas nacionais, outros nas internacionais. No meio disto tudo, nascem os vinhos do Algarve, com esta diversidade toda».

 

A nível nacional, com uma produção pequena e, até agora, com pouca visibilidade, o Vinho do Algarve ainda tem «pouca expressão». Mas essa também é uma imagem que a CVA pretende alterar, com a nova logomarca e uma aposta mais forte na comunicação e no marketing.

Vítor Neto, presidente do NERA, defendeu, nas suas declarações ao nosso jornal, que o vinho é um setor que ainda tem muito para dar ao Algarve. «Isso é evidente, sobretudo pela sua diferença, pelas suas características físicas e pela sua qualidade. Não tanto pela quantidade, porque temos regiões do país que produzem muito mais, mas o vinho do Algarve tem todas as condições para se afirmar. É necessário dar a conhecer as suas diferentes castas, os seus diferentes tipos. Todos eles correspondem a segmentos de mercado que existem e trata-se só de comunicarmos com eles essa especificidade e essa qualidade».

Por seu lado, Pedro Valadas Monteiro, diretor regional de Agricultura, também presente no lançamento da nova identidade, disse ao Sul Informação que «o trabalho ao nível da vinha, da produção, da vinificação, da enologia já foi feito. Agora convém trabalhar-se mais no marketing dos vinhos do Algarve e, pelo que vimos aqui, é nisso que se está agora a trabalhar».

«Tendo em conta que temos uma produção muito pequena, há que apostar em força no marketing associado ao território e à marca Algarve, que é uma marca que vende, que tem uma projeção internacional enorme», acrescentou.

Sendo o Turismo a grande atividade económica da região, Pedro Valadas Monteiro defendeu que os vinhos regionais só terão a ganhar com essa notoriedade internacional da marca Algarve. «O vinho, de todas as culturas agrícolas, de todos os recursos endógenos, é aquele produto que, por tradição, tem maior empatia e facilidade em criar sinergias com o turismo. Isso acontece, por exemplo, através da associação com a gastronomia, sendo que o canal Horeca [Hotelaria, Restauração, Cafetaria e Catering] é, para os vinhos do Algarve, o mais importante entre todas as regiões vitícolas do país. É aqui, na nossa própria região, que nós temos o maior escoamento da produção».

 

Também a Comissão Vitivinícola do Algarve pensa o mesmo, de tal forma que a sessão de segunda-feira passada contou com muitos agentes do canal Horeca, desde distribuidores a donos de restaurantes e garrafeiras ou responsáveis pelo F&B dos hotéis. Mas as iniciativas não se ficam por aqui.

Já no próximo dia 23 de Março, de novo uma segunda-feira, a CVA irá organizar um dia aberto, que levará os diversos agentes Horeca a visitar cerca de dezena e meia de produtores vitivinícolas da região. «Há uma série de quintas que vão estar disponíveis nesse dia para visita por agentes económicos do mercado profissional, no sentido de estimular a venda dos Vinhos do Algarve nos restaurantes e hotéis da região. Quanto mais os agentes económicos souberem sobre os nossos vinhos, mais gosto e interesse terão em vendê-los aos seus clientes», acrescentou a presidente da CVA.

Este ano será reeditado o Concurso de Vinhos do Algarve, cuja 13ª edição terá lugar em Maio, «mas com mudanças na organização, nomeadamente nos jurados». Durante o primeiro semestre deste ano, deverão ter ainda lugar as Jornadas do Vinho, organizadas pela CVA, contando coma colaboração de um «parceiro de peso» do setor.

 

Na região algarvia, até para tirar maior partido do mercado turístico, há, porém, uma área que falta trabalhar mais: a do enoturismo.

Rui Falcão, o jornalista especializado em vinhos convidado pela CVA para falar sobre as tendências atuais, já tinha chamado a atenção para o enoturismo, que, sublinhou, «pode representar até 50% das vendas» de um produtor.

Patrick Agostini, o médico patologista que é produtor de vinho na sua Quinta do Francês (Silves) e que tem apostado em força no enoturismo, sublinhou que este nicho «pode fazer muito pelo Algarve». O vitivinicultor ofereceu-se mesmo para partilhar com outros produtores a sua experiência nessa área.

Para já, é conhecido que a Quinta da Aveleda, que há um ano comprou o Morgado da Torre, em Portimão, está a investir fortemente no enoturismo. Mas o Sul Informação sabe que há outros grandes investimentos na calha.

No Algarve, até já existe uma Rota dos Vinhos, operacionalizada por uma associação independente. Mas nem sempre as visitas estão a funcionar, assim como são poucos os produtores que efetivamente dela fazem parte.

«A Comissão Vitivinícola, neste momento, está a tentar auxiliar a Rota, através do lançamento da aplicação e da promoção da qualidade dos vinhos. Os produtores têm feito um trabalho muito pessoal de projetar a sua própria quinta, com visitas, com experiências do enoturismo, mas de uma forma muito isolada. Importa agregar essa oferta. O Turismo do Algarve vai dar apoio no sentido de revitalizar a Rota dos Vinhos do Algarve, e assim ajudar os produtores nessa projeção, nos restaurantes, nos hotéis. Temos aqui oportunidades à nossa porta, só temos de fazer chegar as nossas propostas ao nível do enoturismo», considerou Sara Silva.

Para o diretor regional de Agricultura, «o setor tem de fazer cada vez mais uma aposta na visitação das suas próprias adegas, no sentido de cativar turistas para o produto vitivinícola». Por seu lado, o turismo também tem muito a ganhar com o enoturismo, enquanto «fator de diferenciação da oferta turística regional».

«Ainda ninguém vem de propósito ao Algarve por causa dos nossos vinhos. Mas o turismo pode dar uma boa ajuda para que isso aconteça», sublinhou João Gamboa, vereador da Câmara Municipal de Portimão.

 

Fotos: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

 

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