A barragem da Foupana e a seca do Sotavento Algarvio

A Foupana é a barragem que tem que avançar de seguida e depressa

Foto de arquivo

Tive a honra de, em 1991, no exercício de funções governativas, ter assinado o despacho de lançamento do concurso para a obra da barragem de Odeleite, assim como da ETA de Tavira dias depois. Tinha a ideia firme de que eram obras essenciais para o Sotavento. Era apenas um jovem com responsabilidades e com convicções do que estava a decidir.

Estava na nossa mente o drama dos anos secos do princípio da década de 80. Com os furos secos , sem redes de saneamento eficazes , ribeiras com esgotos e praias poluídas. Muitos não imaginam como foi. No drama, o Governo Balsemão criou uma equipa e um fundo de emergência para remediar o possível.

Hoje, 30 a 40 anos depois muita gente não se dá conta do que seria a nossa vida sem estas obras fundamentais para o consumo humano, para as infraestruturas do turismo e para a agricultura de regadio que com sucesso se faz nesta região.

Os furos municipais não chegavam, os aquíferos estavam então salgados ou com cloretos e outros elementos nocivos. As campinas de Faro e de Tavira hoje já não conseguiriam produzir nada de muito relevante.

Em boa hora se avançou.

Nessa altura, os especialistas de planeamento hidráulico também nos falavam da Foupana, do Vascão e da ribeira do Alportel, como ideias para futuras barragens.

De então para cá, as alterações climáticas estão a reduzir a precipitação média de cerca de 30mm de 10 em 10 anos, o que nos complica a vida em muito. E enquanto os Estados Unidos da América, o Brasil e a Rússia forem presididos por loucos, sem respeito pela ciência e sem bom senso, as coisas não se resolvem. Basta ver o fiasco da recente cimeira de Madrid dedicada ás questões ambientais.

Decorridos quase 30 anos do lançamento da obra de Odeleite, embora tenha entrado em funcionamento pleno em1998, chegou a hora de se dar o passo seguinte.

A Foupana é a barragem que tem que avançar de seguida e depressa. Tem a maior bacia não aproveitada e está bem posicionada geograficamente para alimentar o atual sistema Odeleite-Beliche, por isso não carece de obras adicionais, basta a simples ligação.

O Vascão está mais longe, implica obras mais complexas ainda que noutra geração seja inevitável.

A ribeira do Alportel teve a barragem em construção nos anos 30 do século passado, ainda hoje lá está meia obra à vista, com muros e fundações quase intactos 90 anos volvidos, cerca de 10 quilómetros a montante de Tavira, perto da Picota, coisa que pouca gente sabe. Mas essa obra parou por razões que não consegui até hoje apurar concretamente.

Quando exerci funções de presidente do Município de Tavira, ainda se fez uma candidatura para retomar o processo, mas não se obteve financiamento.

O Município de S. Brás de Alportel desde os anos 80 que reclama uma barragem na mesma ribeira, num local de aproveitamento de apenas meia bacia e na altura a preocupação era o abastecimento de água à vila, o que agora está assegurado pelo sistema Odeleite-Beliche, através da empresa Águas do Algarve.

Temos atravessado um período de seca extrema no Sotavento Algarvio, desde a Primavera de 2019. Os cerca de 150mm caídos neste ano hidrológico, desde 1 de Outubro, são uma boa esperança, mas até Abril ainda precisamos de mais uns 350mm, no mínimo. Não sabemos se tal sorte nos estará reservada. Estamos com o credo na boca, os que têm consciência do problema.

Por isso, é inadiável armazenar mais água para que as populações, as empresas e a economia do Sotavento possam funcionar.
Estão em causa as populações, o turismo e a agricultura de pomares de frutícolas que fazemos com gosto e com sucesso.

Produzimos e exportamos muitas toneladas de frutos vermelhos, citrinos, abacates, diospiros e hortícolas diversas. E, sem os campos de golfe, não poderemos ter turismo em condições competitivas.

Os autarcas, os deputados, as associações empresariais têm que batalhar para colocar o assunto na agenda do Governo, o que me parece que não está a ser feito, salvo melhor e mais informada opinião.

Foupana tem que ser o nosso objetivo na década de 20 que agora se inicia. Projetar e construir esta obra leva anos e, se nos calham dois ou três anos secos, ficamos todos aflitos e sem solução alternativa.

Até se deveria ter feito já este projeto há mais tempo e antes de se fazer o viaduto do IC27, ao que nos dizem os melhores especialistas, dado que agora temos um condicionante adicional.

A economia desta nossa região dá ao Estado, anualmente, em impostos, 35% daquilo que produz. É muito dinheiro. Por isso, o Prof Centeno, que tem sangue daqui, terá que ter em conta este assunto.

Mas como ele não é especialista em águas, terão que ser outros governantes a sensibilizá-lo para orçamentar para 2021 o projeto da barragem, com a condição de não ficar sujeito a cativações, senão nada.

 

Autor: José Macário Correia, agricultor.

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