Piquenique de charme abre o Festival da Comida Esquecida

«Queremos transmitir uma experiência gastronómica enriquecedora e isso só se faz de forma mais intimista»

Créditos da imagem: Festival da Comida Esquecida

Chícharos, pau roxo, amoras silvestres, catacuzes, alcagoitas, cherovias, milhos fervidos ou aferventados, sardinhas amarelas ou garrentas. Estes são apenas alguns exemplos das comidas esquecidas que agora vão ser trazidas de novo à mesa – ou à toalha do piquenique – num festival inovador que será a grande novidade da quarta temporada da programação do 365Algarve, que começa em Outubro.

Trata-se do Festival da Comida Esquecida, que começa com quatro «Piqueniques de Charme», o primeiro dos quais já no próximo dia 19 de Outubro, na Azilheira, localidade da freguesia de S. Marcos da Serra. Os seguintes serão também em «lugares inspiradores» do Algarve, nomeadamente na aldeia da Penina (interior de Loulé, a 28 de Março do próximo ano), Santo Estêvão (Tavira, 18 de Abril) e Cacela Velha (2 de Maio).

Estes piqueniques «à moda dos anos 30, 40», com os participantes sentados nas mantas no chão e a comida servida em cestinhos, terá um menu «elaborado por um chef, diferenciador e o mais vinculado ao local possível», mas também animação teatral, com a Associação Resmalhar, e ainda música folclórica, com baile e acordeão. Um verdadeiro piquenique no campo à moda algarvia.

 

Fotografia: Gabriel Vieira e Momentum, da Floresta ao Prato

Haverá depois o «Momentum, da Floresta ao Prato», jantares sensoriais preparados por alunos do Mestrado em Inovação em Artes Culinárias da Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril, em que os comensais poderão «tocar, comer e saborear» a comida.

Os jantares terão lugar em monumentos e sítios históricos, nomeadamente o Museu do Traje de São Brás de Alportel (8 de Novembro), o recuperado Convento do Carmo, em Lagoa (9 de Novembro), e a ermida de Nossa Senhora de Guadalupe, em Vila do Bispo (10 de Novembro).

Segue-se a iniciativa «Colher e Cozinhar», que irá propor «experiências mais intimistas», que começam com «passeios junto à horta de alguns produtores, onde as pessoas vão colher, com as suas próprias mãos, o que vão depois confecionar e comer».

O dono de cada horta será o anfitrião, guiando os participantes pela história e histórias do local. O primeiro evento será no dia 30 de Novembro, em Giões, nos Recantos d’Aldeia (Alcoutim), seguindo-se a Ponte da Tôr (interior de Loulé, a 8 de Dezembro) e Maria Vinagre (Aljezur, a 23 de Fevereiro).

Colher e Cozinhar – Créditos da imagem: Festival da Comida Esquecida

Toda a programação do Festival da Comida Esquecida terminará a 30 de Maio, com a festa de encerramento «Na Casa da D. Glória», dedicada à «comida das famílias algarvias», e que decorrerá ao longo de todo o dia no centro da aldeia de Querença. Haverá mercado no largo, com produtos locais e tradicionais, as famílias de Querença abrirão a porta das suas casas para dar de comer aos turistas, tudo isso acompanhado por música, com o grupo Folequestra.

Só esta última iniciativa terá entrada livre, já que todas as outras se destinam a grupos mais restritos, prevendo-se que os bilhetes para cada uma delas estarão em breve à venda na plataforma BOL.

A ideia deste Festival da Comida Esquecida, segundo explicou ao Sul Informação a produtora cultural e designer Alexandra Santos, membro da Cooperativa QRER (que promove o festival), é «trabalhar sobre a problemática das tradições alimentares que estão na iminência de se extinguirem».

«Queremos alertar para isso, com um projeto turístico que disponibiliza uma oferta diferente e adequada às tendências atuais, com uma forte vertente cultural e gastronómica», acrescentou.

 

Créditos da imagem: Festival da Comida Esquecida

Uma das comidas esquecidas tem o estranho nome de catacuzes. Susana Calado Martins, outra das co-organizadoras do Festival, igualmente membro da QRER, explica que se trata de «uma erva silvestre, antigamente de uso corrente pelas pessoas da zona da Azilheira, por exemplo». Esta erva, «de que as senhoras da Azilheira nos falaram muito», foi descoberta por Susana durante uma recente deslocação a essa pequena localidade serrana, no âmbito da pesquisa para preparar as várias atividades que vão dar forma a este festival da Comida Esquecida.

Com esta iniciativa, que vai às raízes dos comeres locais, «não estamos a ser saudosistas, não estamos a dizer que o passado é que era bom. O nosso trabalho tem antes a ver com o património imaterial, que se está a perder», explica Alexandra Santos.

Hoje, comenta a produtora cultural, «há um grande desligamento entre a origem e o que comemos. Compramos muita coisa empacotada, sem sabermos de onde vem». A programação deste Festival da Comida Esquecida quer, precisamente, promover essa religação entre as pessoas e a origem dos seus alimentos.

Susana Calado Martins acrescenta que a programação, que está voltada para os turistas de todas as nacionalidades que procuram o Algarve também fora da época alta, «é coerente com a nossa mensagem e com o nosso próprio trabalho». «Vamos tentar que os eventos não tenham só a ver com tradições, com memória. Não é só essa a nossa preocupação. Queremos também usar os produtos de cada local. Por exemplo, quem participar no piquenique na Azilheira, saberá que a couve que está a comer é dali e não foi comprada num qualquer hipermercado do litoral».

«Queremos a autenticidade e a ligação à terra, porque isso é também o que os turistas mais esclarecidos procuram», junta Alexandra Santos.

 

Alexandra Santos e Susana Calado Martins, numa outra iniciativa, o Mercado Fora d’Horas, em Silves

Mas não se pense que, lá por irem recuperar alimentos que outrora se comiam no Algarve, do mar à serra, apenas haverá ementas baseadas em receitas antigas, tradicionais. Também haverá inovação, com os menus a serem elaborados por chefs, que partem dessa tradição, dessa memória e dos produtos locais, para a criação de novos pratos.

Isso será especialmente patente no «Momentum – da Floresta ao Prato», um evento que já teve lugar na Serra de Sintra e que agora, «sem perder a sua identidade, será adaptado à realidade e aos produtos disponíveis no Algarve».

O Festival da Comida Esquecida vai passar por nove concelhos algarvios, de Outubro a Maio: Aljezur, Vila do Bispo, Silves, Lagoa, Loulé, São Brás de Alportel, Tavira, Vila Real de Santo António e Alcoutim. Todos os locais escolhidos são no interior, à exceção de Cacela Velha, que é «na mesma um lugar rural».

Toda a conceção do festival foi pensada para a participação de grupos pequenos, que nunca hão-de exceder as 45 pessoas e que, algumas vezes, serão até bem menores. «Estes eventos terão lugar em sítios protegidos ou que o deveriam ser, por isso nunca poderíamos ter uma grande carga de pessoas», disse Alexandra Santos.

«Queremos transmitir uma experiência gastronómica enriquecedora e isso só se faz de forma mais intimista», acrescenta Susana Calado Martins.

Como já se disse, só a festa final, em Querença, será aberta ao público, por ser no largo da aldeia. E será mesmo uma verdadeira festa, com «muita petisqueira, muita música, muita dança». Tudo para celebrar a Comida Esquecida e um certo mundo rural que, apesar muito ameaçado, ainda consegue ser o pilar de projetos inovadores de turismo sustentável.

O Festival da Comida Esquecida, integrado na programação do 365Algarve, é promovido pela Cooperativa QRER, sendo uma conceção coletiva das suas cooperantes Barroca, Produtos Culturais e Turísticos (Susana Calado Martins) e Alexandra dos Santos Design, contando ainda com a colaboração de Pedro Bartilotti.

 

Créditos da imagem: Festival da Comida Esquecida

 

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