Equipa dos hospitais do Algarve ajuda a lidar com medo da morte

Equipa é formalmente apresentada esta quarta-feira

O Centro Hospitalar Universitário do Algarve tem uma equipa que “dá a mão” aos doentes em estado terminal e às suas famílias e acompanha-os na fase final da doença, na morte e no luto.

A Equipa de Apoio Psicossocial (EAPS) na área dos Cuidados Paliativos entrou em funções no início do ano e é um projeto criado e financiado pela Fundação “La Caixa”, no âmbito do Programa de Apoio Integral a Pessoas com Doenças Avançadas, designado por Programa Humaniza, em Portugal.

Este apoio veio dar «a possibilidade de, com financiamento externo, termos mais recursos humanos para melhorar ainda mais os cuidados a nível psicossocial e espiritual dos doentes que estão a ser seguidos nos cuidados paliativos», explica o médico Giovanni Cerullo, diretor técnico da EAPS, ao Sul Informação.

Atualmente, quatro profissionais compõem a equipa: dois assistentes sociais e dois psicólogos, mas, «tendo em conta que o programa terá uma duração longa, esperamos nós, o nosso objetivo é, neste primeiro ano, organizarmo-nos e, eventualmente, se houver necessidade, fazer uma candidatura para aumentar o número de profissionais».

Mas o que traz esta equipa de diferente aos cuidados paliativos? Primeiro, uma nova abordagem: «em Portugal, a equipa base dos cuidados paliativos é formada por um médico, um enfermeiro, um assistente social e um psicólogo. Até agora, o trabalho tem sido feito através de uma equipa multidisciplinar, onde cada pessoa, com uma especialidade diferente, atua. Mas, neste momento, estamos a pensar num modelo interdisciplinar. Cada pessoa tem a sua profissão, mas exerce-a interligada aos outros. É por isso que o cuidado e a atenção aos doentes é feito quer do ponto de vista psicossocial quer espiritual», realça Giovanni Cerullo.

 

Este apoio espiritual é importante numa «situação complicada de sofrimento e doença. Quando estamos perto de uma situação que envolve a morte, sejamos nós pacientes ou familiares, surgem algumas perguntas do fundo da alma. Essa é a parte da espiritualidade. Não entendemos como religião. É algo mais íntimo, mais pessoal e profundo».

Além disso, a nível psicológico, «há o medo de morrer, da morte. Todos temos. O apoio que procuramos dar é para ajudar o doente, se precisar, a ver a morte como algo que vai naturalmente acontecer, mas com menos medo. Tentamos dar um apoio e uma visão a nível psicológico para que, eventualmente, possam ser resolvidos assuntos pendentes», exemplifica o clínico.

No caso da família, procura-se ajudar a «viver o momento numa perspetiva de autoajuda, que minimize o sofrimento que existe provocado pela ideia da morte que, eventualmente, vai chegar. Além disso, a EAPS tem um papel importante no luto. Estima-se que 10 a 15% dos lutos são complicados. Quando os familiares ficam com um luto mal resolvido, isso leva a alterações na qualidade de vida e pode levar a doenças psiquiátricas, como a depressão. Por isso, o apoio psicológico acompanha toda esta fase final da vida do doente e dos familiares e, depois, dá também o apoio ao luto».

Giovanni Cerullo explica que é como se houvesse umas «mãos por baixo da família do doente, segurando-a e levando-a até à fase final. Essa é a filosofia dos cuidados paliativos. A medicina tenta tratar a doença, enquanto os cuidados paliativos procuram cuidar daquela pessoa, da família e de tudo o que envolve esta fase. Às vezes, as pessoas acham que os cuidados paliativos não fazem nada e que, quando não há nada para fazer, são ativados. Não é assim. Nos cuidados paliativos, há tudo para fazer».

A EAPS, prossegue o médico, «vai complementar a atividade das equipas dos cuidados paliativos, mas vai-se concentrar também nos outros pilares do programa, que é o cuidar do doente, dos familiares, fazer a implementação do voluntariado em cuidados paliativos e fomentar a formação em cuidados paliativos e apoio às equipas profissionais».

A EAPS «vai também ficar responsável e ajudar a complementar a atividade do voluntariado no Algarve. A Unidade de Portimão tem um grupo de voluntariado com história e organizado, e, em Faro, estamos a organizar também e a implementar o voluntariado»

Uma vez que, «em cuidados paliativos, não pode ser um voluntário qualquer e a pessoa tem de ter formação e perfil para isso, a equipa está a fomentar a formação do voluntariado. Não só a nível hospitalar, mas da comunidade».

 

É esta integração com a comunidade que torna o projeto inovador a nível nacional. «Neste momento, o CHUA é a única entidade hospitalar que tem um projeto já implementado na comunidade. Nos outros hospitais, existe apenas a atividade intrahospitalar».

Giovanni Cerullo explica que, para colocar em prática este apoio “fora de portas”, existe uma colaboração com «as equipas que são chamadas recetoras, essas são a equipa de cuidados paliativos do Hospital de Faro, a equipa de cuidados paliativos do Hospital de Portimão, a equipa comunitária do ACES do Barlavento e a equipa comunitária do ACES Central».

«Os doentes são seguidos pela equipa comunitária de cuidados paliativos, nos Centros de Saúde, e a equipa de apoio psicossocial colabora com essa equipa. Há um levantamento das necessidades da família e, quando se encontra uma situação em que o papel do voluntário possa ser importante, se a família aceitar, há uma atuação», acrescenta.

Para o clínico, este apoio ao nível da comunidade é «muito importante. É importante ter o apoio dos voluntários na casa dos doentes. O doente está em casa com apoio dos familiares durante 24 horas, mas a família precisa de ter atividades, de sair, de fazer coisas simples, que não seja só ir à consulta e ir às compras. Nesse momento, o voluntariado intervém para ajudar a cuidar do doente e da família. Nessa parte do voluntariado, estamos em fase de organização, seja a nível hospitalar, quer a nível da comunidade».

O papel da equipa de apoio psicossocial é o de «complementar a atividade das equipas já existentes sugerindo alterações no modus operandi».

Um dos exemplos dados pelo médico Giovanni Cerullo da possível atuação dos voluntários – e que pode ser uma boa ajuda – acontece no hospital: «há coisas básicas, que para nós não fazem diferença, mas para um familiar fazem. Alguém vem acompanhar o doente à consulta e não encontra estacionamento. Deixa o doente sozinho e vai tentar encontrar estacionamento, ansioso. O que pode acontecer é que, quando o doente tiver consulta, o voluntário tem a lista com o contacto telefónico e vai contactar o familiar. Pergunta se estão a chegar e estará à espera para receber o doente. O familiar vai estacionar com calma, porque o doente não fica sozinho».

O mesmo pode acontecer quando «nas consultas, o familiar precisa de falar connosco, perguntando algumas coisas, ou para ter apoio psicológico e não pode. O voluntário, juntamente com o terapeuta ocupacional, vai intervir».

O apoio é isto: cuidar do doente e da família», conclui.

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