Há quem investigue a investigação científica

Já teremos pensado que é possível investigar a investigação científica? Conhecer a sua história, os locais onde teve lugar e os personagens que lhe deram vida? E, mais ainda, fazer tudo isto relativamente a Portugal?

A ciência e, consequentemente, a investigação científica são cada vez mais importantes no nosso quotidiano. Sabemos que muitos cientistas investigam arduamente para nos proporcionar uma melhor qualidade de vida e para nos ajudar a compreender o que nos rodeia.

Mas já teremos pensado que é possível investigar a investigação científica? Conhecer a sua história, os locais onde teve lugar e os personagens que lhe deram vida? E, mais ainda, fazer tudo isto relativamente a Portugal?

Coloque então a sua bata de cientista (ou o seu chapéu de Indiana Jones!) e venha conhecer os espaços onde era feita a investigação científica universitária no Portugal da I República, através do livro Ciência e Universidade na I República, da autoria de Ângela Salgueiro.

É importante notar que Ângela Salgueiro, doutorada em História pela Universidade Nova de Lisboa e investigadora do Instituto de História Contemporânea (NOVA FCSH), vem desenvolvendo uma relevante carreira no âmbito do estudo da atividade científica e da organização da ciência em Portugal ao longo do século XX, estando ligada a iniciativas como as exposições Educar. Educação para todos. Ensino na I República (2010) e Margem Esquerda. A Revolução Russa e a Cultura Científica em Portugal no século XX (2017-2018), bem como ao projeto História do Instituto Camões, desenvolvido pelo IHC – NOVA FCSH.

O livro que, em 2017, foi dado à estampa, com o selo de qualidade da editora Caleidoscópio, é fruto da tese de Doutoramento da autora e de todo o percurso até então desenvolvido. Trata-se de uma obra obrigatória em todas as bibliografias (e bibliotecas!) que tratarem de História da Ciência e da investigação científica.

Ângela Salgueiro

Ao abri-lo, o leitor deverá aceitar o convite feito por Maria de Sousa no intróito da obra e “entrar na sala de aula”, deixando-se guiar pela exposição interessante e escorreita da autora, até aos meandros da trilogia República, Ciência e Universidade.

Este livro, solidamente alicerçado no estudo de fontes na sua maioria inéditas, vem apresentar uma análise histórica original sobre a atividade científica desenvolvida nas Universidades durante a I República.

Nele, é possível aprofundar o conhecimento sobre o processo de institucionalização científica e especialização disciplinar ocorrido na Universidade portuguesa durante as primeiras décadas do século XX. Tal como acompanhar a forma como a I República colocou a investigação científica na esfera de intervenção do Estado, seguindo um ideário decorrente da ação das elites científicas e das instituições de ensino superior.

Ao longo de sete capítulos, a autora convida-nos a acompanhar a evolução dos discursos e práticas relativos ao ensino e à investigação científica desde a segunda metade do século XIX, até à criação da Junta de Educação Nacional em 1929.

No seu conjunto, destaco o capítulo 4, intitulado “Pela ciência e pela cultura científica”, no qual são pela primeira vez enunciados na historiografia portuguesa todos os institutos de investigação científica existentes durante I República em cada um dos três polos universitários nacionais: Lisboa, Coimbra e Porto.

Uma listagem que só agora se torna conhecida, mercê da aturada investigação desenvolvida pela autora em arquivos de difícil acesso e, alguns deles, insuspeitos, nos quais entrou em contacto com documentação inédita.

Mas mais do que acompanhar o desenvolvimento destes institutos de investigação, o livro expõe ainda as redes de internacionalização da atividade científica nas quais Portugal participava e apresenta-nos um País no qual se movia uma elite científica conceituada e internacionalizada.

Uma elite que integrava rede internacionais de disseminação do conhecimento e cuja colaboração internacional é expressa, por exemplo, na coautoria de artigos científicos e na participação em congressos internacionais.

Além de pautado por belíssimas fotografias da época, o livro é ainda complementado por um índice remissivo bastante completo e por uma extensa bibliografia que permite ao leitor tomar contacto com as principais obras relativas ao tema.

Como refere Maria Fernanda Rollo no prefácio da obra, “este livro é, por tudo isso, um texto essencial para conhecer a história da ciência e da atividade científica em Portugal nas primeiras décadas do século XX”.

 

Autora: Ana Carina Azevedo (Historiadora)
Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

Ana Carina Azevedo é doutorada em História, área de especialização em História Contemporânea, pela Universidade Nova de Lisboa. Investigadora do Instituto de História Contemporânea – NOVA FCSH, tem como principais interesses de investigação a História portuguesa do século XX, nomeadamente, a História Económica e Social; a História do Trabalho e da Indústria e a História da Administração Pública em Portugal.
Desenvolve, atualmente, uma investigação de pós-Doutoramento, com financiamento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, subordinada ao tema “Um Estado em busca da eficácia? As Reformas Administrativas do Estado Novo em perspetiva histórica (1933-1974)”.

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