Viagens da Gulbenkian a Portimão começam com artes plásticas, mas vão estender-se à música

«Lugares Paisagens Viagens» é o título da mostra que põe em diálogo obras dos Museus Gulbenkian e de Portimão, mas também de colecionadores locais

A parceria iniciada no sábado com a exposição «Lugares Paisagens Viagens», que traz ao Museu de Portimão peças da coleção pessoal de Calouste Sarkis Gulbenkian que nunca tinham saído de Lisboa, vai continuar, mas a outros níveis, com a vinda à cidade algarvia «da orquestra, do coro» e mesmo dos «projetos na área social», ao nível da «inclusão e do desenvolvimento pessoal». Esta promessa foi deixada no sábado por Teresa Patrício Gouveia, administradora da Fundação Gulbenkian, na abertura daquela mostra no Museu de Portimão.

A exposição que agora pode ser vista integra um programa mais vasto de «percursos pelas coleções» do museu lisboeta, que, sob a designação de «Gulbenkian Itinerante», são apresentadas em cinco espaços de Norte a Sul do país.

Assim, no fim de semana passado abriu, em Bragança (Centro de Arte Contemporânea Graça Morais) e S. Martinho de Anta, Sabrosa (Espaço Miguel Torga), a exposição «Corpo e Paisagem», que aí pode ser vista até 17 de Março do próximo ano. No dia 8, foi a vez do Museu de Portimão. Mas irá ainda seguir-se o Centro de Cultura Contemporânea de Castelo Branco (6 de Abril a 28 de Julho de 2019), o Centro de Artes de Sines («Pontos de Encontro», 16 de Março a 9 de Junho) e, finalmente, num regresso ao Algarve, o Museu Municipal de Tavira/Palácio da Galeria («Mares sem Tempo», 23 de Novembro de 2019 a 23 de Fevereiro de 2020).

Como explicou Teresa Patrício Gouveia, «esta é quase uma reedição de uma aventura anterior da fundação, a das bibliotecas itinerantes».

Agora , sendo «a primeira vez que peças da Coleção do Fundador circulam pelo país», esta é também a «primeira ronda daquilo que gostaríamos que fosse uma itinerância prolongada, talvez constante», acrescentou a administradora da Fundação Gulbenkian, na abertura da mostra no Museu de Portimão.

Teresa Patrício Gouveia sublinhou ainda o facto de estas não serem exposições que chegam já prontas do museu lisboeta, antes são o resultado de co-curadoria local, «a partir de um conjunto de obras disponibilizadas», num trabalho que se prolongou por «um ano».

Teresa Patrício Gouveia

No caso de Portimão, como salientaria o diretor científico do Museu e co-curador desta exposição, «acrescentámos as Viagens». «Porque estamos a comemorar o Dia da Cidade e Manuel Teixeira Gomes, que era um imenso viajante, um ávido colecionador e escritor, essa dimensão pareceu-nos importante».

Para mais porque Teixeira Gomes e Calouste Gulbenkian foram contemporâneos e «quem sabe se não se cruzaram, nas suas viagens, pelo mundo fora?» É isso mesmo que, sublinhou José Gameiro, pretende a mostra inaugurada no sábado no Museu de Portimão: fazer uma «viagem pelo mundo, cruzando tempos, artistas e coleções».

No fundo, completaria Teresa Patrício Gouveia, são «peças que se encontram com as da coleção de Teixeira Gomes e do museu de Portimão».

José Gameiro classificou como «desafio estimulante» esta nova «visão descentralizadora da Gulbenkian». Também Isilda Gomes, presidente da Câmara de Portimão, considerou estar-se «a fazer história, ao termos a Fundação Gulbenkian de portas abertas», como se fosse «um museu de proximidade».

Por isso, sublinhou a autarca, é bom constatar que há «gente com coragem e visão estratégica para saber utilizar o que temos de bom no nosso país».

Os quadros adquiridos por Calouste Gulbenkian e Teixeira Gomes, lado a lado

O mote deste iniciativa «Gulbenkian Itinerante» é, precisamente, «atravessar culturas através dos tempos». As duas coleções do Museu Gulbenkian, que percorrem 5000 anos de História e constituem o património artístico da Fundação, integram as obras reunidas por Calouste Sarkis Gulbenkian – a Coleção do Fundador – e o conjunto resultante das aquisições, legados e doações reunido após 1956 na Coleção Moderna.

O projeto «Gulbenkian Itinerante» procura, através de parcerias com instituições em todo o país, divulgar as coleções do Museu Calouste Gulbenkian, «privilegiando as regiões mais distantes dos principais centros culturais» – para já Bragança, Sabrosa, Castelo Branco, Sines, Portimão e Tavira.

Aos parceiros, é dada a possibilidade de escolherem obras dos acervos da duas coleções do Museu Gulbenkian, «com especial enfoque nas peças menos conhecidas ou em obras de autores que merecem ser reencontrados ou mesmo redescobertos», explica a fundação, num jornal lançado para acompanhar este ciclo.

«A ideia é confrontar estas obras com os seus critérios de curadoria e com as coleções das instituições onde serão apresentadas, numa colaboração permanente dirigida às comunidades que servem».

Por outro lado, «o projeto procura a criação de redes entre os vários parceiros que, em alguns casos, se associaram para a apresentação e conceção das exposições» (casos de Bragança, Sabrosa e Castelo Branco).

«Esperamos que esta iniciativa simbolize o início de uma parceria, numa perspetiva mais dinâmica, criativa e interventiva na preparação do nosso futuro comum», conclui a Fundação Gulbenkian.

Obra de Teresa Dias Coelho, da Coleção Moderna da Gulbenkian

No Museu de Portimão, na exposição que pode ser vista até 3 de Março do próximo ano, estabelecem-se diálogos interessantes: desde logo, à entrada, uma pintura da quase portimonense Teresa Dias Coelho (usada para o cartaz da iniciativa), pertencente à coleção Gulbenkian, marca uma ausência, «de alguém que partiu e talvez não tenha voltado», como aconteceu a Manuel Teixeira Gomes.

Depois, estabelece-se desde o início, e em diversos pontos, um diálogo entre as peças de Teixeira Gomes e as de Calouste Gulbenkian, ambos ávidos colecionadores de arte e antiguidades, cada um à medida da profundidade dos seus bolsos.

Um diálogo visível entre o busto de romano em bronze comprado por Teixeira Gomes, em Londres, na Christie’s (e hoje pertença do Museu de Portimão) e a escultura, também em bronze, de um dromedário da Argélia, da Coleção do Fundador, do Museu Gulbenkian.

Ou mais à frente, entre duas paisagens, ambas do século XIX, uma de Marselha (da Coleção Gulbenkian), outra adquirida por Teixeira Gomes, mostrando uma «Vista do Porto de Mar com Ruínas».

À seleção de obras do Museu Gulbenkian, juntam-se obras pertencentes às coleções do Museu de Portimão, mas também de colecionadores locais (Álvaro Pires e o casal George Welch e Gita Honwana), sugerindo entre estas um diálogo artístico, estético, cultural e geográfico.

Na inauguração da exposição, ao final da tarde, já noite, do passado sábado, com casa cheia (200 pessoas), participaram ainda a diretora do Museu Calouste Gulbenkian (Penelope Curtis), Nuno Vassalo e Silva, diretor da Fundação Gulbenkian, Ricardo Pereira, responsável pelo Centro de Artes de Sines (que também receberá uma destas exposições), a diretora regional de Cultura Alexandra Gonçalves, bem como muita gente interessada não só de Portimão, como de Faro, Lagos e Lagoa, entre outros lugares.

Entre estes visitantes atentos, esteve ainda a turma de artes da Escola Secundária Manuel Teixeira Gomes, com a sua professora Telma Lança, para talvez se associarem ao pensamento estético e literário do seu patrono e aproveitar esta itinerância para uma autêntica aula ao “vivo e a cores”.

 

Fotos: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

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