«Se eu tivesse lá ficado sozinha, morria de susto»

A noite foi de solidariedade no pavilhão da Escola EB 2,3 de Messines, onde foi acolhida mais de uma centena de pessoas deslocadas

A presidente Rosa Palma, com Deolinda Sequeira e a sobrinha Maria Eugénia

«Se eu tivesse lá ficado sozinha, mesmo que não fosse do fogo ou do fumo, morria de susto». Quem o diz é Deolinda Sequeira, de 78 anos, moradora de Vale Fuzeiros, concelho de Silves, que ontem à tarde, com mais uma centena de pessoas, foi retirada pelas autoridades da sua casa, quando o fogo «já rondava ali à porta».

Hoje de manhã, D. Deolinda e a sobrinha, Maria Eugénia, de 74 anos («somos quase irmãs»), aguardavam no pavilhão da Escola EB 2,3 João de Deus, em São Bartolomeu de Messines, autorização para voltar para casa.

«O meu sobrinho já foi lá levar umas pessoas, mas antes queria ver como está tudo, antes de nos levar de volta», conta a D. Deolinda, bem disposta. O telemóvel toca, a sobrinha Maria Eugénia atende, é o filho a dar boas notícias. «Está tudo bem, não ardeu casa nenhuma, podemos voltar», diz, com um sorriso.

Enquanto espera pela boleia, D. Deolinda conta a odisseia da tarde de ontem, quarta-feira. «Nós estávamos a ver o fogo a vir, já não se via quase nada com o fumo, estava um horror. Vieram uns senhores da Guarda e disseram: “saiam, saiam! Vão para Messines”. O meu sobrinho disse: “mas somos sete pessoas, o carro só leva cinco”. O guarda respondeu: “metam-se os sete no carro, à minha responsabilidade, digam que fui eu que mandei”. E lá viemos nós, cinco adultos e duas crianças».

Ao todo, segundo disse Rosa Palma ao Sul Informação, foram deslocadas ontem 136 pessoas, das quais 106 para Messines e as restantes 30, das zonas de Pinheiro e Garrado e Enxerim, para Silves, que fica mais perto. «A estrada 124 estava cortada, decidimos que era mais prudente trazer as outras pessoas para aqui, para Messines», esclareceu a autarca.

E no pavilhão desportivo da escola, havia «paramédicos, todo o apoio da Segurança Social e muitos, muitos voluntários. As pessoas têm sido extraordinárias!», comentou Rosa Palma, cansada e ainda não tranquila. «Isto hoje está mais calmo, mas ontem de manhã também parecia e depois foi o que se viu…e ainda temos uma frente no Talurdo [interior do concelho]. Eles têm de dominar isto bem, têm de apagar bem, para que não haja os tais reacendimentos».

As mantas, lençóis e almofadas trazidas pelas pessoas solidárias ontem à noite, já estão arrumadas e todos esperam que não voltem a ser necessárias

Voltando à solidariedade, dos voluntários e não só, a presidente da Câmara de Silves fez questão de salientar a «facilidade com que arranjámos colchões, mantas, lençóis, almofadas, para acolher estas mais de 100 pessoas aqui no pavilhão». As refeições foram asseguradas pela própria logística da Câmara, Junta de Freguesia e escola. «Tivemos aqui muitas crianças, muitos idosos, mas tudo correu muito bem».

A D. Deolinda não se cansa de elogiar «a simpatia e o bom acolhimento» que recebeu. «Foram todos muito simpáticos, trataram-nos muito bem». «Aqui esta senhora até teve direito a uma massagem!», comenta Rosa Palma. «Estava cá um fisioterapeuta voluntário e deu-lhe uma massagem que a pôs como nova», brinca. «É verdade, eu estava com uma dor nas costas que não me deixava dormir. Ele deu-me aqui uma massagem e fiquei tão bem!», concorda D. Deolinda.

«Foram todos impecáveis. Deram-nos jantar, deram-nos um chazinho, de manhã, deram o pequeno almoço, dormimos aqui bem», comenta a sobrinha Maria Eugénia, que até só estava em Vale Fuzeiros de férias. Voltando-se para a presidente da Câmara: «gostei muito da hospitalidade, só foi pena ser pelo que foi!».

A autarca Rosa Palma ainda não recuperou da angústia de ontem: «estive ali em sítios com o fogo em cima, com as chamas a tocarem nas casas», comenta, de voz embargada. «Mas, felizmente, que saibamos, não ardeu casa nenhuma», apesar do rasto de destruição que o fogo deixou – e continua a deixar – em toda a serra do concelho de Silves.

A presidente da autarquia recorda as localidades que foram atingidas pelas chamas, numa extensa linha ao longo da EN124, entre Silves e Messines: Enxerim, Pinheiro e Garrado, Pedreira, Barragem, Cumeada, Canhestros, Corgo («aqui esteve muito mal»), Amorosa e Vale Fuzeiros. «É uma zona muito populosa do concelho, mora ali muita gente, e todos estiveram em perigo. Felizmente não aconteceu nada a ninguém!».

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