Lá porque um tribunal americano condenou, não significa que o glifosato cause cancro

A evidência científica que temos aponta que o glifosato não é cancerígeno

O veredito saiu, recentemente: “Monsanto vai ter que pagar 289 milhões de dólares por ter sido provado em tribunal que o glifosato causa cancro“.

No entanto, apesar da condenação, isso não é uma prova inequívoca que o glifosato é cancerígeno. Na realidade, a evidência científica que temos aponta exatamente no sentido oposto.

A maioria das pessoas refere o relatório da IARC quando falamos de glifosato e cancro. É verdade que a IARC considerou o glifosato como um “provável carcinogénio (grupo 2A)”. No entanto, o que habitualmente não é falado é que a IARC tem um sistema de classificação bastante sui generis, que se baseia no Hazard.

Ou seja, a sua avaliação considera apenas se determinada substância causa ou não cancro. Não tem em consideração os níveis de exposição que a população está sujeita. E nesta área, a dose é fundamental para estabelecer o risco de toxicidade.

Após ter sido publicado em 2015, o relatório da IARC foi altamente criticado pela comunidade científica. Aliás, foram publicados vários artigos científicos em que painéis de peritos independentes não validavam as conclusões da IARC, com base na evidência científica existente.

Para além destes painéis, existe mais de uma dezena de agências governamentais que avaliaram o glifosato e não encontraram risco de carcinogenicidade.

Aliás, várias dessas agências voltaram a rever a evidência científica após a publicação do relatório da IARC, tendo chegado à mesma conclusão: o glifosato não é carcinogénico. São agências que pertencem à Organização Mundial de Saúde, Nações Unidas, União Europeia, Estados Unidos, Japão, Coreia do Sul, Austrália, Nova Zelândia, Suiça, França, Alemanha, Canadá, etc.

Destas, apenas a IARC considera o glifosato como um provável carcinogénio. Parece-me implausível que uma empresa consiga subornar todas estas instituições.

Mas não só. Recentemente foi publicado o Agriculture Health Study. O maior estudo epidemiológico realizado nesta área, com duração de 20 anos e mais de 50.000 participantes, tendo concluído que o glifosato era seguro – mesmo para o linfoma não-Hodgkin, doença da qual padece DeWayne Johnson, o jardineiro que ganhou o caso contra a Monsanto.

Neste mesmo estudo foi possível perceber que não havia qualquer aumento do risco de cancro com o aumento da exposição ao glifosato, o que também é um sinal de que esta substância não é cancerígena. Este estudo também destrói o argumento que não é o glifosato, mas os surfactantes utilizados juntamente com o glifosato que causam cancro.

Tal não parece acontecer, dado que este estudo se refere à utilização do glifosato no mundo real, juntamente com os surfactantes.

Outra coisa que é preciso avaliar é o tempo de exposição ao glifosato e o aparecimento do linfoma não-Hodgkin de DeWayne Johnson. O senhor só esteve exposto ao glifosato dois anos antes do diagnóstico. É extremamente improvável que uma exposição tão breve tenha este tipo de consequências nefastas.

Basta pensar que, em média, são necessários mais de 20 anos de exposição continuada ao tabaco desenvolver um cancro do pulmão relacionado com essa exposição. Além disso, se o glifosato provocasse cancro com exposições tão breves, a esta altura já todos tínhamos a certeza das propriedades cancerígenas desta substância.

É comum as pessoas compararem este caso ao da indústria do tabaco e a manipulação da ciência para esconder os seus malefícios. Mas isso também é um erro. A ciência sobre o risco do tabaco estava estabelecida desde 1950.

É verdade que a indústria do tabaco manipulou a opinião pública através da criação da dúvida sobre essa relação. Mas aqui isso não acontece. A ciência não está lá. Não há provas que o glifosato seja cancerígeno.

Para saber mais e ter acesso aos restantes estudos, aconselho a leitura do artigo no blog Scimed.

 

Autor: João Júlio Cerqueira
Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

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