Já se pode percorrer as ruas de Messines para recuperar a memória da arte do latoeiro

O percurso passa por onze ruas de Messines, deixando em cada uma das 14 paragens uma marca de intervenção artística dos “novos” latoeiros

Ao longo de pouco mais de um quilómetro, pelas ruas de São Bartolomeu de Messines, há agora um percurso pedestre que dá a conhecer o ofício do latoeiro.

Este itinerário foi inaugurado na passada sexta-feira ao fim da tarde, pelos presidentes da Câmara de Silves e da Junta de Freguesia de São Bartolomeu de Messines, pelos responsáveis pelo Projeto TASA, que tem promovido a recuperação do ofício da latoaria, pela família do último latoeiro da vila, três dos quatro novos latoeiros e ainda muitas pessoas interessadas.

A acompanhar o desfile pelas ruas, estiveram o grupo Matabicho, com os seus bombos e a gaita de foles, bem como os cantares alentejanos das senhoras do grupo «Flores do Campo» e ainda as jovens ginastas da Casa do Povo.

O itinerário sai do Museu do Trajo e das Tradições e termina na casa onde nasceu João de Deus, situada no núcleo antigo da vila, ao qual se chega atravessando ruelas com sabor medieval, estreitas, entre paredes de cal e escavadas no grês.

Pelo meio, passa-se por onze ruas de Messines e por locais emblemáticos, como o mercado ou a igreja. Na casa onde nasceu João de Deus e que é propriedade da Câmara de Silves, está agora instalada uma oficina onde trabalham os latoeiros formados no ano passado. Mas estes nem sempre lá estão, porque o seu ganha pão (ainda) é outro.

E foram esses novos latoeiros – novos no ofício, porque alguns não o são na idade – que executaram as peças que agora estão postas nas paredes exteriores do museu, de algumas casas, do mercado e de outros edifícios e espaços públicos, marcando os 14 locais por onde o itinerário deve passar. E há por lá, feitas em lata, as figuras de um par de bailarinos, o senhor Raul, um catavento com pássaro, as mãos que criam ou as ferramentas do ofício, entre outras peças, a marcar as 14 paragens do percurso.

Alexandra Santos, a designer que coordena o projeto «A Arte do Latoeiro», explicou ao Sul Informação que, em Maio, numa sessão pública com a participação de duas dezenas de pessoas, foram escolhidos os temas das peças de latoaria para colocar em cada casa, numa iniciativa de design thinking.

«As pessoas deram as suas sugestões quanto aos temas que queriam ver nas paredes. Depois, fomos falar com os donos das casas, para pedirmos autorização para colocar as peças nas suas paredes exteriores. Mas houve outras pessoas que, já o projeto estava em marcha, vieram ter connosco a oferecer as suas casas», acrescentou. É que «as pessoas de Messines têm grande desejo de preservar esta memória, que acarinham. Foram elas que nos pediram mais peças».

«A arte do latoeiro pode ser atual, se estiver adaptada aos novos tempos, com peças inovadoras», salientou Rosa Palma, presidente da Câmara de Silves, referindo-se às ações de formação que já tiveram lugar e cuja segunda fase, para «reforçar as competências dos aprendizes», deverá avançar em breve, como revelou João Ministro, da ProActiveTur, empresa que gere o Projeto TASA.

O percurso sai do pequeno Museu, porque é aí que está «o espólio doado pela família do Senhor Raul» (que na realidade se chamava António Nascimento) e onde, em breve, haverá mesmo «uma sala dedicada ao ofício da latoaria».

E passa pelas casas onde aquele que foi o último latoeiro de Messines teve as suas duas oficinas. Junto a uma delas, o filho do Senhor Raul, Carlos Branco, acompanhado por outros familiares, agradeceu de forma emocionada a homenagem ao seu pai. «Isto é um fiel retrato do meu pai, sem tirar nem pôr», disse. «Foi essa a intenção», respondeu David Fernandes, o artífice responsável.

No Algarve (e também a nível nacional), a arte da latoaria corre o risco de extinção, por causa da desvalorização e desinvestimento que esta atividade sofreu nas últimas décadas, o que impediu a renovação de artesãos e sua capacitação para se adaptar aos tempos atuais.

Em 2017, o Projecto TASA/Proactivetur, numa parceria com a Câmara Municipal de Silves e apoio da EDP (Projeto “A arte do latoeiro” – Programa Tradições), conseguiu formar quatro novos latoeiros num modelo de transmissão de saberes mestre-aprendiz.

Foi criada uma linha de produtos de latoaria contemporânea. Realizaram-se workshops com escolas e comunidade, dando a oportunidade para experimentar os materiais e as técnicas do latoeiro.

Foi ainda realizado um vídeo, que documenta o processo em que os aprendizes aprendem com o mestre, replicando o que era a prática habitual na preparação de novos artífices e artesãos.

Na segunda fase, a decorrer até Setembro próximo, a intervenção é consolidada através do reforço da capacitação dos novos latoeiros, do apoio à sustentabilidade da atividade, e do envolvimento mais ativo e direto da comunidade com o propósito de tornar a latoaria uma tradição viva, que a vila vive, através da criação deste percurso.

O Projeto TASA é uma iniciativa da CCDR Algarve, com o objetivo de afirmar o artesanato como uma profissão com futuro no Algarve. O projeto é gerido pela Proactivetur desde 2013, no âmbito de protocolo de colaboração entre ambas entidades, isento de custos para a CCDR Algarve.

 

Fotos: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

 

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