“Primeiro ministro” Fontes Pereira de Melo visitou Albufeira, Lagoa e Portimão em Junho de 1874

Depois de uma receção pouco calorosa em Faro, o presidente do Conselho de Ministros e a sua comitiva (autoridades militares, […]

Depois de uma receção pouco calorosa em Faro, o presidente do Conselho de Ministros e a sua comitiva (autoridades militares, governador civil de Faro, etc.) continuaram o seu périplo pelo Algarve. Nesse intuito, saíram de Faro pelas 7h30 da manhã do dia 28 de Junho de 1874, em direção à então Vila Nova de Portimão.

Em São João da Venda, era o chefe de governo aguardado pela Câmara de Loulé e demais autoridades daquele concelho, que o acompanharam até às Ferreiras.

Seguiu-se uma breve visita a Albufeira, onde o administrador do concelho, Sr. Mendonça, ofereceu um lanche, dando a vila, segundo o jornal “Gazeta do Algarve”, “demonstrações inequívocas de muito jubilo”.

A viagem prosseguiu, recebendo mais à frente, na estrada, os cumprimentos da Câmara de Silves e restantes autoridades concelhias.

Já em Lagoa, era esperado pelo presidente da Câmara, administrador do Concelho e juiz, bem como pelos lagoenses, estralejando nos ares à sua chegada inúmeros foguetes.

Por essa altura, já Portimão rejubilava. Segundo o semanário portimonense “Correio do Meio-Dia”, às 16h00, três bandas filarmónicas percorriam as ruas de Portimão em direção ao cais.

Neste, vários barcos, “galhardamente embandeirados”, aguardavam a Câmara Municipal, representantes de todas as corporações oficiais e civis, as bandas, o visconde Bívar e algum povo. Feito o embarque, dirigiram-se para Mexilhoeira da Carregação, onde, às 18h00, era esperado Fontes Pereira de Melo. Para ali haviam ainda convergido muitas pessoas de Silves, Ferragudo, etc., com o objetivo de avistarem tão ilustre personalidade.

Note-se que o atravessamento do Arade era feito exclusivamente de barco, já que, embora tivesse avançado a construção da estrada macadamizada entre Lagos e Vila Real de Santo António, continuava a faltar a ponte em Portimão, o que, por via terrestre, implicava um rodeio por Silves.

A vinda do chefe de governo ao Algarve terá tido também o objetivo de solenizar o lançamento da primeira pedra daquela importante infraestrutura. Para o jornal “Gazeta do Algarve”, ela constituía o “primeiro melhoramento, com que tem sido dotado o Algarve”. Tratava-se de uma obra imponente e essencial, numa região desde sempre olvidada pelos governantes. Com 332 metros de comprimento e 6 de largura, a sua construção ficou a cargo da empresa francesa Fives Lille, representada por M. Labille, vindo a constituir, durante alguns anos, a maior ponte erguida a sul do rio Tejo.

Mas regressemos à Mexilhoeirinha, onde o presidente do Conselho de Ministros chegou às 18h30, acompanhado por cerca de 20 trens. Assinalaram o momento da sua chegada várias girândolas de foguetes e o hino nacional (então o da Carta Constitucional).

Mais de 11 horas de viagem para percorrer pouco mais de 60 quilómetros, entre Faro e a margem esquerda do Arade. É certo que houve uma breve paragem em Albufeira, mesmo assim a viagem, de carroça puxada a cavalos, por uma estrada poeirenta, terá sido extenuante.

O visconde de Bívar, de quem Fontes Pereira de Melo era amigo pessoal, apresentou ao chefe de Governo as autoridades ali presentes, como o presidente da Câmara, Frederico da Paz Mendes.

Segundo o “Diario Illustrado” o autarca, “num breve discurso demonstrou a alegria com que aquelle município se honrava da sua visita (…)”, ao que o presidente do Conselho agradeceu.

Frederico Mendes ofereceu depois um “elegante escaler dourado e preparado para esse fim, pelo sr. fiscal da alfandega J. Biker tripulado por 8 remadores bem uniformisados”, para transportar o insigne hóspede até Portimão.

Terminadas as apresentações, fez-se o embarque, tendo cruzado o rio à volta de 100 barcas. Sobre a travessia, escreveu o “Gazeta do Algarve”: “dos barcos, surtos no rio, embandeirados todos desde o mais pequeno até ao maior, saíam girândolas de foguetes á medida que s. ex.ª passava”.

A filarmónica Fraldas executou, durante a viagem, vários hinos, sendo que, no meio do rio, aguardava uma outra banda, a dos Moleiros, ambas de Silves, que se juntou à comitiva.

Às 19h00, Fontes Pereira de Melo entrava triunfalmente em Portimão. A filarmónica da vila encontrava-se no coreto, no centro do cais, executando um hino. Numerosa multidão aguardava aquele momento, acompanhando depois o ministro pelo aterro, rua dos Quartéis, da Estalagem Velha, até ao largo do Sapal, hospedando-se no palácio do visconde de Bívar (hoje o edifício da Câmara Municipal).

Segundo o já citado jornal portimonense “Correio do Meio Dia”, Fontes Pereira de Melo seguia na frente, “vestido à paisana e bonet de engenheiros, dando à sua direita o visconde de Bívar e à esquerda o presidente da câmara municipal”, a que se seguiam o governador civil, o chefe de Estado Maior, chefe do Departamento Marítimo, comandante da Esquadrilha, diretor da Alfândega de Faro, entre outras individualidades.

A comitiva separou-se por diferentes habitações onde se hospedaram. As ruas haviam sido propositadamente decoradas, desde logo areadas de vermelho, depois encontravam-se ornamentadas com postes azuis e brancos (as cores da Monarquia Constitucional), em cujas extremidades flutuavam galhardetes, atravessando em alguns pontos bandeiras.

Das janelas, apinhadas, assistiam ao cortejo damas elegantemente trajadas. Nos edifícios consulares, foram hasteadas as suas bandeiras e estandartes, assim como a casa do Compromisso Marítimo, aquartelamento militar, coreto de música (no aterro) e hospedaria francesa, dando um ar ainda mais festivo à localidade.

No largo do Sapal, erguia-se um majestoso arco, pintado com uma balaustrada em circunferência, construído pela Associação dos Artistas, a expensas da edilidade portimonense. No lado poente, exibia a seguinte dedicatória “- A A. M. F. Pereira de Mello – e no lado nascente – A Classe artística”. Arco que era ladeado por dois pavilhões, que ostentavam bandeiras das diferentes nações da Europa, bem como por dois coretos, onde as filarmónicas de Silves executaram alternadamente peças do seu reportório, entre as 21:30 e as 3:00 da madrugada.

Também no Cais se erguia um outro pórtico, este nas palavras do “Gazeta do Algarve”, “notável pelo material de que era feito, como pela disposição, elegância e significação que tinha”.

Na verdade, o mesmo havia sido erigido espontaneamente pelos técnicos da construção da ponte (as fundações haviam começado nos princípios de Junho) e com as diferentes peças a ela destinadas.

Assim, erguia-se sobre as colunas de ferro, que iriam constituir os sustentáculos daquela obra, sendo enfeitado, à maneira de grinaldas, com grossas correntes e troféus armados com os vários aparelhos e ferramentas, vistosamente enfeitado por galhardetes tricolores e nacionais, bem como coroas de buxo e flores. O arco era encimado pelas bandeiras nacional e francesa, que desfraldavam ao vento.

O jantar, no palácio Bívar, com toda a comitiva, começou às 20h30, abrilhantado pela banda de Portimão. Cá fora, vários edifícios encontravam-se iluminados, desde logo a Câmara Municipal e o aquartelamento militar, com balões de cores, produzindo magnífico efeito, depois as casas do governador da praça, secção de Obras Públicas, Compromisso Marítimo, Alfândega, Estação Telegráfica, hospedaria e o arco do cais, com balões tricolores.

As ruas mantiveram-se repletas de populares, não só portimonenses como também das povoações vizinhas, que ali acorreram para presenciarem tão desusados festejos, naquela noite de São Pedro.

Às 23h00, começaram a entrar no palácio Bívar os convidados para o baile, que se prolongou até às 5h00 da madrugada, tendo o ilustre visitante dançado com a viscondessa D. Isabel Bívar, D. Antónia Moreira e D. Maria Franco. Antes do término da “soirée” foi servido um chá e bufete.

No dia 29, o chefe de governo recebeu os cumprimentos das diferentes repartições oficiais de Portimão, Câmara Municipal e de algumas corporações artísticas, saindo às 16:00 com o presidente da Câmara, visconde Bívar, comandante militar e demais comitiva, para visitar diferentes espaços daquela urbe.

Assim, vistoriou o aquartelamento militar, prometendo fazer em breve alguns reparos que o mesmo carecia. Seguiu-se o local de construção da ponte, onde os engenheiros franceses, o diretor das Obras Públicas, entre outros o aguardavam. A visita ao estaleiro foi acompanhada por uma banda filarmónica que executou o hino nacional.

Após o que se dirigiu para o edifício provisório da Alfândega. Constrangido com o mesmo, assegurou que assim que chegasse a Lisboa envidaria esforços para a construção de uma casa própria. Visitou depois o Compromisso Marítimo e por fim a Câmara Municipal, agradecendo ao município as “demonstrações e obséquios que lhe dispensou durante a sua visita a Portimão”.

Cerca das 18h00, Fontes Pereira de Melo e o séquito que o acompanhava partiam para o derradeiro destino da sua digressão pelo Algarve, a cidade de Lagos. À saída de Portimão as duas filarmónicas, que entre as 14h00 e as 16h00 haviam executado algumas peças nos coretos junto ao palácio Bívar, formaram alas para a passagem do chefe de Governo e sua comitiva. Portimão fechava assim, com chave de ouro, a visita de Fontes Pereira de Melo.

(Continua)

 

Nota: As imagens utilizadas são meramente ilustrativas e correspondem a postais ilustrados.
Nas transcrições, manteve-se a ortografia da época.

 

 

Aurélio Nuno Cabrita

Autor: Aurélio Nuno Cabrita é engenheiro de ambiente e investigador de história local e regional, bem como colaborador habitual do Sul Informação

 

 

 

 

 

Artigos anteriores:

Em Junho de 1874, “primeiro ministro” Fontes Pereira de Melo visitou Alentejo e Algarve

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