Investigadores do CCMar salvam corais arrancados pela tempestade e vão replantá-los

As tempestades que atingiram a região nas primeiras semanas de Março deixaram muitas marcas ao longo da costa algarvia, mas […]

Foto Márcio Coelho CCMar

As tempestades que atingiram a região nas primeiras semanas de Março deixaram muitas marcas ao longo da costa algarvia, mas também causaram estragos no fundo do mar. Corais que deram à costa na Praia de Santa Eulália, em Albufeira, foram recolhidos por uma equipa do Centro de Ciências do Mar do Algarve (CCMar), que está a preservá-los, tendo em vista a sua replantação.

Ao mesmo tempo que procura salvar cerca de 200 colónias de gorgónias, um tipo de coral que se pode encontrar ao longo de toda a costa algarvia, o CCMar pede a ajuda da população para reportar avistamentos destes ou de outros organismos marinhos que deem à costa.

Para os corais que foram salvos, o seu herói tem um nome: Márcio Coelho. Este investigador de pós-doutoramento do centro de investigação associado à Universidade do Algarve, alertado por cidadãos, recolheu as colónias que estavam na praia e está a mantê-las em aquários, na estação experimental do Ramalhete, em Faro.

«O Algarve foi fustigado pelas tempestades Ema e Félix, com a agitação marítima a atingir uma intensidade que não se vê todos os anos. Isso levou a que, durante e após os temporais, cidadãos tenham encontrado gorgónias, um tipo de coral, na Praia de Santa Eulália e chamaram-me a atenção para o fenómeno», contou Márcio Coelho, ao Sul Informação.

O jovem biólogo marinho, que está a trabalhar na equipa da professora Ester Serrão, num projeto apoiado pela Fundação Pew, dos Estados Unidos da América (EUA), foi para o terreno e, além de documentar o evento de mortalidade, arregaçou as mangas e levou consigo todos os indivíduos que ainda estavam vivos.

«Queríamos, se possível, recuperar os corais e mantê-los em tanques, até termos oportunidade de os replantar no seu habitat natural», explicou.

Márcio Coelho

O salvamento dos corais, a maioria dos quais das espécies Leptogorgia sarmentosa e Leptogorgia lusitanica, mas também da espécie Eunicella verrucosa, acaba por ser a cereja no topo do bolo deste projeto, cujo objetivo principal é aprofundar o conhecimento sobre estes organismos.

«Logo após o mestrado trabalhei aqui no CCMar, com a professora Ester Serrão, durante um ano e meio. Entretanto, fiz o doutoramento nos EUA e voltei agora para me juntar a este projeto das gorgónias e tentar ajudar à recuperação e à melhoria da informação biológica que temos destas espécies», enquadrou Márcio Coelho.

Para isso, os investigadores do centro de investigação algarvio gostariam de contar com a ajuda da população. «Infelizmente não temos pessoal nem fundos para cobrir toda a costa. E é sempre interessante envolver a comunidade, para que, por um lado, percebam a importância do organismo para o ecossistema marinho, mas também a sua importância em termos económicos», disse, numa conversa com o Sul Informação.

Este desafio que é lançado a todos os cidadãos vai ao encontro de «um dos grandes objetivos desta campanha, que passa também por entusiasmar o público pela conservação destes organismos e da biodiversidade marinha em geral».

A comunidade é incentivada a participar na monitorização de florestas marinhas, que incluem corais como as gorgónias, através da plataforma internacional Marine Forests. Aos cidadãos também é pedido que notifiquem o CCMar sempre que virem corais ou outros organismos marinhos na praia, através do email [email protected].

Foto Márcio Coelho CCMar

Ao mesmo tempo, os investigadores estão determinados em devolver ao seu habitat natural o máximo de colónias recolhidas possível. A ideia é fazê-lo «já na próxima semana. Está tudo dependente do estado do Mar, bem como da disponibilidade dos membros do Grupo de Mergulho Científico do CCMar, pois esta fase necessitará de muito planeamento e de mãos para ajudar».

Manter gorgónias em aquários não é tarefa fácil, daí que haja alguma pressa em replantar os corais.

«Infelizmente, nem todas as espécies que ocorrem aqui na nossa costa se dão muito bem em aquário. Pelo menos dois dos tipos que nós temos agora, não é comum ter-se em tanques, pelo menos por muito tempo. Também é certo que não houve muita gente a tentar», disse ao nosso jornal Márcio Coelho.

«As que temos, não estão nas condições ideais, mas temos esperança que se aguentem. Nós recolhemos cerca de 400 indivíduos e, neste momento, temos cerca de 200, o resto não sobreviveu. Provavelmente tínhamos uma densidade muito grande dentro dos tanques, pois eram muitas colónias, mas estas estão-se a aguentar melhor e esperemos que consigamos replantá-las, o mais rapidamente possível», acrescentou.

O local para devolver estes animais, que criam uma espécie de floresta subaquática, já foi escolhido. «Estamos a pensar fazer a replantação na zona do Porto de Sagres, que é fácil de aceder e é um local onde se forma um recanto, pelo que as correntes não são uma preocupação grande. Este trabalho não se fará num dia e é mais prático desta forma, até porque não sabemos exatamente qual a origem dos indivíduos que deram à costa e esta espécie também ocorre em Sagres».

Nesta operação, serão testados diversos métodos de replantação de corais. «Geralmente, as gorgónias podem ser encontradas em zonas rochosas, abaixo dos 15 metros de profundidade. Na literatura, o método mais eficiente para as replantar é fazer um pequeno buraco na rocha, tirar um pouco de tecido da base e, com uma epoxi não tóxico que se usa para esse fim, fixa-se lá o coral», descreveu.

Foto Márcio Coelho CCMar

Idealmente, isto deve ser feito «num dia com pouca agitação marítima, pois, quanto maior o fragmento, mais vibração haverá e a probabilidade do epoxi secar a tempo é menor. Este é o processo menos intrusivo, mas também vamos testar outros métodos, que poderão ser mais eficientes, no que respeita ao tempo de mergulho».

«A nossa ideia é preservar as colónias que temos. Algumas estão boas, outras têm partes que não estão em grandes condições. Vamos fragmentar as partes saudáveis e replantá-las», disse.

O investigador explicou ao Sul Informação que os corais, «em geral, são aquilo que nós designamos por engenheiros de ecossistemas. O que eles fazem, essencialmente, é modificar o ambiente físico. Um bom exemplo são as correntes marinhas: reduzem a sua intensidade, criam outro tipo de correntes, circulares, e criam condições para outros organismos».

Também servem como maternidade e refúgio para diversas espécies de peixes. «É frequente ver os juvenis a procurar proteção dos predadores junto das colónias de corais», exemplificou.

«A grande maioria dos corais são organismos coloniais. A unidade é aquilo que chamamos de pólipos, que funcionalmente são independentes – alimentam-se sozinhos, reproduzem-se sozinhos. Mas cada colónia, ou indivíduo, tem milhares ou milhões de pólipos, mas que estão todos integrados», segundo o investigador do CCMar. Isso permite a uma secção que se separar da colónia «curar a lesão, sobreviver e manter-se».

Estimar a quantidade de colónias destruídas pelas últimas grandes tempestades, bem como o local de onde vêm os indivíduos recolhidos, não é fácil. «É sempre bom tentar documentar ao máximo estes fenómenos, pelo que estamos a pedir a ajuda dos cidadãos, para que documentem corais que encontrarem noutros locais, de modo a termos uma ideia mais geral», reforçou Márcio Coelho.

 

Fotos: Márcio Coelho|CCMar

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