Património geológico do Alentejo é uma “mina” por explorar

O chão que pisamos no Alentejo, desde a planície a perder de vista aos alcantilados rochosos da Serra de S. […]

Pulo do Lobo, no Guadiana

O chão que pisamos no Alentejo, desde a planície a perder de vista aos alcantilados rochosos da Serra de S. Mamede, não foi sempre como hoje se nos apresenta. Mudou radicalmente no decorrer de uma velhíssima história geológica.

Com as suas planuras, vales e serranias, a paisagem alentejana, bem como a de todo o interior do País e da Península Ibérica, é o que resta de uma grande cadeia montanhosa, com mais de trezentos milhões de anos, que percorreu o que é atualmente o sul da Europa e o noroeste africano.

Quase completamente arrasada pela erosão no decurso dos tempos que se lhe seguiram, pôs a descoberto toda a complexidade das suas entranhas, hoje esventradas, de que fazem parte diversos tipos de rochas geradas em profundidade, a partir de magmas incandescentes, e muitos outros, representados por rochas formadas nos mais diversos ambientes, desde desertos áridos e florestas tropicais a mares quentes e frios, litorais e profundos, muitas delas transformadas ao longo dessa imensidade de tempo.

Esta grande cadeia de montanhas resultou, por seu turno, do enrugamento e elevação de milhares de metros de espessura das respetivas camadas rochosas, a maior parte das quais acumuladas no fundo de um grande oceano que aqui existiu há mais de 600 milhões de anos e que se fechou na altura, à semelhança do que está a acontecer ao Mediterrâneo, a fechar, com a consequente elevação dos Alpes e das montanhas a eles associadas.

Temos, pois, aqui documentos de uma longa e complexa história que sabemos e podemos contar.

Dos antiquíssimos terrenos da região de Arronches-Campo Maior, terras emersas ao tempo desse oceano, às atuais planícies aluviais do Sado, com escassos milhares de anos, estão representadas, nesta que é a maior província de Portugal, formações geológicas de todas as eras da história da Terra.

Os mármores de Estremoz-Vila Viçosa, Viana e Trigaches, a Faixa Piritosa, em especial, em Aljustrel e na região de Neves-Corvo (Castro Verde-Almodôvar), importantes reservas de cobre, estanho, zinco e chumbo, e, ainda, a perspetiva animadora de exploração do ouro em Montemor-o-Novo, constituem georrecursos mineiros da maior importância para o país.

Minas de São Domingos, em Mértola

Mas, para além deste valioso património económico no domínio da atividade extrativa, são muitas as ocorrências geológicas espalhadas por este “Aquém-Tejo” com valor como georrecursos culturais, classificáveis como monumentos naturais, na medida em que são documentos decifráveis, tantas vezes grandiosos e espetaculares, dos mais variados episódios de uma história muito antiga, não só local e regional, como nacional e, por vezes, global.

Com dimensões que vão de um simples afloramento rochoso, a um sítio ou a toda uma paisagem, tais monumentos continuam à espera de ser convenientemente salvaguardados antes que o progresso civilizacional, o betão e o asfalto, os engulam e destruam para todo o sempre.

Numa época em que os Parques Geológicos e o Turismo de Natureza proliferam por todos os países com preocupações ambientais, urge localizá-los, valorizá-los e dotá-los de condições de visibilidade para fruição por parte do grande público, permitindo-lhe conhecer a sua história mais antiga e, ainda, uma melhor integração no todo natural.

Sem esquecer uma parte importante do Geoparque Naturtejo (uma honrosa realidade no nosso território), incluem-se, entre as mais conhecidas ocorrências, algumas pedreiras e minas desativadas ou esgotadas, como as do Lousal e São Domingos, que, para além dos aspetos geológicos, guardam testemunhos relacionáveis com a vida das respetivas populações, numa espécie de arqueologia industrial do maior interesse histórico, etnográfico e sociológico.

O Alto de São Bento, em Évora, reúne condições para se transformar num Museu do Granito, do mesmo modo que uma, entre as muitas pedreiras de mármore de Estremoz-Vila Viçosa, poderá vir a constituir um outro museu ligado a esta exploração que tem sido, sem dúvida, a mais rendosa de todas no setor da economia mineira nacional.

Outros sítios como as caleiras de Escusa (Portalegre), Marvão, Castelo de Vide, Monsaraz, Pulo do Lobo, etc., etc., reúnem condições excecionais em termos de bens patrimoniais da Natureza.

Todos estes monumentos naturais podem vir a constituir pólos de um Exomuseu da Natureza, definido como uma estrutura dispersa à escala da província, coordenada a partir de um núcleo central a criar, por exemplo, numa Universidade ou numa Fundação, segundo moldes a estabelecer.

 

Autor: A.M. Galopim de Carvalho
Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

Comentários

pub