Se não servisse para mais nada, o livro sobre a Igreja Matriz de Portimão que Nuno Campos Inácio publicou há dias já teria tido, pelo menos, uma boa consequência: serviu para devolver àquele templo, sob a forma digitalizada, os registos paroquiais e outros documentos que, em 1911, foram «nacionalizados e retirados da igreja».
Para isso, no final da sessão de lançamento do livro, que, a 10 de Dezembro, encheu aquela igreja, o investigador portimonense entregou, ao Padre Mário de Sousa, pároco da Matriz de Portimão, uma pen drive contendo documentos digitalizados que estavam entre a Torre do Tombo, a Academia Real de Ciências, o Arquivo Distrital, a Biblioteca da Universidade de Coimbra e o Centro de Documentação do Museu de Portimão.
«Estes documentos são da Igreja por direito próprio, pelo que hoje, ainda que em formato digital, regressam ao local de onde nunca deveriam ter saído», disse.
No disco externo que Nuno Inácio entregou ao Padre Mário, estavam todos os registos paroquiais da Matriz realizados entre 1575 e 1905, a relação dos documentos da Casa de Abrantes de 1463 a 1596, a cópia da escritura de fundação da Capela do Santíssimo Sacramento de 1605, o Alvará de D. Filipe III de 1624, as escrituras da realização dos retábulos em 1724, a Memória Paroquial de 1730, a Memória Paroquial de 1758 e outros documentos soltos sobre a igreja e a confraria.
Ao todo, sublinhou Nuno Campos Inácio, são 16.536 documentos, que deverão ser reunidos à documentação que a Igreja de Portimão já possui, para que possa «criar, no seu Centro Paroquial, um espaço de arquivo digital, uma biblioteca digital, para que os estudantes e investigadores possam realizar trabalhos sobre a Igreja Matriz com maior facilidade, enriquecendo desse modo o conhecimento coletivo».
Ou seja, mais do que um ponto de chegada, o lançamento da obra «Igreja Matriz de Portimão – 550 Anos de História (1467-2017) pode ser um ponto de partida.
«Todo o conhecimento é estéril, se não for partilhado. É a partilha do conhecimento que lhe dá vida, que o engrandece e , por vezes, o corrige», disse o investigador. «Se os documentos por si só não são nada, também os arquivos não passam de meros depósitos de papel, se a informação que contêm não for devidamente catalogada e disponibilizada a quem quer ter conhecimento, não por capricho individual, mas para partilhá-lo».
Esses documentos, bem como o acervo documental que a igreja ainda guardava e que o Padre Mário mandou digitalizar para facilitar a tarefa ao investigador, que assim os pôde consultar «a partir de casa», foram a base para a escrita do livro de 324 páginas, publicado agora pela Arandis, a editora lançada em 2012 com Sérgio Brito e Fernando Lobo.
E que história conta esta obra? Conta a história do grupo de portimonenses anónimos, cujo nome a História não registou, que, «há 550 anos, solicitou ao então Bispo do Algarve autorização para a construção da sua igreja», o que veio a acontecer.
Na edificação, participou a família Castelo Branco, senhores e depois condes de Vila Nova de Portimão. Mas, salientou o investigador, «não foi pela vontade de um homem, ou de uma família» que a igreja foi edificada.
Foi pela vontade desse mesmo «povo anónimo, comunidade de cidadãos crentes», e que, «550 anos depois, contribuiu voluntária e anonimamente para que a igreja Matriz fosse recuperada», sublinhou ainda.
«Foi a Fé que uniu as gentes, geração após geração, fazendo-os proteger a sua Igreja dos ataques dos corsos da pirataria turca e argelina, do século XVI, dos ataques dos ingleses e holandeses do século XVII, das Invasões Francesas no início do século XIX, do anticlericalismo Liberal, do fanatismo da nacionalização republicana e do movimento marxista do pós-25 de Abril», acrescentou Nuno Campos Inácio.
«Quão importante seria que alguns pseudo cultos da praça europeia pudessem ouvir este autor, para poderem compreender que qualquer ataque ao Cristianismo é um ataque ao povo e à raiz europeia», sublinhou o Cónego Carlos César Chantre, vigário-geral da diocese do Algarve, presente no lançamento da obra.
Os 22 capítulos do livro abordam temas amplos, desde a origem do Cristianismo na Hispânia, até à Igreja Matriz na atualidade, passando pela caracterização do templo, pela vida religiosa portimonense século a século, as Visitações, as Capelas, Confrarias e Irmandades, a Arte Sacra, estatística, relação de sacerdotes e o riquíssimo Tombo da Igreja Matriz.
Isilda Gomes, presidente da Câmara de Portimão, também presente no lançamento, garantiu que vai «ler esta obra com muita atenção». «Se não conhecemos, não podemos gostar, mas quando conhecemos melhor, passamos a gostar mais», salientou a autarca, acrescentando que em Portimão «não há assim tantos edifícios que mereçam este estudo».
O padre Mário de Sousa, por seu lado, sublinhou a responsabilidade de deixar às gerações vindouras o conhecimento e o apreço por aquela que é a «casa da verdadeira Igreja», «aquela feita das pedras vivas».
Todo o produto da venda dos livros reverte para a Paróquia de Nossa Senhora da Conceição – Matriz de Portimão, tendo o autor elaborado a obra graciosamente e a Arandis Editora, que a publica, abdicado da sua margem de lucro. O livro custa 20 euros e está à venda na Igreja Matriz de Portimão.
O lançamento da obra começou com um momento musical a cargo da Orquestra Bach, do Conservatório de Portimão Joly Braga Santos, na qual uma das jovens violinistas é a filha do autor.
Fotos: Elisabete Rodrigues|Sul Informação
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