Algarve – Reflexões pós Autárquicas

No rescaldo de mais uma ida às urnas no passado dia 1 de Outubro, desta feita para a eleição dos […]

No rescaldo de mais uma ida às urnas no passado dia 1 de Outubro, desta feita para a eleição dos representantes locais, e enquanto observador e participante da realidade política, social e económica do distrito onde resido há mais de 15 anos, não podia de deixar de estar atento a alguns sinais inequívocos e preocupantes que resultaram dos votos atribuídos (ou não) pelos cidadãos algarvios.

Em primeiro lugar, convém recordar que a eleição autárquica é aquela, de entre todas a que regularmente somos chamados a participar, que terá um carácter de maior proximidade, pelas implicações na nossa rotina diária que as opções políticas e concretizações práticas nos podem afetar.

Seria, pois, de esperar que os cidadãos em geral tivessem absoluto interesse, participação e mobilização num ato eleitoral autárquico, até superior ao interesse por umas eleições de carácter nacional (sem falar nas europeias), que, apesar das macro implicações na vida dos portugueses, não se refletem com a mesma proximidade temporal e física dos que as realizações locais.

Pois, no Algarve, contrariamente à generalidade do país, acontece exatamente o oposto! Traduzindo em números, a abstenção geral no Algarve nestas Eleições Autárquicas situou-se nos 52,56%, enquanto nas Legislativas de 2015 se situou nos 49%. No âmbito nacional, o nível de abstenção situou-se nestas Autárquicas em 45%.

Mais grave, muito mais grave, sucedeu em concelhos como Portimão ou Albufeira, onde as taxas de abstenção nestas Eleições Autárquicas se situaram respetivamente em 59% e 61% (!!!!), enquanto na anterior consulta para as Legislativas, em 2015, se situaram respetivamente em 49% e 55%, ainda assim valores descabidos e fora do admissível, num sistema que se admite de democracia consolidada.

Por outro lado, contrariando esta tendência e ainda no Algarve, registaram-se valores da abstenção em Vila do Bispo, Monchique ou Alcoutim de 35%, 28% e 23%.

Como justificar estas elevadíssimas taxas de abstenção nalguns dos concelhos mais populosos, economicamente mais fortes, de maior literacia?

Serão estes valores – dos maiores a nível nacional – reais ou resultarão da falta de atualização dos respetivos cadernos eleitorais?

Estando corretos, porquê este alheamento dos seus cidadãos? Porque confiam cegamente nos candidatos a governantes? Ou porque não confiam em nenhum deles e de nada adianta a sua escolha?

Muitas perguntas sem resposta evidente e que deveriam obrigar os responsáveis políticos a uma profunda reflexão, por forma a credibilizar a sua eleição futura e assegurar a efetiva representação das suas populações.

Escolhidos os representantes em cada município, aguarda-se agora a escolha dos seus representantes na Comunidade Intermunicipal do Algarve. Que precisa de uma vez por todas de ter uma voz única, forte e de amplo consenso no que respeita a garantir um conjunto de exigências absolutamente necessárias para o desenvolvimento da região.

Não pode servir de pretexto para o Algarve continuar sem interlocutores e lóbis em Lisboa, a histórica espera por uma regionalização que tarda ou nunca virá.

Isto a propósito das notícias que vão surgindo relativas aos novos grandes investimentos que o governo nacional se encontra a discutir e que pensa levar a discussão nos próximos meses, cujo programa será denominado de Portugal 2030.

Pois o périplo para consensualizar estes investimentos que o governo se encontra a agendar passa por diversos pontos do país, do Norte até…Évora.

Pode ser circunstancial, mas os sinais não são os melhores para uma região que ainda necessita de grandes investimentos para agarrar o seu futuro. Como diz o povo, “quem não aparece, esquece”. Quem não grita a uma só voz, com um Caderno de Encargos sólido, estruturado e bem fundamentado, arrisca-se a nem ser ouvido.

E quando hoje os responsáveis partidários do Algarve nem se entendem na simples questão das portagens na A22, reinvidicando uma posição comum, de bom senso, insistindo uns pelo silêncio, quando da mesma cor do governo nacional e outros exigindo a sua total (!) suspensão, quando na oposição nacional, os sinais não são encorajadores.

O Algarve não pode deixar de ser ouvido e consultado, não pode deixar passar este comboio do desenvolvimento!

Temas como, por exemplo, as ligações ferroviárias a Espanha (apanhar o comboio em Lagos e sair em Madrid não pode continuar a ser ficção cientifica) e ao Aeroporto de Faro, o Hospital Central, uma grande central de dessalinização que garanta água potável para sempre (e nunca estivemos tão perto de poder passar por grandes problemas nesta questão) têm que ser desde já assumidos e integrados na agenda para 2030.

Os algarvios não perdoariam aos seus responsáveis políticos se estes continuassem a olhar para os seus umbigos, os seus interesses partidários e para a manutenção dos seus séquitos e não para o futuro da sua região.

A continuar assim, os algarvios precisam de criar um movimento de cidadania de carácter político e interventivo, que efetivamente pense na sua região e em exclusivo na defesa dos seus cidadãos, ou este fantástico pedaço do país continuará a ser apenas utilizado como estação de veraneio de alguns e contribuinte para o fortalecimento do PIB nacional, esquecendo quem por cá vive e pretende deixar um legado de prosperidade às próximas gerações.

 

Autor: Ricardo Palet, Cidadão do Algarve

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