Espetáculo em Tavira promove a descoberta da única “heterónima” de Fernando Pessoa

O seu nome era Maria José. Tinha 19 anos e era corcunda e feia. Certo dia, apaixonou-se perdidamente por António […]

O seu nome era Maria José. Tinha 19 anos e era corcunda e feia. Certo dia, apaixonou-se perdidamente por António e gostava de ficar à janela a ver o seu amor passar.  Escreveu-lhe uma carta.

A história não é de filme: é de Fernando Pessoa. Maria José é a única “heterónima” conhecida do poeta e até vai à “Festa dos Anos de Álvaro de Campos”, outro dos heterónimos pessoanos, já nos dias 25 e 26 de Novembro, em Tavira. 

Neste caso, a organizadora da festa, em jeito de homenagem a Álvaro de Campos, é Tela Leão, presidente da associação “Partilha Alternativa”. A decisão de incluir Maria José no programa desta iniciativa foi «tomada em cima da hora».

«Tenho estado o tempo todo “mergulhada” em Pessoa. Descobri a existência desta “heterónima” em pesquisas e, mal vi, arregalei o olho. Afinal, Fernando Pessoa também foi mulher», conta, entre risos, ao Sul Informação.

Certo é que a existência desta Maria José é desconhecida da maior parte das pessoas, uma vez que os principais heterónimos de Pessoa são Álvaro de Campos, Alberto Caeiro e Ricardo Reis.

«Fui perguntando às pessoas e descobri que muita gente não sabe da sua existência», diz Tela. Tal como aconteceu com a programadora cultural, «muita gente arregala o olho quando falo disso», conta.

Então, nada melhor do que pegar numa iniciativa que já é pessoana por si só e juntar-lhe ainda mais um condimento. O que será feito nos dias 25 e 26, às 21h30, «ainda não está totalmente decidido», mas deverá ser uma «performance encenada com a atriz Susana Nunes».

A ideia é esta atriz «estar numa janela, no centro histórico de Tavira» a interpretar a carta de amor escrita por Maria José, que é «de uma delicadeza tão bonita».

Escreve Fernando Pessoa, ou melhor Maria José, na tal carta: «o senhor não sabe quem eu sou, isto é, sabe, mas não sabe a valer. Tem-me visto à janela quando o senhor passa para a oficina e eu olho para si, porque o espero a chegar, e sei a hora que o senhor chega. Deve sempre ter pensado sem importância na corcunda do primeiro andar da casa amarela, mas eu não penso senão em si».

Tela Leão

Esta performance, onde será interpretada a carta, será um «primeiro ensaio para uma ideia a desenvolver melhor no ano que vem», revela Tela Leão.

Mas nem só de Maria José se fará esta “Festa dos Anos de Álvaro de Campos”, heterónimo nascido em Tavira a 15 de Outubro de 1890.

O programa inclui “Noites de vinho e poesia”, no restaurante Álvaro de Campos, no dia 7 de Outubro, às 20h00, uma exposição de documentos da família Pessoa recém encontrados, no dia 2 de Outubro, às 10h00, no Clube de Tavira, ou um concerto de jazz do “Fernando Pessoa Project”, no dia 20 de Outubro, às 21h30, também no Clube de Tavira.

A isto, juntam-se exposições e até iniciativas com as escolas. Todos os eventos previstos no programa, à exceção das exposições e iniciativas com as escolas, têm entrada paga, que varia entre os 5 e os 10 euros.

Quanto à ideia para a iniciativa não é nova. Quando Tela Leão, nascida no Brasil, chegou a Tavira, a Casa Álvaro de Campos já fazia «encontros académicos por altura desta data», aos quais a presidente da associação Partilha Alternativa assistiu.

Em 2015, juntando a Casa Álvaro de Campos com a associação de teatro Armação de Artistas, um grupo que também já assinalava a data com iniciativas teatrais, surgiu uma primeira «pequena programação».

Um ano depois, o aniversário do heterónimo de Pessoa voltou a ser comemorado, já com o apoio do 365 Algarve, algo que se repete este ano. Isto sem esquecer que Tela Leão é uma fã confessa de Álvaro de Campos, tal como já revelou ao nosso jornal.

Para a programadora cultural, todo o «programa é ótimo». «Cada iniciativa é especial. Temos Fernando Pessoa visto e revisto, desde um grupo – as Pérolas do Gilão – a cantar Pessoa com temas de folclore português, até improvisações ou jazz. Cada um, é precioso em si mesmo», diz.

No que diz respeito a expetativas para os eventos… «vamos ver como corre». «Não sei como vai resultar. A aposta é forte nos músicos locais, mas também vamos ter um ou dois convidados de fora», conclui.

Para consultar o programa completo, que tem apoio na divulgação da Casa Fernando Pessoa, em Lisboa, clique aqui.

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