É uma fronteira, que em tempos foi para separar, mas que é cada vez mais um símbolo de união e cooperação entre Portugal e Espanha. Mas não é uma fronteira qualquer: o Baixo Guadiana é, segundo muitos investigadores, a mais antiga raia da Europa, tendo sido oficializada pelo Tratado de Badajoz, em 1267. 750 anos depois, municípios dos dois lados uniram-se para tentar que a Raia do Guadiana seja Património Imaterial da Humanidade.
O projeto «Uma Raia de Água» visa, por um lado, aprofundar o conhecimento histórico sobre este território e ratificar cientificamente o estatuto de fronteira mais antiga da Europa (e, quem sabe, do mundo), e, por outro, preparar uma candidatura a Património Imaterial da Humanidade da UNESCO.
A iniciativa foi lançada esta quinta-feira, dia 3 de Agosto, com a assinatura de um protocolo entre os cinco parceiros iniciais do projeto: as Câmaras portuguesas de Vila Real de Santo António e de Castro Marim, os Ayuntamientos de Ayamonte e Cortegana, de Espanha, e a Universidade de Huelva. San Lúcar do Guadiana não esteve entre os signatários iniciais, mas também integrará o projeto.
A cerimónia de assinatura do protocolo decorreu em Ayamonte, município que vai liderar o processo, e serviu para dar a conhecer os fundamentos por detrás do «Uma Raia de Água».
«Celebram-se, em 2017, os 750 anos da assinatura do Tratado de Badajoz, entre Afonso III de Portugal e Afonso X de Castela, que começou a definir um e outro país. Tivemos a sorte desse processo ter começado por Ayamonte e pelo Algarve, neste caso por Castro Marim», ilustrou o alcaide de Ayamonte Alberto Fernández.
«Parece impossível que tantos séculos depois, por entre períodos de guerra e de paz, a fronteira se tenha mantido», disse.
Quanto ao projeto em si, terá uma primeira fase, de teor «académico», que visa «ratificar a antiguidade desta fronteira, a nível europeu», ao mesmo tempo que tenta aferir «se é a mais antiga do mundo», segundo o alcaide de Ayamonte. Essa investigação será desenvolvida pela Universidade de Huelva e deverá estar concluída «ainda em 2017».
A partir de 2018, os parceiros do projeto, que podem vir a ser mais – «somos os primeiros, mas não seremos os únicos» – vão trabalhar numa candidatura conjunta para reconhecimento da raia do Guadiana como Património Imaterial da Humanidade.
Isto passa, também, pela «consciencialização da população espanhola e portuguesa da importância que tem, não apenas a efeméride [750 anos do Tratado de Badajoz], mas também como os nossos países viveram a fronteira ao longo do tempo».
Isto será feito através de conferências, mas também através da valorização do património edificado, nomeadamente as estruturas abaluartadas defensivas que existem dos dois lados da fronteira e dos seus castelos, de campanhas turísticas e de ações informativas nas escolas da província de Huelva e do Algarve.
A dimensão cultural e a herança comum dos parceiros é o ponto-chave deste projeto, embora não seja de desprezar a dimensão económica a ele associado.
«Qualquer projeto na fronteira, como a Eurocidade, é sempre importante para a nossa economia local e para o seu envolvimento. Mas também há a dimensão cultural, que é fundamental. Vila Real de Santo António, muitas vezes, é vista como um local só de férias e de boa gastronomia, o que é bom, mas não chega. Temos de mudar o conceito de VRSA, valorizar a sua história e património», defendeu Conceição Cabrita, vice-presidente da Câmara vilarrealense
Na perspetiva de Castro Marim, esta união com os seus vizinhos fará do concelho «um território central, que poderá beneficiar de toda a envolvente, principalmente este mercado de proximidade que é a Andaluzia», disse Filomena Sintra, vice-presidente da Câmara castromarinense.
Mas será também uma oportunidade para promover «o património e a cultura» locais. «Desde logo, reforçar o que é o estudo, a investigação e a potenciação do nosso património construído, mas também os elementos históricos a ele associados. Na cultura, temos os Dias Medievais, que recriam a época em que esta fronteira foi instituída. E há também uma cultura comum, como o contrabando e as relações familiares entre os dois lados da fronteira, do qual o nosso Paco de Lucía é um exemplo», explicou.
Filomena Sintra também reforçou a ideia que o alcaide de Ayamonte Alberto Fernández avançou de que este é um projeto aberto. «Este processo foi agora lançado e temos uma série de entidades e pessoas que queremos que se associem a nós. Até porque isso é importante para conseguir o reconhecimento da UNESCO», assegurou. Entre elas, está a Universidade do Algarve, que «seria de todo o interesse» que se tornasse parceira.
Fotos: Hugo Rodrigues|Sul Informação
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