O sarampo regressou. E agora?

As notícias dos últimos dias deram a conhecer o surgimento de dois surtos de sarampo em Portugal, um na região […]

As notícias dos últimos dias deram a conhecer o surgimento de dois surtos de sarampo em Portugal, um na região de Lisboa e outro no Algarve. Foram notificados mais de 25 casos de sarampo desde o início do ano, dos quais 21 estão confirmados. A adolescente que estava internada em estado grave, acabou por falecer. Estes casos incidem sobretudo em crianças não vacinadas.

Esta situação levou a que se voltasse a debater a obrigatoriedade das vacinas e a responsabilização dos pais que recusam vacinar os seus filhos. Não é para menos, uma vez que esta doença fora considerada erradicada do nosso país. Das doenças infeciosas, o sarampo é das mais contagiosas e pode provocar complicações graves – como pneumonia e encefalite – e, em casos extremos, até a morte.

Tudo isto sem necessidade, uma vez que a vacina contra o sarampo faz parte do Plano Nacional de Vacinação e, como as outras do mesmo Plano, é gratuita. A primeira vacina é dada aos doze meses e a segunda por volta dos cinco anos.

O que é que nós, cidadãos, podemos fazer neste momento? Podemos, e devemos, esclarecer aqueles que nos são próximos e combater o movimento anti-vacinação, que tem cada vez mais adeptos em Portugal. Apresento alguma informação relevante que pode ajudar nos esclarecimentos.

As vacinas são seguras e os seus benefícios superam os riscos. Por vezes podem ocorrer efeitos secundários como vermelhidão, inchaço ou dores de cabeça, mas isto é preferível a sofrer as consequências graves das doenças.

A vacinação faz parte do direito da criança à saúde, que supera o direito dos pais poderem optar ou recusar a imunização.

Enquanto mais de 95% da população estiver vacinada, verifica-se a imunidade de grupo, o que dificulta a transmissão da doença, uma vez que a maioria estará imunizada – digamos que funcionam de escudo para aqueles que não se vacinaram por ainda não terem idade ou por estarem com o sistema imunitário debilitado.

Assim, ao não vacinar um filho, os progenitores estão não só a colocar a saúde da criança em risco, como das outras crianças à sua volta.

Os receios das vacinas resultam, em grande medida, de desinformação disseminada na internet, apoiada em teorias da conspiração. Uma dessas teorias diz que as empresas multinacionais causam doenças para lucrarem com elas – como se o sarampo, a varicela ou a rubéola, por exemplo, já não existissem há milhares de anos.

Na realidade, o ser humano tem conseguido, através da investigação científica, compreender a causa e o mecanismo de infeção dessas doenças e, assim, combatê-las. Devido aos avanços científicos e médicos estamos cada vez mais saudáveis. Recusar as vacinas é um retrocesso civilizacional.

Outro receio é que as vacinas causem doenças como o autismo. A origem deste rumor remonta a um artigo publicado pelo (ex) médico britânico Andrew Wakefield, em 1998, mas que foi retirado da revista por ter sido considerado fraudulento.

Múltiplos estudos realizados posteriormente para estudar essa suposta associação concluíram que a vacina não causa o síndrome de autismo.

Além disso, uma investigação jornalística demonstrou que Wakefield tinha conflitos de interesse nesta área, uma vez que tinha sido pago para apresentar provas com o intuito de processar o laboratório produtor da vacina, e porque ele mesmo tinha registado uma patente para uma outra vacina contra o sarampo. Wakefield viria a perder a sua licença para exercer medicina devido ao mau trato das crianças que usou no estudo.

O melhor que nós podemos fazer sempre que nos depararmos com o discurso anti-vacinação é refutá-lo e convencer os pais das vantagens de vacinar as suas crianças. É uma questão de saúde pública. Uma população vacinada é uma sociedade protegida.

 

Autor: João Lourenço Monteiro é biólogo, com mestrado em Biologia do Desenvolvimento, aluno de doutoramento em História e Filosofia da Ciência.
Atualmente é comunicador de ciência no CIBIO-InBIO da Universidade do Porto.
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