Marcelo, o primeiro astronauta algarvio

Aquando da eleição do nosso afectuoso Marcelo como Presidente da República, há pouco mais de um ano, penso que poucos […]

Foto Cláudia Vargues

Aquando da eleição do nosso afectuoso Marcelo como Presidente da República, há pouco mais de um ano, penso que poucos poderiam adivinhar o fantástico negócio democrático e social que colectivamente estávamos a fazer: com um simples voto, não apenas elegemos um Presidente da República, como também ganhámos uma autêntica popstar mediática e ainda formámos… o primeiro astronauta algarvio!

Não que o nosso Presidente seja nado ou criado cá pelo nosso Algarve (parece que desses, por uns tempos, já temos a nossa dose), mas porque é graças ao Algarve que vai à Lua.

Reza a lenda que Marcelo, que é dado à bujarda (que é como quem diz sound bite, mas em bonito), ainda que erudita e quase sempre positiva, disse, em Julho do ano passado, que a probabilidade de ele próprio ir à Lua era mais ou menos a mesma de haver exploração de hidrocarbonetos no Algarve, dado o rasteirinho preço do vil crude que faz mover o Mundo.

Nisto das viagens, tudo é possível com Marcelo, até dotar-se de ubiquidade, aparecendo em mais do que um local ao mesmo tempo, desafiando o contínuo espaço-tempo e deformando as leis da Física – de caminho criando um tremendo problema de concorrência a Fátima, até porque não parece cobrar preços exorbitantes por um metro quadrado onde estender um saco-cama, se bem que não se sabe como ficará gravado num corta-unhas…

Apesar disso, passeata até à Lua parece daquelas coisas que, mesmo para ele, seriam difíceis.

Eis senão quando, no passado Sábado, em interacção com manifestantes contra a exploração de hidrocarbonetos no Algarve, com aquela bonomia e naquele tom de amena cavaqueira que o caracteriza, reiterou essa posição.

É sabida a afinidade quase paternal que o Presidente da República tem para com o Governo e, em particular, para com o Primeiro-Ministro, apaparicando-o e aparando todas as tropelias e devaneios.

Por outro lado, é certo que aos amigos perdoam-se, ou não se querem ver, certas coisas. Só isso explica que alguém, mesmo da craveira intelectual do Professor Marcelo, feche os olhos à hipócrita pantomina que está em cena lá para os lados de S. Bento, onde de manhã se assina um acordo internacional para a descarbonização da economia e à tarde se vende internacionalmente a prospecção e exploração de hidrocarbonetos como a próxima grande coisa no Algarve (e em Portugal).

Está portanto mais que visto que, no que depender deste Governo, e em plena concordância com o anterior, gás, petróleo e o mais que haja, salta tudo para a superfície, para queimarmos alegremente.

Por outro lado, considerando que Marcelo também deu ouvidos à malta que ocupa as ilhas-barreira, ou é mesmo muito distraído, ou é rapaz para acreditar em qualquer coisa que lhe digam.

Seja como for, e como as coisas estão, Marcelo está mesmo apontado a tornar-se o primeiro Presidente da República lunar (aluados houve e há muitos), mérito do Algarve, que de tão embrenhado na universalidade da promoção turística, não olha sequer a fronteiras planetárias, tendo inclusivamente no passado Sábado fornecido o fato de astronauta!

E ainda há quem diga que o turismo no Algarve é sempre a mesma coisa…

Vai daí, pela minha parte, encomendo já os souvenirs de tão excêntrica jornada, digna dos pergaminhos das Descobertas: caro Professor Marcelo, quando estiver lá por cima, veja lá se encontra a decência, a vergonha na cara e a honestidade, que cá por baixo parecem mesmo coisas de outro planeta!

 

Autor: Gonçalo Gomes é arquiteto paisagista, presidente da Secção Regional do Algarve da Associação Portuguesa dos Arquitetos Paisagistas (APAP)
(e escreve segundo o antigo Acordo Ortográfico)

 

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