Descoberta a origem das erupções rápidas de ondas de rádio

Uma erupção rápida de ondas de rádio (Fast Radio Burst ou FRB, em inglês) é um fenómeno transiente caracterizado por […]

Uma erupção rápida de ondas de rádio (Fast Radio Burst ou FRB, em inglês) é um fenómeno transiente caracterizado por um pulso intenso de rádio com a duração de apenas alguns mili-segundos.

Este tipo de transiente foi detetado pela primeira vez em 2007, em arquivos de observações realizadas em 2001, com o radiotelescópio Parkes, na Austrália.

De facto, quase todos os exemplos de FRB entretanto descobertos (apenas 18!) resultaram também do estudo detalhado de dados arquivados.

De notar que a paucidade de exemplos resulta da dificuldade de deteção dos transientes e não da sua pouca frequência. De facto, algumas estimativas apontam para a ocorrência diária de 10 mil destes pulsos em toda a esfera celeste!

Os astrónomos desconhecem o processo astrofísico subjacente, mas um artigo, publicado no dia 5 de Janeiro deste ano, na revista Nature, sugere algumas pistas intrigantes e demonstra claramente que os FRB são eventos extremamente energéticos que têm origem em galáxias a distâncias cosmológicas.

A sugestão de que os FRB poderiam ter origem em galáxias situadas a centenas ou milhares de milhões de anos-luz tinha sido já avançada no início de 2016, com a publicação de um artigo em que se associava o FRB150418 (descoberto em 18 de Abril de 2015) a uma galáxia ativa “situada” a 6 mil milhões de anos-luz.

Parecia assim que os FRB poderiam estar associados à atividade de buracos negros super-maciços no centro de galáxias distantes.

No entanto, poucas semanas depois, as conclusões do referido artigo foram refutadas e ficou demonstrado que a associação entre o FRB150418 e a galáxia não era real.

Quase em simultâneo, uma equipa liderada pelo astrónomo Paul Scholz publicava na revista Nature a descoberta de que o FRB121102 (originalmente descoberto em 2 de Novembro de 2012) emitia vários pulsos de rádio.

Esta observação foi de extrema importância. Por um lado, a repetição, ainda que errática, dos pulsos permitiria aos astrónomos determinar com exatidão a posição da fonte na esfera celeste.

Por outro lado, o facto do sinal se repetir excluía de imediato algumas teorias que sugeriam que os FRBs teriam origem na colisão de objetos compactos como estrelas de neutrões ou buracos negros (porque tal só aconteceria uma vez).

Finalmente, a dispersão temporal observada no sinal rádio do FRB121102 sugeria também que a origem do mesmo se situava a distâncias cosmológicas.

No artigo publicado na passada quinta-feira na revista Nature, por uma equipa de astrónomos que inclui também Paul Scholz, é descrito como foi possível determinar com precisão a posição do FRB121102 e identificar o objeto a partir do qual os pulsos são emitidos.

A equipa utilizou observações com o radiotelescópio gigante de Arecibo, Porto Rico, para obter uma primeira estimativa da posição. Reduzida a área de procura, foi a vez de entrar em ação o conjunto de antenas do Karl Jansky Very Large Array, no Novo México, EUA.

Um mês de observações permitiu a deteção de 9 pulsos do FRB121102, o suficiente para o radiotelescópio fixar a posição do transiente com um erro inferior a 0.1 segundos-de-arco (aproximadamente o tamanho de uma moeda de 10 cêntimos vista a 40 km!).

Com a posição precisa da fonte em mãos, os astrónomos tentaram então observar a dita região do céu para determinar que tipo de objeto estaria na origem do FRB121102.

As observações foram realizadas com um dos maiores telescópios do mundo, o Gemini Norte, localizado no topo do Mauna Kea, no Hawaii, e revelaram nessa posição uma galáxia muito distante: a luz que dela vemos demorou cerca de 3 mil milhões de anos a fazer a viagem!

Surpreendentemente, trata-se de uma galáxia anã, sensivelmente do tamanho da Pequena Nuvem de Magalhães, e pouco rica em elementos pesados que os astrónomos designam por “metais”. Algures nesta galáxia existe um objeto que emite intensos pulsos de ondas de rádio, cada um deles com a energia de milhões de sóis.

Curiosamente, nos últimos anos, os astrónomos têm observado várias supernovas de um tipo novo, muito luminoso, designadas por SLSN (Super-Luminous SuperNovae) com origem precisamente neste tipo de galáxias.

Pensa-se que a baixa metalicidade do gás nestas galáxias favorece a formação de estrelas com massas muito elevadas que terminam a vida nestas supernovas muito luminosas. A extrema luminosidade das supernovas é atribuída à formação concomitante de uma estrela de neutrões com um campo magnético extremo designada por magnetar.

Os modelos que melhor explicam as SLSNe sugerem que a energia extra observada, relativamente a supernovas normais, é transferida do magnetar no seu interior para o remanescente da supernova através de campos magnéticos intensos.

Neste cenário, os FRB não estão associados diretamente às SLSNe. No entanto, a ideia é que, neste tipo de galáxias, onde são mais frequentes as SLSNe, formar-se-ão também mais frequentemente magnetares.

A curta duração dos pulsos dos FRB e a elevada energia implica que estes têm de ser emitidos por objetos muito pequenos, como estrelas de neutrões ou buracos negros.

Observações de magnetares na nossa galáxia e em galáxias vizinhas permitiram detetar erupções semelhantes destes objetos, mas em comprimentos de onda mais curtos, e.g., raios gama. Isto sugere, mas não mais do que isso, que poderá haver uma ligação entre os FRB e a atividade de magnetares.

O tempo dirá se este palpite se confirma.

 

Legenda da figura acima:
A equipa de astrónomos utilizou o radiotelescópio de Arecibo para restringir a posição do FRB121102 dentro das duas circunferências. Observações subsequentes com o Very Large Array permitiram determinar a posição com precisão dentro do pequeno quadrado no interior das circunferências (a).
Observações realizadas com o telescópio Gemini Norte, no Hawaii, permitiram identificar uma galáxia anã nessa posição (b).
Crédito: Universidade da Califórnia — Berkeley.

 

Autor: Luís Lopes
Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

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