Afinal, as estufas estão a ajudar a “destapar” cidade romana de Balsa

No final do ano passado, foi noticiado que, no local onde terá existido a cidade romana de Balsa, na zona […]

BalsaNo final do ano passado, foi noticiado que, no local onde terá existido a cidade romana de Balsa, na zona da Quinta da Torre d’Aires, em Tavira, estavam a ser colocadas estufas para cultivar frutos vermelhos. No entanto, o que constituiu uma ameaça está agora a ajudar a revelar o passado, já que uma equipa de arqueólogos contratados pela empresa agrícola está a trabalhar no local desde meados deste ano.

Como o Sul Informação avançou na altura, a obra foi embargada, uma  vez que não possuía autorizações da CCDR e da Direção Regional de Cultura, necessárias por se encontrar em zona de REN e de património classificado.

Na sequência desse embargo, a empresa contactou a Direção Regional de Cultura, «que condicionou a emissão do seu parecer relativo ao eventual licenciamento da operação agrícola à prévia realização de trabalhos arqueológicos preventivos, de diagnóstico dos vestígios existentes no terreno e do seu estado de conservação, através de batida sistemática do terreno em toda a superfície da área de intervenção, à realização de prospeções geofísicas (um meio complementar de diagnóstico não intrusivo), à realização de sondagens de controlo e ao levantamento georreferenciado de todos os vestígios arqueológicos visíveis», revelou esta semana a Direção Regional de Cultura em comunicado.

Segundo explica a entidade, «o arrendatário contratou uma equipa da especialidade, integrando arqueólogos com experiência de trabalho em contextos da época romana e assessorada por reconhecidos especialistas no estudo desse período. Os trabalhos arqueológicos foram autorizados por despacho da DGPC, de 02/06/2016, e encontram-se presentemente ainda a decorrer».

A importância destes trabalhos arqueológicos é maior porque, segundo a Direção Regional de Cultura, «pela primeira vez em quase quatro décadas, após a abertura do processo administrativo de proteção da Cidade Romana da Balsa na Direção-Geral do Património Cultural (em 1977), 16 anos após a classificação de parcelas da cidade antiga como Imóvel de Interesse Público (em 1992) e cinco anos após a criação da respetiva Zona Especial de Proteção (em 2011), estão em curso trabalhos científicos com caráter multidisciplinar, extensivo e inovador na quinta da Torre d’Aires».

Balsa
Vista sobre a zona Sul da Quinta de Torre de Aires

Estes trabalhos estão a ser dirigidos pelos arqueólogos Vítor Dias e Jorge Freire, com coordenação científica dos professores João Pedro Bernardes, da Universidade do Algarve, e Vasco Mantas, da Universidade de Coimbra, e incluindo trabalhos de prospeção realizados por Helmut Becker (1ª fase) e Cornelius Meyer (2ª fase), dois reconhecidos especialistas em geofísica aplicada à arqueologia.

«Estes trabalhos arqueológicos vão finalmente permitir obter uma base documental sólida para se poder reconstituir a estrutura urbana deste sítio», acrescenta a Direção Regional de Cultura.

Ao longo da pesquisa, serão apresentados relatórios preliminares, com a exposição sumária dos resultados obtidos, e, no final, será apresentado um relatório final «com a interpretação dos dados e a identificação da localização das áreas edificadas, muralhas, vias, pátios, praças e outras estruturas caraterísticas do urbanismo romano».

Esses relatórios irão permitir à Direção Regional de Cultura do Algarve «efetuar uma avaliação dos impactes da operação agrícola sobre os vestígios arqueológicos e determinar as correspondentes medidas de salvaguarda dos vestígios remanescentes da cidade romana de Balsa».

Um dos relatórios preliminares, referente a uma área de 21 hectares na zona norte da propriedade, revelou «a ausência total, naquela zona, de vestígios conservados da cidade romana». Por isso, a Direção Regional de Cultura emitiu um parecer “favorável condicionado” ao licenciamento de um projeto agrícola, relativo à montagem e utilização de estufas, nesse local.

Este parecer “com condições” implica que os trabalhos a ser efetuados no local tenham acompanhamento arqueológico e que «caso o aparecimento de vestígios arqueológicos o justifique, sejam suspensas quaisquer obras (o projeto prevê afetação do subsolo a uma profundidade máxima de 40 cm para as valas de rega)».

No comunicado enviado às redações, a Direção Regional de Cultura diz que «se encontram finalmente reunidas as condições para, com base nos dados concretos (ou seja na ‘evidência empírica’) dos mapas geofísicos, do rigoroso mapeamento da dispersão dos materiais à superfície do terreno e das estruturas identificadas, decorrentes da intervenção arqueológica agora em curso, poder proceder a uma redefinição dos limites do imóvel classificado».

Para isso, a entidade vai propor «em breve» à DGPC a «abertura de um procedimento de ampliação da classificação da ‘Estação Arqueológica Romana da Luz’ como Sítio de Interesse Público, abrangendo a totalidade das áreas onde se localizam vestígios efetivamente documentados pelos trabalhos arqueológicos, com definição das restrições a que o uso do solo deverá ser sujeito, e, simultaneamente, procedendo à delimitação de nova ZEP, igualmente com definição de restrições de uso do solo».

A Direção Regional de Cultura conclui a nota com um desejo: «que desta ação de salvaguarda resulte um projeto de investigação científica e de valorização do sítio, envolvendo a universidade e a administração central e local, pondo assim um ponto final na destruição, ocorrida num passado ainda recente, desta importante cidade do Império Romano».

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