Universidade do Algarve quer deixar velhas praxes para trás «dentro de dois ou três anos»

As praxes, na Universidade do Algarve, estão em processo de mudança e «dentro de dois ou três anos» poderão ser […]

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As praxes, na Universidade do Algarve, estão em processo de mudança e «dentro de dois ou três anos» poderão ser compostas, pelo menos oficialmente, por atividades  lúdicas e de integração totalmente afastadas do registo que habitualmente se associa às praxes académicas.

Esta é, pelo menos, a crença do reitor da UAlg António Branco, que se reuniu esta terça-feira de manhã com o presidente da Associação Académica da Universidade do Algarve Rodrigo Teixeira, para começar a preparar a Receção ao Caloiro.

A reunião aconteceu no mesmo dia em que foi conhecida uma Carta Aberta assinada por cem personalidades dos mais variados campos, divulgada pelo Jornal Público, que insta as Instituições de Ensino Superior a criar, elas próprias, programas lúdicos e formativos de receção e integração dos novos estudantes, que sirvam de alternativas às praxes que existem atualmente, muitas vezes associadas a «casos de violência física, psicológica e simbólica».

O facto de este encontro se realizar hoje foi uma coincidência, asseguraram ao Sul Informação tanto António Branco como Rodrigo Teixeira. Até porque a ideia, ilustrou o reitor da UAlg, «é fechar este assunto das praxes rapidamente, antes do mês de Agosto».

Desfile do Caloiro UAlg 2012No documento divulgado esta terça-feira, professores universitários, estudantes, artistas, investigadores, atletas, economistas, jornalistas,  magistrados e políticos de diversos partidos, entre outros, apelam a um maior envolvimento de Universidades, Politécnicos, faculdades e escolas superiores no processo de integração dos alunos que ingressam no Ensino Superior.

Os signatários da Carta Aberta, entre os quais se conta o deputado algarvio Cristóvão Norte (ver abaixo) também pedem que as instituições «informem atempada e eficazmente todos os novos alunos, por exemplo através do envio de um email ou entregando, no ato da matrícula, um esclarecimento nesse sentido, de que as atividades de praxe não constituem qualquer espécie de obrigação e que não podem ser prejudicadas de nenhuma forma ou ameaçados de qualquer maneira por recusarem participar, devendo ser fornecido um contacto para o qual possam ser endereçadas queixas».

No caso da Universidade do Algarve, algumas das boas práticas sugeridas pelos signatários da Carta Aberta até já são seguidas desde o ano passado, muito por influência de António Branco, que é abertamente contra as praxes tradicionais.

«Estes programas não se montam de um momento para o outro, porque é preciso mover toda uma comunidade académica, que envolve docentes, alunos e funcionários, para uma alteração dos modelos de receção dos novos alunos», enquadrou o reitor da UAlg.

O responsável máximo pela universidade algarvia admite que «este ano, acredito que ainda haverá as tradicionais praxes», algo que espera que deixe de acontecer dentro de «dois ou três anos»

«Nós no ano passado já tomámos conta da receção, enquanto instituição, de forma totalmente diferente. Ou seja, acompanhámos os estudantes desde o  primeiro minuto e vamos intensificar esta prática no próximo ano letivo. E estamos a trabalhar com a Associação Académica no sentido de contermos os efeitos das praxes feitas pelos estudantes, mas também no sentido de criarmos atividades alternativas, em conjunto, nomeadamente de voluntariado», acrescentou.

Segundo o reitor, a ideia mais concreta que saiu da reunião que manteve com Rodrigo Teixeira foi, precisamente, a de associar, cada vez mais, as atividades de receção ao caloiro ao voluntariado, um projeto que, reforçou Rodrigo Teixeira, vem no seguimento do que já vem sendo feito, de forma desgarrada, por diferentes cursos. «Queremos criar uma espécie de bolsa de voluntariado, que nos permita cusar um grande impacto na sociedade», disse o presidente da AAUAlg.

NCMas há outras iniciativas que irão, quase de certeza, ser repetidas. A AAUAlg promoveu, em 2015, ações de formação obrigatórias para as comissões de praxe de cada curso, para deixar bem claros os limites e sensibilizar «para o respeito pelos colegas» e palestras informativas dirigidas aos novos alunos, onde é salientado que «não têm de aderir à praxe, se não o desejarem».

Quem sofrer eventuais abusos, pode sempre queixar-se «ao Conselho de Veteranos», mas também «diretamente à AAUAlg». Em 2015, o reitor António Branco também se colocou à disposição dos alunos que quisessem denunciar abusos, num email enviado a toda a comunidade académica.

Por outro lado, igualmente no passado ano letivo, foram promovidas diversas atividades, de caráter puramente lúdico, visando a integração dos estudantes de primeiro ano. «No ano passado promovemos uma tarde de dança, em que os caloiros experimentaram Kizomba e Zumba. Também promovemos uma tarde desportiva, em que os cursos competiram entre si e um pedipaper noturno, onde demos a conhecer os principais pontos de interesse da cidade de Faro», contou o presidente da AAUAlg.

«Queremos reforçar estas atividades e criar outras novas. No ano passado foi a experiência-piloto e correu muito bem, aderiram grande parte dos cursos», disse Rodrigo Teixeira. Ainda assim, a instituição algarvia esteve no centro das atenções em Setembro devido a um ação de praxe na Praia de Faro que acabou com uma estudante do primeiro ano a ser assistida no hospital, após se ter sentido mal.

 

Carta aberta às instituições de Ensino Superior na íntegra e lista de signatários:

Anualmente, milhares de jovens de todo o país ingressam no Ensino Superior. O início do percurso académico traz a si associadas novas realidades e desafios, que obrigam a várias mudanças e adaptações.

Em muitos dos casos significa sair de casa da família, mudar de cidade; em todos construir novos laços de amizade e grupos de amigos, quebrar rotinas e hábitos de anos e enfrentar níveis de exigência e ritmos de trabalho até então desconhecidos.

O investimento coletivo que o país empreende na formação de nível superior, seja por via do Orçamento do Estado – dos nossos impostos – seja pelo enorme esforço financeiro e sacrifício das famílias, assim como a necessidade estratégica de Portugal melhorar os seus níveis de qualificação e o número de diplomados, torna evidente o interesse de todos, enquanto sociedade, em que a transição entre ciclos de estudos, do Ensino Secundário para o Superior, se traduza num processo suave, bem-sucedido e que contribua para o sucesso académico.

A receção e a integração do novo estudante na instituição acolhedora desempenha, neste sentido, uma função primordial na garantia de uma eficaz e feliz adaptação a um ambiente social e educativo inicialmente estranho, complexo e, não poucas vezes, difícil.

Em Portugal, ao contrário do que sucede em vários outros países em que o Ensino Superior também está massificado, as instituições de Ensino Superior universitário e politécnico não ocupam o papel central de integração do estudante na vida académica, fazendo com que os grupos e organizações promotoras de atividades praxísticas não só tenham disputado esse terreno como nele se tenham cimentado, reivindicando hoje para si o papel de agente integrador, muitas vezes exclusivo, na comunidade estudantil e académica.

Esta realidade foi-se conjugando com a multiplicação da denúncia pública de casos de violência física, psicológica e simbólica associadas às atividades de praxe. Alguns destes abusos, relatados, ao longo dos últimos anos, pelos meios de comunicação social, deram visibilidade a um fenómeno em que, afinal, o que parecia ser exceção à regra revela ser a própria regra.

Sendo certo que nenhum estudante é formal ou legalmente obrigado a frequentar as atividades de praxe, seja em que faculdade ou escola superior for, a pressão para aderir é muitas vezes muito forte e em si mesma uma violência, e a ausência de outros mecanismos integradores é um facto. Em democracia, deve haver sempre lugar à escolha, mas só é possível escolher se houver opção, ou seja, alternativas consistentes.

Assim, instamos todas as equipas dirigentes das Universidades, Politécnicos, faculdades e escolas superiores a criar, com caráter duradouro, atividades de receção e de integração dos novos estudantes e das novas estudantes, ao longo do ano letivo, que configurem uma alternativa lúdica e formativa às iniciativas promovidas pelos grupos e organizações de praxe.

Apelamos também a que as mesmas instituições informem atempada e eficazmente todos os novos alunos e todas as novas alunas, por exemplo através do envio de um email ou entregando, no ato da matrícula, um esclarecimento nesse sentido, de que as atividades de praxe não constituem qualquer espécie de obrigação e que não podem ser prejudicadas de nenhuma forma ou ameaçados de qualquer maneira por recusarem participar, devendo ser fornecido um contacto para o qual possam ser endereçadas queixas.

 

Subscritoras e subscritores:

Abel Neves, Dramaturgo

Abílio Hernandez Cardoso, Professor Universitário

Alexandre Quintanilha, Presidente da Comissão de Educação e Ciência na Assembleia da República e Deputado do PS

Alice Duarte, Professora Universitária

Ana Benavente, Professora Universitária

Ana Deus, Música

Ana Matos Pires, Médica Psiquiatra

Ana Rita Bessa, Deputada do CDS-PP

Ana Zannatti, Atriz

André Barata, Professor Universitário

André Freire, Professor Universitário

André Silva, Deputado do PAN

Andrzej Kowalsky, Realizador

António Arnaut, advogado, ex-ministro da Saúde

António Augusto Barros, Diretor Artístico d’A Escola da Noite

António Sousa Ribeiro, Professor Universitário

Boaventura de Sousa Santos, Professor Universitário

Bruno Cochat, Professor do Ensino Artístico

Capicua, Música

Carlos Mendes, Músico

Carolina Ramos, Estudante

Catarina Furtado, Jornalista, Presidente da Associação Corações com Coroa

Catarina Isabel Martins, Professora Universitária

Celso Cruzeiro, Advogado, ex-dirigente da Associação Académica de Coimbra durante a Crise Académica

Clara Sottomayor, Juíza

Cristóvão Norte, Deputado do PSD

Diana Andringa, Jornalista

Diana Martinez, Música

Eduardo Pitta, Escritor

Elísio Estanque, Professor Universitário

Fausto Bordalo Dias, Músico

Fernanda Câncio, Jornalista

Fernando Alves, Jornalista

Fernando Bessa, Professor Universitário

Fernando Rosas, Professor Universitário

Filomena Marona Beja, Escritora

Francisco Louçã, Professor Universitário

Gaspar Martins Pereira, Professor Universitário

Gonçalo Velho, Dirigente do Sindicato Nacional do Ensino Superior

Gustavo Cardoso, Professor Universitário

Inês Ferreira Leite, Professora Universitária

Inês Pedrosa, Escritora

Isabel Cluny, Professora Universitária

Isabel Moreira, Deputada do PS

Jacinto Lucas Pires, Escritor

Jaime Mendes, Médico, Cirurgião Pediatra e Presidente do Conselho Regional da Ordem dos Médicos

Joana Mortágua, Deputada do Bloco de Esquerda

João Leal Amado, Professor Universitário

João Mineiro, Investigador

João Salaviza, Cineasta

João Teixeira Lopes, Professor Universitário

João Torres, Deputado do PS e Secretário-geral da JS

João Veloso, Professor Universitário

João Zilhão, Professor Universitário

Jorge Dias de Deus, Professor Universitário

Jorge Reis Novais, Professor Universitário

José Adelino Maltez, Professor Universitário

José Luís Peixoto, Escritor

Luís Augusto de Miranda Correia, Professor Universitário

Luís Moita, Professor Universitário

Luís Monteiro, Deputado do Bloco de Esquerda

Luís Raposo, Arqueólogo e Presidente do ICOM Europa

Luísa Costa Gomes, Escritora

Manuel Brandão Alves, Professor Universitário

Manuel Costa Alves, Meteorólogo

Manuel Loff, Professor Universitário

Manuel Pereira dos Santos, Professor Universitário

Manuel Sobrinho Simões, Investigador e Diretor do Ipatimup

Manuela Gomes da Silva, Investigadora

Margarida Chagas Lopes, Professora Universitária

Margarida Gil, Cineasta

Mário Jorge Barroca, Professor Universitário

Melissa Antunes, Atleta e Capitã da Seleção Nacional Feminina de Futsal

Miguel Guedes, Músico

Miguel Sousa Tavares, Escritor

Nuno Saraiva, Ilustrador

Paula Teixeira da Cruz, Deputada do PSD

Pedro Marques Lopes, Jurista e Comentador

Pedro Vieira, Ilustrador e Escritor

Pezarat Correia, Militar de Abril

Pilar del Rio, Jornalista e Presidente da Fundação José Saramago

Raquel Freire, Cineasta

Ricardo Paes Mamede, Economista

Rita Brütt, Atriz

Rita Ferro Rodrigues, Apresentadora

Rita Silva, Dirigente da Associação Animal

Rosário Gama, Presidente da APRE

Rubina Berardo, Deputada do PSD

Rui Bebiano, Professor Universitário

Rui Simões, Cineasta

Rui Spranger, Ator

Rui Unas, Humorista

Santana Castilho, Professor Universitário

São José Lapa, Atriz e Encenadora

Sousa Dias, Ensaísta

Teresa Caeiro, Vice-Presidente da Assembleia da República e Deputada do CDS-PP

Vasco Lourenço, Militar de Abril

Virgínia Ferreira, Professora Universitária

Zé Neves, Professor Universitário

Zuraida Soares, Deputada do Bloco de Esquerda à ALRA

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