A TAP e os 3% na quota de tráfego do Aeroporto de Faro

Muito se tem falado, por estes dias, do Porto e do norte de Portugal e da sua relação com a […]

Rui CaladoMuito se tem falado, por estes dias, do Porto e do norte de Portugal e da sua relação com a TAP. Não é minha intenção promover escaramuças de cunho bairrista ou regionalistas. Mas, como o povo diz, e bem, “quem não se sente não é filho de boa gente”.

Isto é o que sente este contribuinte algarvio preocupado com o desenvolvimento da sua região e com a atitude displicente da empresa pública “Transportes Aéreos de Portugal ” para com os contribuintes do Sul de Portugal, para com a economia desta região e para com todas as suas forças vivas.

Com a recompra da TAP levada a cabo por este Governo, do Partido Socialista e de António Costa, e com a alocação de 30 milhões de euros previstos em Orçamento de Estado para subscrever parte do empréstimo obrigacionista que visa criar condições e aumentar o financiamento à empresa, a TAP vem realçar aquilo que tem sido desde sempre, uma empresa com uma estratégia de funcionamento completamente anacrónico e irrelevante para com o Algarve. Uma forma anacrónica de chegar cá e daqui partir, completamente desadequada e até mesmo desonesta no que toca ao provimento do interesse público.

Qualquer uma das empresas TAP, da mais antiga à que agora resulta da compra pelo Estado, passando pela temporária e fugazmente privatizada, nenhuma delas esteve ao serviço do Algarve e desse serviço que o Turismo no Algarve presta ao país.

É que, lamentavelmente, o Aeroporto de Faro nunca fez parte da estratégia da TAP. Dos 6.436.881 passageiros que, em 2015, chegaram ao Aeroporto de Faro, apenas 192.469, ou seja, 3% do total, foram transportados pela TAP, segundo dados do Relatório de Tráfego da ANA.

Para a TAP, o Aeroporto de Faro não passa de uma ligação regional. Esta empresa limita-se a oferecer 3 ligações diárias para Lisboa e, a partir daí, os viajantes que se desenrasquem, ficando a braços com os desencorajadores transtornos próprios das ligações.

Repito, o Aeroporto de Faro não é, nem nunca foi, importante para a estratégia da empresa dita nacional, portuguesa, de todos nós.

E, porém, o aeroporto de Faro mantem ligação direta com 86 destinos diferentes, através de 30 outras companhias que, sabemos, não estão vinculadas a nenhum “interesse público nacional”, assegurando, assim, o transporte dos outros 97% de passageiros que voaram para Faro em 2015.

A TAP, que voltou a ser uma empresa com 50% de capitais públicos, e proclamada propugnadora do interesse público português, porque atravessa e liga o todo nacional, continental e insular, deve ser objeto de uma gestão estratégica que privilegie o apoio à atividade económica nacional, em todas as regiões. Disso depende grandemente o sucesso das empresas, assim como a quantidade de postos de trabalho em todas as regiões.

Assim, é com expectativa que aguardo a apresentação da nova estratégia e funcionamento da TAP, para perceber qual o papel efetivo desta em relação ao Algarve. É que o Algarve é a principal região turística de Portugal, tendo gerado, durante o ano de 2015, 16.436.881 dormidas, 750 milhões de euros de proveitos e 38,9 €/dia de RevPar.

O produto Golfe foi responsável pela chegada de mais de 250 mil golfistas na chamada época baixa – um mercado especial para as companhias aéreas, mas ignorado pela TAP, com uma receita direta de 75 milhões de euros e indireta (alojamento, alimentação e bebidas, comércio, rent-a-car, etc.) estimada em 350 milhões em bens transacionáveis (dados da AHETA).

Também as marinas e os Portos de Recreio do Algarve viram aumentar a permanência das embarcações nas suas instalações, por via de uma maior frequência de ligações aéreas ao Reino Unido, particularmente no sul, onde se verifica alguma saturação relacionada com ancoragem de embarcações.

Assim sendo, a TAP não pode continuar só a ser um sorvedouro dos nossos impostos. E não pode continuar a viver às custas dos impostos pagos por conta das receitas geradas pela ajuda de companhias internacionais.

E a companhia dita de bandeira, de interesse público, ficar a viver na sombra, sem esforço, sem participação ativa desconsiderando o Algarve e a sua indústria do Turismo. Pode e deve contribuir para a criação de valor nesta cadeia da economia da indústria do Turismo, bem como participar na estratégia de incoming do Turismo do Algarve, criando ligações aos principais destinos, abrindo portas, agilizando mercados, criando rotinas.

Os 50% que o Governo tem no capital da TAP devem servir o interesse nacional no seu todo, particularmente contribuir para atenuar os desequilíbrios geográficos. Só assim faz sentido o interesse público.

Caso contrário, é razão para se perguntar para que servem os 50% que o Governo tem na TAP.

 

Autor: Rui Calado
Gestor e Doutorando em Turismo na Faculdade de Economia da Universidade do Algarve

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