Engenho de açúcar do Infante D. Henrique investigado no Castelo de Silves

A estrutura circular em grês vermelho do engenho de açúcar que terá sido usado quando o Infante D. Henrique era […]

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A estrutura circular do engenho de açúcar, que terá pertencido ao Infante D Henrique, no castelo de Silves

A estrutura circular em grês vermelho do engenho de açúcar que terá sido usado quando o Infante D. Henrique era Alcaide-mor de Silves, em meados do século XV, está agora bem à vista no interior do castelo da cidade.

Este é o resultado mais importante da nova campanha arqueológica que ali decorreu, em finais de Agosto, sob a direção de Rosa Varela Gomes, do Instituto de Arqueologia e Paleociências da Universidade Nova de Lisboa.

«Foi uma curta campanha, mas este ano propus colocar à vista o engenho, para o compreender melhor», disse a arqueóloga ao Sul Informação.

É que este é, provavelmente, um dos mais antigos engenhos de açúcar ainda existentes na Península Ibérica. E tem a particularidade de se encontrar junto à estrutura que, segundo os dados recolhidos pela campanha arqueológica em 2006, tudo indica que seria a casa do alcaide do Castelo de Silves, ou seja, do Infante D. Henrique, que assumiu esse cargo em 1457.

Rosa Varela Gomes, cujas escavações arqueológicas permitiram recolher no local «materiais dos séculos XIV e XV», considera que foi aqui, no Castelo de Silves, do qual era alcaide e onde residiu, que o Infante fez «as primeiras experiências com a produção açucareira», que mais tarde levaria para a recém descoberta Madeira.

A investigadora explica que a descoberta deste engenho de açúcar «documenta arqueologicamente o que nos textos da época não está muito bem explicado»

Em 2006, quando as obras do Polis no interior do castelo levaram à descoberta de estruturas junto à muralha do setor poente, que foi preciso investigar, a equipa de arqueólogos liderada por Rosa Varela Gomes colocou a descoberto a casa onde residia o alcaide. Pelo espólio encontrado – cerâmica, moedas e fivelas – e ainda pelas técnicas e materiais da construção, foi possível datar essas estruturas como sendo dos séculos XIV e XV.

Esses primeiros trabalhos deram a conhecer um salão, uma escadaria e a estrutura do engenho, que só este ano foi posto a descoberto na sua totalidade.

A estrutura circular do engenho de açúcar, que terá pertencido ao Infante D Henrique, no castelo de Silves
A estrutura circular do engenho de açúcar, que terá pertencido ao Infante D Henrique, no castelo de Silves

Na curta campanha de uma semana em finais de Agosto, que contou com o apoio da Câmara de Silves, as atenções da equipa de seis pessoas, entre as quais alunos de Arqueologia da UNL, estiveram ainda viradas para uma abóbada da Casa da Alcaidaria descoberta nas escavações de 2006.

A abóbada está caída, juntamente com uma parte da parede sobre a qual se ergueria. Rosa Varela Gomes acredita que a abóbada seria o teto de uma sala da Alcaidaria, que terá sido derrubada «talvez no terramoto de 1587». Sobre o pavimento junto a essa estrutura, foram descobertos materiais de fins do século XVI ou início do XVII, nomeadamente fragmentos de faiança portuguesa e pregos da estrutura de madeira do telhado de então.

Mas as atenções da equipa voltam-se, sobretudo, para o engenho de açúcar. «Aqui à volta deveria andar um burro para mover o engenho», diz a arqueóloga, mostrando o espaço empedrado à volta da zona circular do engenho. «No Brasil, séculos mais tarde, esse trabalho era feito pelos escravos», recordou a arqueóloga que, em Dezembro de 2013, apresentou a comunicação «Os primórdios da produção açucareira em Portugal e a sua expansão nas Ilhas Atlânticas», no Seminário Internacional sobre a História do Açúcar, promovido em Santos, pela Universidade de São Paulo (Brasil).

«Haveria ainda uma zona de caldeiras e de purga onde estariam as formas do açúcar. As formas mais antigas de açúcar já descobertas são de Chipre. Aqui ainda não encontrei nenhuma», acrescentou, em declarações ao Sul Informação.

Dessa zona de produção do açúcar, que a investigadora acredita que estará, agora, na zona do castelo que não foi ainda alvo de intervenção, os trabalhos arqueológicos permitiram encontrar apenas uma «pega de caldeiro». Um dia, se as escavações avançarem para essa zona, pode ser que se descubram mais páginas desta história.

Todos estes são dados que levaram a arqueóloga a acreditar ter descoberto o que resta, cinco séculos depois, da casa da Alcaidaria, onde viveu o Infante D. Henrique, figura conhecida em todo o mundo por ter sido o primeiro grande impulsionador das viagens de exploração marítima, no século XV.

«O Infante morou aqui, não se sabe durante quanto tempo, mas morou. Há um documento dele assinado em Silves», frisa a arqueóloga.

«O Infante é a personagem histórica portuguesa mais conhecida em todo o mundo. Associar o Castelo de Silves a essa importante figura do História só poderá trazer benefícios para a cidade. Mas há que valorizar essa ligação, há que chamar a atenção para ela», para poder tirar partido dessa mais valia, salienta.

Por isso, a arqueóloga defende a criação de um folheto sobre a presença do Infante em Silves e a colocação de informação específica, à porta do castelo e junto às ruínas da Alcaidaria.

«Assim, quem passa ali em cima e espreita para aqui, vai perceber que estas ruínas estão ligadas a uma das grandes personagens da História mundial», conclui Rosa Varela Gomes, apontando para os turistas que circulam mais acima, no antigo caminho de ronda das muralhas do Castelo de Silves.

 

Fotos: Elisabete Rodrigues/Sul Informação

 

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