Multinacional alemã quer construir supermercado na Fábrica do Inglês mas Câmara de Silves não aceita

A Ratisbona, empresa multinacional alemã que se dedica ao desenvolvimento de projetos imobiliários comerciais, quer construir um supermercado, em parte […]

ALDI Silves 3D_1A Ratisbona, empresa multinacional alemã que se dedica ao desenvolvimento de projetos imobiliários comerciais, quer construir um supermercado, em parte da Fábrica do Inglês, em Silves.

O negócio interessa à Caixa Geral de Depósitos, que é proprietária da parcela da Fábrica do Inglês onde se pretende construir a unidade comercial, mas a Câmara Municipal de Silves, que tem a última palavra na aprovação, para mais porque todo o complexo se encontra classificado como património de interesse municipal, já disse que não.

A filial portuguesa da multinacional alemã (Ratisbona Promoções e Construções Lda) argumenta que o supermercado ALDI «gerará um número significativo de empregos diretos e indiretos, grande parte destes locais, e complementará a oferta comercial existente em Silves, resultando num investimento na ordem dos 3,5 milhões de euros que acreditamos ter todas as condições para poder ter sucesso, e que possa contribuir para a viabilização a revitalização, reabilitação e reabertura da Fábrica do Inglês, um espaço ímpar e marcante da cidade de Silves».

Empresa Ratisbona: o supermercado ALDI «gerará um número significativo de empregos diretos e indiretos, e complementará a oferta comercial existente em Silves»

Para o local, um dos dois artigos matriciais em que a Fábrica do Inglês está dividida, na parte do terreno de 5000 metros quadrados onde antes existia a tenda dos eventos e a fonte “cibernética”, foi aprovado, em 2007,  pela Câmara Municipal de Silves, um Pedido de Informação Prévia para um Aparthotel de 120 quartos e quatro pisos acima do solo.

Esse pedido foi feito ainda quando a Fábrica do Inglês era propriedade do grupo Alicoop/Alisuper, depois de um processo em que se permitiu que o terreno ocupado pelo complexo fosse dividido por dois artigos matriciais.

A construção de um Aparthotel com quatro pisos acima do solo – apesar de, oficialmente, ser apresentado como “hotel de charme” – era defendida como uma solução para os graves problemas da Fábrica do Inglês, que já caminhava, então, a passos largos, a par do grupo Alicoop/Alisuper, para um ruinoso processo de insolvência. Esse projeto, com a insolvência, acabou por ficar na gaveta, sendo agora para o mesmo terreno que surge a pretensão de construir um supermercado da cadeia alemã ALDI.

Fábrica do Inglês_exterior_maio 2014Em relação ao Aparthotel que foi aprovado pela Câmara em 2007, quando a autarquia era presidida pela social-democrata Isabel Soares, irmã do então presidente do conselho de administração do grupo Alicoop/Alisuper, a atual autarca, Rosa Palma, eleita pela CDU nas Autárquicas do ano passado, diz apenas: «se calhar, há uns anos, foram tomadas decisões más. Agora, temos é que aprender com os erros anteriores e não tomar decisões que possam perpetuar esses erros».

Mas a multinacional Ratisbona, que promove a construção, em esclarecimento enviado ao Sul Informação, não considera que o supermercado seja um erro. E sublinha que o anterior projeto «configurava um impacto e uma dimensão extremamente gravosas para a Fábrica do Inglês e para o Museu da Cortiça, não respeitando o património existente», defendendo que foi «neste sentido que se propôs substituir o referido Aparthotel por uma unidade comercial (supermercado) com 900 metros quadrados de área de vendas».

Empresa Ratisbona: o projeto «não abrange nem altera em nada o Museu da Cortiça, bem como os edifícios adjacentes»

A questão da eventual construção de um supermercado naquela metade da Fábrica do Inglês tem sido referida sempre que se fala do futuro do Museu da Cortiça, fechado há cinco anos, e cujo espólio móvel foi comprado, em Maio passado, em hasta pública, pelo Grupo Nogueira, curiosamente proprietário atual da rede de supermercados Alisuper.

A Ratisbona, no esclarecimento enviado ao nosso jornal, faz ainda questão de sublinhar que a sua pretensão incide «apenas sobre o segundo terreno, confinante com o do Museu da Cortiça, mas independente» dele. «A pretensão não abrange nem altera em nada o Museu da Cortiça, bem como os edifícios adjacentes, outrora utilizados enquanto restaurantes, bares e cafés, sendo que, no terreno onde incide a proposta de construção do supermercado, se localizam apenas áreas de armazenagem/apoio técnico e uma tenda à superfície para realização de eventos», sublinha a multinacional.

Aliás, a empresa até defende que o Museu da Cortiça, que «é e será sempre parte integrante de uma solução para a Fábrica do Inglês», se deverá manter e reabrir, «impulsionado pela construção de uma área comercial que possa tornar exequível a abertura de todo o complexo da Fábrica do Inglês à população e visitantes de Silves».

ALDI Silves 3D_2Para isso, argumentam que, no projeto de arquitetura do supermercado «existiu, da nossa parte, uma clara preocupação em respeitar o património existente bem como toda a sua envolvente», acrescentando que a unidade comercial se enquadra «perfeitamente no contexto em que se insere, tendo em conta a história e a imagem da Fábrica do Inglês». E dizem ainda que o projeto foi «elaborado de acordo com os contributos da Câmara Municipal de Silves, por exemplo com a utilização na fachada do edifício da cor amarelo torrada, tão característica da Fábrica do Inglês».

Quanto às características do que é proposto, revelam que o edifício «tem um piso, com 1.453 metros quadrados de área bruta de construção e 900 metros quadrados de área comercial, o que permite um reduzido impacto visual do projeto. Os 80 lugares de estacionamento à superfície propostos seguramente facilitarão o acesso de visitantes ao local, visto não ser pretensão a existência de barreiras ou vedações entre o terreno do supermercado e o terreno do Museu», tal como é mostrado nas imagens.

Por tudo isto, defende a Ratisbona, «a utilização do terreno limítrofe do Museu da Cortiça para a construção de uma superfície comercial é perfeitamente compatível com o que existiu e existirá no futuro, permitindo dinamizar e potenciar todo o espaço envolvente, nomeadamente o Museu da Cortiça e todas as restantes valências do projeto (áreas de lazer/serviços/comércio/restauração), consubstanciando a concretização de uma solução economicamente viável e exequível, com vista à reabertura da Fábrica do Inglês, incluindo o Museu da Cortiça e edifícios adjacentes».

Afirmando não querer fechar as portas ao diálogo, a Ratisbona assegura que «existe disponibilidade e flexibilidade da nossa parte para poder alterar a solução mediante novas sugestões que venham a ser efetuadas e consideradas válidas para a melhoria do espaço em questão».

Rosa Palma: «Para aquele local específico, todos se pronunciaram contra a intenção da construção do supermercado»

«Claramente queremos fazer parte da solução, devolvendo um património à população do Algarve em geral e aos habitantes de Silves em particular», garantem os promotores.

Rosa Palma, presidente da Câmara Municipal de Silves, disse ao Sul Informação que «o executivo permanente e não permanente» já teve uma reunião com os representantes da Ratisbona, onde a pretensão de construção do supermercado em metade da Fábrica do Inglês foi discutida e rejeitada.

«Foi-lhes dito, muito claramente, e por todos os membros do executivo permanente e não permanente, que, para aquele espaço, o projeto não se coaduna. Para aquele local específico, todos se pronunciaram contra a intenção da construção do supermercado», salientou a autarca silvense. Ou seja, tanto a presidente e os dois vereadores eleitos pela CDU (Mário Godinho e Maria Luísa Luís), como os vereadores da oposição – os do PSD (Rogério Pinto e Graça Neto) e os do PS (Fernando Serpa e Paulo Pina) – manifestaram desde logo a sua discordância em relação ao projeto da multinacional.

Rosa Palma acrescentou que, já depois dessa reunião, deu entrada na Câmara de Silves um «pedido de comunicação prévia» daquela obra, que vai agora suscitar uma resposta oficial dos serviços camarários.

fábrica do inglês_10«Todo o complexo da Fábrica do Inglês está classificado e, por muito bonito que esse projeto se queira mostrar, não pode sequer ser aprovado para ali. Dificilmente se pode andar a derrubar muros, como o projeto prevê, porque isso seria desclassificar o espaço», sublinhou a autarca.

A Fábrica do Inglês, pelo que foi nos tempos em que ali se produziam rolhas de cortiça e pelo que foi depois o sonho de um complexo de animação que foi sustentado pelas poupanças de muitos pequenos empresários, «mexe muito com as nossas raízes», frisou Rosa Palma.

Se a Ratisbona quer ser «parte da solução», como afirma, então a autarca silvense desafia a empresa multinacional a «vir connosco conhecer e avaliar outras localizações possíveis, que as há, para instalar o supermercado em Silves».

Manuel Castelo Ramos, antigo diretor do agora fechado Museu da Cortiça e grande ativista da defesa da integridade da Fábrica do Inglês, por seu lado, interroga: «há tantos sítios abandonados na cidade, tantas fábricas desativadas, porque é que querem vir para aqui, meter-se num edifício classificado?» «Salvaguardando as distâncias entre a importância do Castelo e da Fábrica, é como se agora quisessem meter um supermercado no castelo, dizendo que isso era a única maneira de o viabilizar economicamente. O que querem é aproveitar-se da qualidade de um complexo que é património classificado para fazer negócio».

Rosa Palma: «Desafiamos a empresa a vir connosco conhecer e avaliar outras localizações possíveis, que as há, para instalar o supermercado em Silves»

Confrontado pelo Sul Informação com o convite da presidente da Câmara, que aliás já tinha sido feito durante a reunião entre os executivo e os representantes da empresa, Henrique Torres, da Ratisbona, garante que «não há alternativa àquele local na Fábrica do Inglês». «Só aquela localização tem viabilidade, em termos de futuras vendas da loja. Não encontro nenhum outro local que permita garantir um volume de vendas que justifique o investimento de 3,5 milhões de euros, noutro local da cidade», concluiu.

Enquanto não se resolve a questão do espólio do Museu de Cortiça e da própria estrutura museológica, a pretensão de construir um supermercado na Fábrica do Inglês é, assim, mais uma dor de cabeça para todas as partes envolvidas.

 

Nota: as imagens em 3D de antevisão do projeto do supermercado foram enviados ao Sul Informação pela empresa Ratisbona

 

 

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