SPEA acusa: domingo abre «mais uma época de caça insustentável»

O setor da caça e o Ministério da Agricultura e do Mar «mantêm práticas ultrapassadas e nocivas para a caça […]

rola-bravaO setor da caça e o Ministério da Agricultura e do Mar «mantêm práticas ultrapassadas e nocivas para a caça e para o ambiente, colocando em causa o interesse público e o futuro da atividade cinegética», considera a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), a propósito do início de mais uma época venatória, que abre no próximo domingo, 17 de Agosto.

A SPEA, num comunicado hoje divulgado, pede aos caçadores «maior rigor e responsabilidade na prática e gestão da caça» e pede ainda a todos os cidadãos que «manifestem a sua indignação perante esta situação».

A SPEA entende que «a caça é um recurso natural, que gerido de uma forma responsável pode gerar benefícios económicos e sociais».

A gestão da caça, defende a associação, é muito importante para a proteção das aves e dos seus habitats. Por isso, a SPEA tem alertado e pressionado o Ministério da Agricultura e do Mar (MAM), para «uma mudança na legislação que possibilite uma prática de uma caça mais responsável».

É que, segundo aquela entidade, «a legislação da caça em Portugal permite uma série de práticas nocivas, que ameaçam as espécies, o ambiente e até a saúde humana».

Portugal é, por exemplo, dos poucos países europeus onde ainda é possível caçar com munições de chumbo. «Este metal tóxico contamina a água, os solos, as aves aquáticas e as pessoas que consomem essa caça. Atualmente a proibição da utilização de munições de chumbo vigora apenas nas zonas húmidas dentro de áreas protegidas. No restante território, os caçadores continuam legalmente a contaminar albufeiras, açudes, rios e ribeiras, numa prática que não é digna duma sociedade informada».

A SPEA sublinha que «continua a ser possível abater espécies de patos com populações invernantes diminutas (menos de 1000 indivíduos), como o zarro e a negrinha, e outras espécies cujas populações residentes estão ameaçadas de extinção, como a frisada e o pato-trombeteiro».

Quanto às aves migradoras, em Portugal é permitido «abater espécies que se encontram em decréscimo acentuado, como a narceja, a rola-brava e o estorninho-malhado, todas com mais de 50% de diminuição de efetivos na Europa nos últimos trinta anos».

A SPEA considera que «o caso mais dramático é o da rola-brava, uma espécie cujas populações europeias diminuíram 74% desde 1980 e que enfrenta um sério risco de extinção em vários países da Europa».

Em Portugal, a rola-brava pode ser caçada durante seis semanas e cada caçador pode matar seis aves por dia de caça, num total superior a 150000 rolas abatidas por época. Isto pode simplesmente significar o colapso da espécie, se nada for feito;

Por outro lado, sublinha a associação, «a gestão das zonas de caça continua a ser feita sem ter em conta os parâmetros populacionais das espécies e as suas taxas de reprodução. Abatem-se indivíduos em demasia, não permitindo a recuperação natural e motivando o recurso sistemático aos repovoamentos com animais de cativeiro. Na maioria das zonas de caça pratica-se uma espécie de avicultura, com abate no campo».

Igualmente problemático é o controle de predadores, que «deixou de ser uma medida extraordinária. Todas as zonas de caça o praticam, sem saber ao certo se as populações de raposas e de saca-rabos tem algum impacto negativo sobre as espécies cinegéticas, e se a implementação desta medida traz de facto algum beneficio».

Além disso, «os gestores de caça continuam a não ser responsáveis pelos crimes contra a natureza cometidos dentro das suas propriedades, muitas vezes vedadas ao público. Os casos conhecidos de espécies protegidas mortas a tiro, em armadilhas ou envenenadas são graves, preocupantes e terminaram invariavelmente sem consequências para a zona de caça».

Em Portugal, as decisões em matéria de gestão cinegética estão a ser tomadas com base numa «lei da caça obsoleta», frisa a SPEA.

«O nosso país passou à margem da iniciativa europeia para a Caça Sustentável. O MAM insiste em tomar decisões sobre gestão da caça sem considerar o estado das populações em Portugal e na Europa e sem tornar pública qualquer estatística de abate».

No próximo domingo, abre mais uma época venatória, em que serão permitidas estas práticas nocivas.

Por isso, a SPEA apela aos caçadores, gestores de zonas de caça e aos cidadãos que «façam a sua parte e que sejam mais responsáveis do que a própria lei».

Na opinião de Domingos Leitão, coordenador do Departamento Terrestre da SPEA, «os caçadores e suas associações devem ser os primeiros a não utilizar cartuchos com chumbo em qualquer zona húmida e podem, voluntariamente, abster-se de caçar a rola-brava. Os bons gestores de caça fazem bem em identificar e proteger as espécies ameaçadas que dependem das suas áreas, contribuindo para a qualidade dos produtos e serviços que vendem».

Domingos Leitão alerta ainda que «todos os cidadãos devem denunciar junto do SEPNA os crimes de caça que detetarem e devem manifestar a sua indignação junto da Ministra da Agricultura e do Mar, por exemplo, assinado a petição pública atualmente online».

A SPEA acredita que «só com a eliminação das atuais práticas nocivas e com uma gestão responsável da caça será possível garantir a sustentabilidade deste recurso a médio/longo prazo».

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