Atapuerca escreve uma nova página no livro da evolução humana

Mais uma vez, Atapuerca (Espanha) está na ribalta, desta vez não por causa duma nova descoberta, mas sim pela análise […]

Mais uma vez, Atapuerca (Espanha) está na ribalta, desta vez não por causa duma nova descoberta, mas sim pela análise de toda uma série de crânios que têm vindo a ser descobertos na Sima de los Huesos, um autêntico tesouro, aparentemente inesgotável, de fósseis humanos.

A página que desta vez é escrita sobre a evolução humana tem a ver com a origem dos neandertais, os nossos primos hominídeos mais próximos, com quem coexistimos até há 30 mil anos.

O homem de Neandertal nasceu na Europa e, até aqui, acreditava-se que os Homo heidelbergensis (de Heidelberg, onde foi descoberto o 1º fóssil desta espécie, em 1907) estariam na sua origem.

Ora, a possibilidade de analisar um conjunto de 17 crânios com cerca de 430 mil anos (pleno Pleistocénio Médio) provenientes dum único local é ímpar.

A análise feita pela célebre equipa espanhola liderada por J.L. Arsuaga (Universidade Complutense, Madrid e Centro de Evolução Humana) e agora publicada na revista Science (Science 20 Junho 2014:Vol. 344 no 6190: 1358-1363), é exaustiva e foca-se sobretudo em caracteres não métricos do crânio apesar de também incluir algumas características métricas.

Crânio de Sima de los Huesos em comparação com neandertal e outro hominídeo

Os resultados permitiram algumas conclusões importantes, das quais destaco o facto destes fósseis da Sima, Atapuerca, já não serem considerados como membros da espécie Homo heidelbergensis. Esta categoria taxonómica fica com fosseis como Arago (França) e Ceprano (Itália), e Mauer (Heidelberg), também do Pleistoceno Médio.

Coexistiram, assim, várias linhagens evolutivas no Pleistoceno Médio, entre as quais a dos hominíneos da Sima de los Huesos, que seriam os mais próximos filogeneticamente dos neandertais.

Outra conclusão é que estes hominíneos também não são considerados neandertais, não obstante as apomorfias.

Cautelosamente, a categoria taxonómica dos fósseis da Sima fica em aberto. Cada vez mais, há evidências a favor de várias linhas evolutivas, das quais só algumas terão conseguido seguir em frente.

Curiosamente, este estudo vem ao encontro dos resultados preliminares da análise do ADN mitocondrial dos fósseis da Sima (Dezembro de 2013), que sugeriu que estes hominíneos estivessem mais próximos dos denisovianos (espécie contemporânea dos neandertais, conhecida através de dados genéticos) do que dos neandertais.

Merece destaque igualmente o facto da nova datação, resultante da aplicação de várias técnicas, tornar estes fosséis como os mais antigos (credivelmente datados) de hominíneos com características derivadas não partilhadas pelos ancestral comum (apomorfias).

Finalmente, enfatizo o facto deste estudo permitir afirmar que foram as características faciais que primeiro evoluíram, ou seja, nem todas as particularidades cranianas mudaram ao mesmo tempo, o que é designado por evolução em mosaico. Este é um dado novo também sobre a evolução dos neandertais.

 

Autora: Eugénia Cunha (Departamento Ciências da Vida/Universidade de Coimbra)
Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

 

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