«Um Requiem Alemão» de Brahms marca início do Festival Terras sem Sombra

A abertura da décima temporada do Festival Terras Sem Sombra – festival de música sacra do Baixo Alentejo – será […]

A abertura da décima temporada do Festival Terras Sem Sombra – festival de música sacra do Baixo Alentejo – será assinalada com Ein Deutsches Requiem (“Um Requiem Alemão”) de Johannes Brahms [1833-1897]. O concerto, de entrada livre, tomará lugar na igreja de Santo Ildefonso, matriz de Almodôvar, no dia 29 de Março, às 21h30.

A interpretação estará a cargo da soprano Raquel Alão e do barítono Luís Rodrigues, acompanhados pelo Coro do Teatro Nacional de São Carlos e pelos pianistas João Paulo Santos e Kodo Yamagoshi, sob batuta do maestro Giovanni Andreoli

A sensibilidade romântica conduziu a uma redescoberta dos valores espirituais que desenvolveria, por seu turno, um novo entendimento do humanismo como “pedra de toque” para a compreensão das relações entre o indivíduo, a sociedade, a natureza e o próprio Deus.

Uma aposta em valores como a autenticidade, a intimidade, a fraternidade, sinais de outra empatia artística com as vivências de uma época – o século XIX – marcada pelo progresso, mas também por profundos sentimentos de perda da liberdade, de afastamento das raízes, de injustiças sociais… Tudo isto está presente em Ein Deutsches Requiem, uma das mais famosas obras de Johannes Brahms (1833-1897), que anuncia, em tom comovente, inspirado por um sentido dramático da beleza, mas cheio de expectativa, os “tempos modernos” do século XX.

Foi este singularíssimo momento da música europeia o escolhido por Paolo Pinamonti, diretor artístico do Terras sem Sombra, para o concerto de abertura da 10.ª edição do Festival – o festival de música sacra do Baixo Alentejo –, iniciativa do Departamento do Património Histórico e Artístico da Diocese de Beja que, realizada em parceria com as câmaras municipais e as “forças vivas” da região, vem dando assinalável impulso à sua vida artística e cultural, permitindo, ao mesmo tempo, o conhecimento de alguns dos principais monumentos, paisagens e santuários da vida selvagem do Sul do país.

A entrada na igreja de Santo Ildefonso, matriz de Almodôvar, como sucede em todos os concertos do Festival Terras sem Sombra, é livre. A igreja matriz abrirá as portas pelas 21h00 e a organização recomenda essa hora para a entrada, pois não há lugares reservados e este festival caracteriza-se por encher completamente os seus espaços.

 

Um Requiem pelos vivos

Composto entre 1865 e 1868 e estreado, a 18 de Fevereiro de 1869, em Leipzig, Um Requiem Alemão foi a primeira composição por Johannes Brahms para grande orquestra, coro e solistas.

Apesar do nome, não se destina à liturgia, visando a criação de uma obra majestosa, que servisse de meditação sobre a morte, baseada em fragmentos da Bíblia, na versão de Lutero.

Ao escrevê-la numa síntese que une o legado cristão à espiritualidade contemporânea e “laica”, Brahms terá querido homenagear a memória de outro músico genial com quem manteve intensos laços de amizade, Robert Schumann, que perdeu a razão em 1854 e veio a falecer, em 1856, num asilo psiquiátrico.

Esta peça, segundo explica Bernardo Mariano, “assume a subjetividade da proposta e dissipa qualquer pretensão normativa; remete, obviamente, para a língua em que é cantado, mas igualmente para a especificidade alemã e luterana”.

A palavra Requiem, que significa “repouso”, “descanso”, mostra que o compositor pretendeu aplicá-la mais aos que ficam do que aos que partiram. No fundo, trata-se de “Um Requiem pelos Vivos”. Algo que constitui um mote apropriado aos desafios que a sociedade de hoje enfrenta, dividida entre o desespero e a esperança, mas que encontra no regresso às origens um poderoso estímulo vital.

A sua escolha revela o intuito traçado por Paolo Pinamonti para o lançamento de uma temporada preparada com todo o cuidado. “Este é um ano de comemorações e, como tal, o concerto inaugural representa, antes de mais, uma celebração da vida”, explica Sara Fonseca, coordenadora do Terras sem Sombra.

Em 2014 celebra-se o 200.º aniversário da morte de D. Fr. Manuel do Cenáculo, o primeiro bispo de Beja, figura de referência do Iluminismo, que imprimiu notável avanço à cultura portuguesa do seu tempo.

Uma estreita associação entre a salvaguarda da herança religiosa, a valorização dos produtos locais e a conservação da natureza tem sido o fio condutor do trabalho do Departamento do Património Histórico e Artístico da Diocese de Beja, que comemora, em 2014, trinta anos de trabalho, sob a direção de José António Falcão.

 

Ribeira do Vascão, alvo do voluntariado de artistas, público e comunidade local

Do ADN do Festival faz parte, desde 2011, a realização de ações práticas, no terreno, a favor da salvaguarda da biodiversidade, envolvendo, como voluntários, músicos, espetadores e membros de cada comunidade visitada pelo Terras sem Sombra.

Isto tem produzido resultados muito interessantes para a causa da proteção da natureza, o que faz todo o sentido numa região com altos índices de preservação ambiental, reconhecidos a nível internacional.

Não se trata de meros passeios por belas paisagens: os intervenientes arregaçam as mangas e colaboram com o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, autarquias e instituições locais em tarefas concretas.

E será assim que no domingo, 30 de Março, artistas e outros voluntários vão ter a oportunidade de conhecer de perto o mundo extraordinário dos invertebrados e de compreender a sua importância nos ecossistemas, através de uma jornada ao longo Ribeira do Vascão, afluente do rio Guadiana que constitui verdadeiro laboratório vivo da biodiversidade.

Celebrando ainda a recente classificação deste curso de água como Zona Húmida de Importância Internacional (Convenção de Ramsar), realizar-se-á um percurso para observação de libélulas e libelinhas, grupo que contribuiu para a integração da ribeira na Rede Natura 2000. O percurso será guiado por especialistas e reflete o trabalho em curso no local, apoiado com êxito pelo Festival.

 

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