Revitalizar o futuro no Palácio do Tenente

Um concerto acústico dos NOME, que ali gravaram o seu mais recente videoclip «Jardim do Fim», é o segundo evento […]

Um concerto acústico dos NOME, que ali gravaram o seu mais recente videoclip «Jardim do Fim», é o segundo evento que o Palácio do Tenente, em Faro, vai acolher. Será esta noite, às 21h30, naquela antiga casa senhorial hoje transformada em espaço de comércio social e colaborativo e também de artes, com as exposições e a música à cabeça.

Depois de «O Regresso do Gramofone», o primeiro evento que ali teve lugar em maio, hoje será a vez do «O Regresso do Pátio», por acontecer precisamente nesse espaço ao ar livre. Música acústica, a estreia do videoclip, e outras surpresas esperam o público. E amanhã, sábado, dia 27, as portas voltam a abrir-se para um Flavours Sunset com um Dj Set por Nuno Aires.

Davide Alpestana, responsável pelo projeto do Palácio do Tenente, foi um dos convidados da Beta Talk de julho, que decorreu como sempre no espaço de Café Concerto do Teatro Municipal de Portimão. Esta conversa sobre empreendedorismo contou ainda com Ana Rosa, da empresa de comércio colaborativo «Love in Boxes», que abriu há três meses uma loja muito especial em Portimão.

Mas hoje falaremos apenas do Palácio do Tenente, projeto que, como recordou Davide Alpestana, geógrafo de formação e técnico da Sociedade Polis Ria Formosa, começou no âmbito da iniciativa «Estamos na Baixa», promovida pela Associação Faro 1540, que queria, precisamente, devolver o comércio tradicional e a animação ao centro da capital algarvia.

A campanha «Estamos na Baixa» promoveu o contacto entre proprietários de espaços comerciais até então devolutos, na sua maioria lojas fechadas, e potenciais interessados em criar os seus negócios nesses espaços, mas garantindo rendas low cost.

A primeira loja a abrir foi a «Sardinha de Papel» (e hoje abre a Atelier Rural). «O dono dessa loja onde se instalou a Sardinha de Papel disse-me: não será possível rentabilizar-me aqui o palácio?», na realidade uma casa senhorial datada de 1806, situada numa rua do centro de Faro e fechada desde a morte dos seus últimos moradores, avós do dono atual.

«Fomos ver a casa e era um espetáculo. O palácio estava quase intacto por dentro. Estava mobilado, alguns quartos e salas estavam como foi deixado há trinta anos, pelos últimos moradores». Havia muitos livros, muitos objetos pessoais, postais antigos de Faro e não só, uma máquina de costura antiga da Singer, agulhas e lãs, globos terrestres, instrumentos técnicos de desenho, móveis, e até um gramofone.

O palacete, situado na Rua Conselheiro Bivar, 79, em Faro, pertenceu ao Tenente João de Carvalho, daí o nome escolhido pelo projeto.

 

Da venda de garagem aos eventos

 

«Em grupo, começaram a surgir ideias. Primeiro pensámos em fazer uma venda de garagem, mas depois, perante todo aquele potencial, evoluímos para este projeto e pensámos em abrir portas a parceiros, para ali terem um espaço temporário de contacto com o público», recorda Davide.

Entretanto, e para garantir o espaço, através da Associação Faro 1540 foi feito um contrato de arrendamento do Palácio do Tenente, que dura pelo menos até ao fim deste ano.

«Para começar, organizámo-nos, catalogámos todos os objetos e móveis, fizemos uma limpeza ao longo de duas semanas e depois resolvemos envolver parceiros».

Dando uso à sua veia de geógrafo, Davide Alpestana lembra que «as cidades portuguesas têm hoje excesso de espaços devolutos, degradados ou apenas subaproveitados. Há fábricas, casas, lojas, prédios. E já se sabe que não podem ser apenas os poderes públicos a envolver-se na sua revitalização, para mais na atual situação de falta generalizada de dinheiro. É preciso que os próprios cidadãos se envolvam e promovam a revitalização de todo esse património. Foi o que pensámos, em grupo, e foi o que fizemos».

Depois de semanas de trabalho voluntário, na catalogação e na limpeza – três outros elementos do grupo envolvido no projeto do Palácio do Tenente estavam presentes na assistência, na Beta Talk, e recordaram os dias de trabalho árduo… – começou a tomar forma o primeiro evento no Palácio do Tenente, a que deram o nome de «O Regresso do Gramofone».

E em que consistiu? Foi uma mostra vintage («na realidade foi uma fusão entre o velho e o novo»), com os móveis e objetos da casa, projeção de filmes, provas de vinho, exposição de fotografia, música com djs, e apresentação de algumas empresas, umas já em funcionamento, outras em vias de criação, que usaram os compartimentos da casa para apresentar de forma original os seus produtos ao público e, em muitos casos, para os vender diretamente. E, por falar em vender, também foram escolhidos, em conjunto pelo grupo e pelos donos da casa, objetos e móveis da casa para serem vendidos durante esse evento.

«Mas só escolhemos aqueles objetos e móveis cuja venda não iria roubar a alma deste sítio», garantiu Davide Alpestana. O dinheiro dessa venda reverteu em parte para pequenas obras de melhoramento na casa, nomeadamente no pátio, onde esta noite tem lugar o segundo evento, por essa razão chamado «O Regresso do Pátio».

 

Do Regresso do Gramofone ao Regresso do Pátio

 

No primeiro evento, participaram as empresas Atelier Rural (a tal que hoje abre a sua loja), que se dedica a recuperação, restauro e transformação de móveis e ainda a artigos têxteis, Amormeu, um artesão que produz os artigos que vende na loja também aberta no âmbito da iniciativa «Estamos Na Baixa», About Wine, uma empresa de vinhos de qualidade, que usou, por exemplo, o antigo lava-loiças de mármore como frapé para gelar as garrafas, a Byho Interior Design Clinic, uma empresa de desing de interiores, que recriou, no Palácio do Tenente, um escritório à moda antiga, e a TBT/The Bike Type, uma loja de bicicletas também situada na Baixa que também restaura e vende bicicletas novas e pasteleiras. Houve ainda uma exposição de fotografia.

«Abrimos as portas do Palácio do Tenente ao público e foi um sucesso. Recebemos cerca de 800 pessoas, o que traduz a grande recetividade da cidade a este tipo de organizações». Curiosamente, e ao contrário do que o grupo organizador esperava, muitos dos visitantes foram pessoas mais velhas, dos 50 anos para cima («alguns mesmo com 70 ou 80 anos»), talvez motivados pela possibilidade de conhecer por dentro um dos palacetes icónicos da cidade de Faro.

«O evento em si foi uma mais valia para todos, em termos de notoriedade e visibilidade das marcas, de sinergias e contactos, não só com o público, mas entre as empresas participantes, de vendas e de novas experiências», garante Davide Alpestana.

«O que nós fazemos aqui é comércio social. Pensámos: o que é que os comerciantes e empreendedores podem fazer por eles próprios? O que aqui tivemos nesse primeiro evento foi a fusão entre passado e futuro, apostando na história e nos ícones de uma cidade».

O evento desta noite, com a apresentação acústica da banda farense NOME é um pouco diferente e por isso Davide Alpestana e os restantes membros do grupo estão expectantes.

Mas para setembro já está em marcha um segundo evento semelhante ao primeiro, que passe por disponibilizar a pequenas empresas e empreendedores espaços na casa para mostrar o que fazem. A ideia é continuar a levar à prática este «conceito que passa por «ter várias empresas presentes num mesmo espaço e assim reduzir os custos».

«As nossas perspetivas para o futuro são continuar a fazer obras na casa, por isso, há que promover aqui mais eventos». O grupo, garante, «está disposto e motivado para continuar este processo». Que irá continuar pelo menos até ao fim do ano, quando termina o contrato de arrendamento. Mas não se sabe se o projeto Palácio do Tenente poderá ou não continuar.

«Tudo isto surgiu de uma oportunidade que resultou do contacto com os proprietários. Quem sabe se eles não estão agora abertos a algum tipo de experiências novas no futuro», concluiu Davide Alpestana.

 

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