Festival Terras Sem Sombras estreia obra-prima da música Renascentista

O Festival Terras Sem Sombras promove a estreia nacional da Missa Sancti Jacobi, composta, em torno de 1428, por Guillaume […]

O Festival Terras Sem Sombras promove a estreia nacional da Missa Sancti Jacobi, composta, em torno de 1428, por Guillaume Dufay, pelo agrupamento italiano LaReverdie, no segundo concerto, marcado já para este sábado, dia 20 de Abril às 21h30, na igreja matriz de Santiago do Cacém.

Fazendo justiça à rica tradição jacobeia, que começou a renascer nos últimos anos, em diversos pontos do Alentejo, o Festival escolheu este emblemático monumento como palco para a estreia nacional daquela obra.

Santiago do Cacém constitui, aliás, uma importante referência do Caminho de Santiago em terras do Sul. Desde há muitos séculos que os peregrinos aqui passam, em direção a Compostela.

A sua igreja matriz, fundada ao redor de 1310, ao abrigo da Ordem de Santiago, é um importante santuário de peregrinação, tendo, além disso, uma estrutura arquitetónica que lhe possibilita notáveis condições acústicas para a execução de música antiga.

O ensemble italiano laReverdie, famoso agrupamento europeu de música medieval e renascentista, adotou o nome de um género poético que celebra o regresso da Primavera.

Isto evidencia a principal característica do grupo, a redescoberta dos tesouros musicais da velha Europa, cativando, no decurso da sua longa e intensa atividade, exigentes públicos dos principais palcos do mundo, graças a um virtuosismo instrumental e vocal. Algo que lhe tem granjeado, desde o início da carreira, em 1986, importantes distinções no campo da música antiga, com realce para o último CD que editou, Carmina Burana – Sacri Sarcasmi.

O projeto Terras sem Sombra é uma iniciativa de carácter itinerante do Departamento do Património Histórico e Artístico da Diocese de Beja e estende-se até 13 de Julho, criando uma verdadeira temporada musical no Alentejo meridional.

Conta com a colaboração, entre outras entidades, do Inalentejo, da Câmara Municipal de Santiago do Cacém, da Administração do Porto de Sines e do Turismo do Alentejo.

Todos os concertos e atividades são de acesso livre e valorizam a excelência do património e dos produtos regionais.

 

Lagoa de Santo André, paragem obrigatória na Rota das Aves Migratórias

Na manhã de domingo, músicos e espetadores do Terras sem Sombra unem-se à comunidade local para salvaguardarem a biodiversidade, prosseguindo a linha de trabalho do Festival iniciada em 2011 e que tem como epicentro a Reserva Natural da Lagoa de Santo André.

Esta é uma paragem privilegiada para muitas espécies de aves na rota migratória entre a Europa e a África. Ao longo do seu percurso transcontinental, cruzam inúmeros territórios e descansam em dezenas de zonas húmidas.

Tal migração constitui um motivo de união entre países, pela promoção de uma rede universal de áreas protegidas, de que faz parte o principal parceiro do FTSS para a biodiversidade, o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas.

A participação numa ação de anilhagem científica de aves (na Lagoa de Santo André existe uma Estação de Anilhagem permanente), a realização de um percurso de observação, a recuperação de estruturas de visitação e, ainda, a remoção de espécies vegetais exóticas, são as atividades propostas para conhecer e potenciar a biodiversidade desta área protegida – uma das mais importantes, dentro da sua tipologia, no âmbito da União Europeia.

No decurso da visita será posto igualmente em realce o património material e imaterial de uma área em que a presença humana gerou um interface extremamente significativo entre os recursos da natureza e da cultura, com reflexos plurisseculares nas tipologias arquitectónicas, nas técnicas de navegação e pesca e na agricultura tradicional.

 

A Missa Sancti Jacobi, um clássico do Caminho de Santiago

Figura crucial da primeira geração do Renascimento, Guillaume Du Fay (c.1397-1474) realizou um percurso artístico variado que reúne, de forma paradigmática, as principais tendências da linguagem musical do século XV.

Considerado um dos mais influentes compositores da Europa do seu tempo, assimilou, ao longo de múltiplas viagens, as técnicas e estéticas da música franco-flamenga, inglesa e italiana, efetuando, a partir delas, uma síntese surpreendente.

Marco da história da polifonia renascentista, a Missa Sancti Jacobi é um exemplo desta transição entre antigos e novos modelos, oferecendo o primeiro exemplo de plenarium da história da música, ou seja, do tratamento musical pelo mesmo compositor, pensando numa criação global, das distintas secções do Próprio e do Ordinário da Missa.

Foi escrita para a igreja de Santiago de Bolonha, um pólo da Via Francigena, o percurso do Caminho jacobeu em Itália, e acabou por ser levada de terra em terra pelos peregrinos.

Valorizando as ligações do Renascimento ao Alentejo, o concerto de Santiago do Cacém dará igualmente a conhecer uma excepcional peça da escola de Évora: o Stabat Mater, de Pedro de Escobar (c. 1465-depois de 1535), que a interpretação do agrupamento La Reverdie restitui ao texto integral – raramente ouvido entre nós em tempos modernos –, alternando polifonia e cantochão, como era habitual na prática interpretativa do século XV.

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