Falir, se preciso

Do fim-de-semana, o chumbo expressivo do Tribunal Constitucional (TC) a alguns artigos do Orçamento de Estado e as reações subsequentes, […]

Do fim-de-semana, o chumbo expressivo do Tribunal Constitucional (TC) a alguns artigos do Orçamento de Estado e as reações subsequentes, especialmente do Primeiro-Ministro, domingo.

Não me surpreende a decisão do TC, como não me surpreenderia o seu contrário. Não sou constitucionalista, sequer jurista, pelo que não me resta alternativa a confiar no órgão criado para avaliar a constitucionalidade das normas.

A decisão dos juízes não configura uma vitória política, mas sim uma vitória do Estado de Direito, a prevalência do direito constitucional sobre o direito ordinário.

Surpreendem-me (ou talvez nem cheguem a surpreender, pela falta de novidade) alguns comentários e leituras provenientes dos de sempre. Se a esquerda portuguesa entrou em histerismo, o que me parece precipitado (porque às vezes é pior a emenda que o soneto), a direita passou ao ataque, culpando o Tribunal – a palavra não é exagerada – de tudo e mais alguma coisa.

Concordemos ou não com a decisão proferida, a culpa não é do TC, mas de quem, pelo segundo ano consecutivo, legislou de forma inconstitucional. De quem, apesar do aviso do ano passado, voltou a desrespeitar o princípio da igualdade – de todos o mais sagrado.

A Constituição não é um livro de citações que usamos quando nos dá jeito e que suspendemos quando nos parece melhor. A Constituição existe e persiste para se sobrepor à vontade do legislador, orientando-o e impondo limites.

Ouvi Pedro Passos Coelho e, por isso, também ouvi o Primeiro-Ministro de Portugal, fazer uma declaração de guerra ao seu povo. No fundo, a dizer que está para breve o enterro definitivo do que resta do Estado Social, ao qual se juntará um saneamento em massa de funcionários públicos.

Passos Coelho é um nota 10, que lidera uma equipa incapaz de apresentar uma solução para o país, porquanto está, em grande medida, comprometida com interesses pessoais e corporativos, ainda que não tanto como com a sua falta de sentido de Estado ou, simplifiquemos, inteligência.

Há que renegociar o memorando, sim. E se da renegociação não resultar nada de bom, há que rasgá-lo. E se for preciso falirmos, que seja. Porque a seguir recomeçaremos, e mesmo recomeçar será melhor do que nos ver assim, numa lenta agonia que não sabemos quando ou se terá fim.

 

Autor: Nuno Andrade Ferreira, jornalista

 

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